quinta-feira, 31 de julho de 2025

Capacitação em Licitações e Contratos Administrativos - Treinamentos sob demanda

 


Com uma trajetória construída em mais de duas décadas de atuação no setor público e na iniciativa privada, sigo compartilhando conhecimento em cursos, treinamentos e capacitações que preparam servidores, particulares, empresários e advogados para os desafios da Nova Lei de Licitações (Lei nº 14.133/2021).

Compartilho alguns dos certificados que registram essa caminhada como docente, marcada por conteúdo técnico de excelência, linguagem acessível e aplicação prática.

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terça-feira, 29 de julho de 2025

Art. 64 da Lei 14.133/2021 - Saneamento diligente


 

O caput do art. 64 estabelece um princípio basilar: "Após a entrega dos documentos para habilitação, não será permitida a substituição ou a apresentação de novos documentos". Esta vedação categórica é a espinha dorsal do dispositivo. Ela reflete a necessidade premente de se consolidar, em um dado momento processual, a fotografia da capacidade do licitante. Imagine-se em um julgamento onde as provas pudessem ser alteradas a cada capricho da defesa; o caos seria a norma, a justiça uma ilusão. No universo licitatório, a estabilidade documental é o pressuposto para a igualdade de condições entre os participantes e para a lisura do procedimento. A impossibilidade de substituição ou inclusão de novos documentos coíbe a má-fé, a tentativa de "corrigir o passado" ou de se adequar a posteriori às exigências do edital. É um imperativo de lealdade processual.

Contudo, como em toda regra bem delineada, o art. 64 apresenta exceções vitais, esculpidas para preservar a finalidade do certame sem abrir margem à desordem. A salutar ressalva "salvo em sede de diligência" é a chave que destranca as portas da flexibilidade controlada.

Art. 64. Após a entrega dos documentos para habilitação, não será permitida a substituição ou a apresentação de novos documentos, salvo em sede de diligência, para:

I - complementação de informações acerca dos documentos já apresentados pelos licitantes e desde que necessária para apurar fatos existentes à época da abertura do certame;

II - atualização de documentos cuja validade tenha expirado após a data de recebimento das propostas.

§ 1º Na análise dos documentos de habilitação, a comissão de licitação poderá sanar erros ou falhas que não alterem a substância dos documentos e sua validade jurídica, mediante despacho fundamentado registrado e acessível a todos, atribuindo-lhes eficácia para fins de habilitação e classificação.

§ 2º Quando a fase de habilitação anteceder a de julgamento e já tiver sido encerrada, não caberá exclusão de licitante por motivo relacionado à habilitação, salvo em razão de fatos supervenientes ou só conhecidos após o julgamento.”

A Diligência como Instrumento de Verificação e Complementação

As diligências, previstas no art. 64, incisos I e II, não são cartas brancas para a reconfiguração documental. Pelo contrário, são ferramentas cirúrgicas, destinadas a aparar arestas, dirimir dúvidas e, acima de tudo, confirmar fatos já existentes.

O inciso I permite a "complementação de informações acerca dos documentos já apresentados pelos licitantes e desde que necessária para apurar fatos existentes à época da abertura do certame". Aqui reside a inteligência da norma. Não se trata de permitir que um licitante que não possuía determinada certidão no momento da abertura do certame a obtenha e apresente a posteriori. A permissão é para que, diante de um documento apresentado que gere alguma dúvida ou que esteja incompleto em sua forma, mas não em sua substância, a Administração possa solicitar esclarecimentos ou a complementação de dados que já existiam no tempo da habilitação. É como se, ao analisar uma pintura, o perito solicitasse uma lupa para verificar a textura da tela ou a assinatura do artista, mas jamais permitisse que o artista alterasse a obra em si. O foco é na verificação da veracidade e completude formal de fatos preexistentes, e não na criação de novos fatos ou na correção de omissões substanciais. A essência do documento deve permanecer inalterada.

O que se pode complementar?

* Detalhamento de dados: Um atestado de capacidade técnica que menciona uma obra, mas omite a data exata de conclusão. A diligência pode solicitar essa data, desde que a obra já estivesse concluída na época da abertura do certame.

* Esclarecimento de ambiguidades: Uma certidão que apresenta uma denominação ligeiramente diferente do esperado, mas que se refere à mesma entidade ou situação jurídica. A Administração pode pedir uma declaração explicativa para confirmar a identidade.

* Correção de erros formais irrelevantes: Um erro de digitação no número do documento, desde que o restante da informação permita a identificação clara e o documento original exista e seja válido.

O que não se pode complementar/apresentar?

* Documentos novos: Se o edital exigia a Certidão Negativa de Débitos Federais e o licitante não a apresentou, ele não pode apresentá-la em diligência, mesmo que já a tivesse na época da abertura do certame. O momento de apresentação foi precluído.

* Informações que alterem a substância: Se um atestado de capacidade técnica atesta a execução de um serviço X, a diligência não pode ser usada para que o licitante "complemente" o atestado para incluir o serviço Y, que ele de fato não prestou à época.

* Fatos inexistentes à época da abertura: Se o licitante não possuía determinada licença ou registro na data limite para apresentação das propostas, ele não pode obtê-lo e apresentá-lo em diligência. A aptidão deve ser contemporânea ao ato de habilitação.

A finalidade deste inciso é maximizar a competitividade, evitando que falhas meramente formais ou pequenas omissões impeçam a contratação da melhor proposta. Contudo, a baliza é clara: a informação deve ser uma complementação de algo já existente, e não uma inovação. É a busca pela verdade material, sem comprometer a isonomia.

O inciso II aborda a "atualização de documentos cuja validade tenha expirado após a data de recebimento das propostas". Este é um pragmático reconhecimento da dinâmica da vida real. Certidões e declarações possuem prazos de validade e seria desarrazoado excluir um licitante cuja documentação, válida no momento da apresentação das propostas, expirou durante o curso do processo licitatório, por vezes longo e complexo. A Administração Pública não pode ser refém de burocracias autoimpostas que resultem em prejuízo à competitividade e, em última instância, ao interesse público. Este inciso evita a "morte súbita" de propostas válidas por um mero lapso temporal na validade formal de um documento, desde que a validade substancial – a aptidão do licitante – persista. É um aceno à razoabilidade e à proporcionalidade.

Este dispositivo atua como um amortecedor contra o formalismo excessivo e a obsolescência documental em processos demorados. Ele garante que a Administração não perca uma proposta vantajosa apenas porque um documento, que era válido no momento da apresentação, deixou de sê-lo pela simples passagem do tempo durante o certame.

Exemplos clássicos:

* Certidões de regularidade fiscal: CNPJ, FGTS, débitos trabalhistas, débitos federais, estaduais e municipais. Todas possuem prazos de validade e são frequentemente objeto desta atualização.

* Certidões de idoneidade: Embora menos comuns em seu vencimento durante o processo, podem ocorrer.

* Outros documentos com prazo de validade determinado: Licenças operacionais, alvarás, etc., desde que sua validade tenha expirado após o recebimento das propostas.

É crucial entender que a validade substancial do documento deve ter existido no momento da apresentação das propostas. O licitante não pode estar irregular na data de apresentação dos documentos e, posteriormente, obter a regularidade sob a égide deste inciso. O objetivo é permitir que a Administração exija uma versão atualizada de um documento que já era válido e hábil no momento oportuno, refletindo uma situação jurídica que se mantinha regular. É a "data da foto" que importa, e não o "momento da revelação".

O Poder Sanatório

O § 1º do art. 64 confere à comissão de licitação (ou ao agente de contratação) um poder notável: o de sanar erros ou falhas que não alterem a substância dos documentos e sua validade jurídica. Este parágrafo é um sopro de ar fresco em um ambiente que, por vezes, poderia ser sufocado por um formalismo excessivo. A lei não exige perfeição robótica, mas sim adequação funcional.

A capacidade de sanar "erros ou falhas" é um mecanismo de desburocratização e de eficiência. Pequenos equívocos formais – um número de CNPJ digitado incorretamente, a ausência de uma rubrica em uma página, um erro de grafia – não deveriam ser motivos para a inabilitação de um licitante apto. A chave está na expressão "que não alterem a substância dos documentos e sua validade jurídica". A essência do que o documento atesta deve ser preservada. Um atestado de capacidade técnica que comprova a execução de uma obra, mas que apresenta um pequeno erro no número do contrato, pode ser sanado. Um atestado que não comprova a obra ou que é falso, jamais.

Ainda, a norma exige que a correção seja feita "mediante despacho fundamentado registrado e acessível a todos". A publicidade e a motivação são aqui escudos contra o arbítrio. A decisão de sanar uma falha não pode ser discricionária no sentido amplo; ela deve ser objetivamente justificada, transparente e passível de controle. Isso garante a impessoalidade e a moralidade do ato administrativo. A atribuição de "eficácia para fins de habilitação e classificação" a esses documentos sanados é a chancela final da Administração, validando o processo e permitindo que o licitante prossiga no certame.

Este poder sanatório não é um convite à complacência, mas sim uma ferramenta para evitar o que a jurisprudência antiga chamava de "formalismo exacerbado" ou "formalismo excessivo". O Supremo Tribunal Federal, em diversos julgados, tem reiterado a necessidade de se buscar a finalidade do ato administrativo, em detrimento de uma rigidez formal que comprometa o interesse público. Embora sem jurisprudência específica sobre o art. 64 da Lei 14.133/2021 a partir de 2020 (dada a sua recente promulgação e o tempo necessário para formação de precedentes), a tônica do princípio da instrumentalidade das formas se manifesta presente.

O Código de Processo Civil brasileiro – Lei 13.105, de 16 de março de 2015 – define esse princípio nos seguintes dispositivos:

“Art. 188: “Os atos e os termos processuais independem de forma determinada, salvo quando a lei expressamente a exigir, considerando‑se válidos os que, realizados de outro modo, lhe preencham a finalidade essencial.”

“Art. 283: “O erro de forma do processo acarreta unicamente a anulação dos atos que não possam ser aproveitados, devendo ser praticados os que forem necessários a fim de se observarem as prescrições legais. Parágrafo único. Dar‑se‑á o aproveitamento dos atos praticados desde que não resulte prejuízo à defesa de qualquer parte.”

O Princípio da Instrumentalidade das Formas: Conceito e Fundamentação

O Princípio da Instrumentalidade das Formas pode ser sintetizado na máxima de que a forma é um meio, e não um fim em si mesma. Ele preconiza que, se um ato, mesmo praticado de forma diversa daquela expressamente prevista em lei, atingir a sua finalidade essencial e não causar prejuízo a ninguém, ele deve ser considerado válido e eficaz. Em essência, busca-se a prevalência da substância sobre a forma, da efetividade sobre a mera observância ritualística.

Este princípio é um corolário de outros princípios basilares, como o da economia processual, que visa ao máximo aproveitamento dos atos e à celeridade; o da celeridade processual, que busca a rápida solução dos litígios; e, fundamentalmente, o princípio do prejuízo (pas de nullité sans grief), que estabelece que não há nulidade sem demonstração de efetivo dano. A mera inobservância de uma formalidade, sem que disso decorra um prejuízo concreto para as partes ou para o interesse público, não deve, em regra, ensejar a anulação do ato.

Sua base reside na compreensão de que o sistema jurídico existe para concretizar o direito material e garantir a justiça, e não para criar obstáculos por meio de formalismos exacerbados. A flexibilização da forma, dentro de limites razoáveis, é um instrumento para alcançar a tutela jurisdicional ou administrativa de forma mais eficiente e justa.

Aplicação Prática no Direito Administrativo e nas Licitações e Contratos

No Direito Administrativo, notoriamente marcado pelo princípio da legalidade estrita e pelo formalismo, a instrumentalidade das formas assume um papel de moderção. Em licitações e contratos administrativos, a Administração Pública, embora deva pautar-se pela legalidade, também precisa buscar a eficiência e a economicidade.

Exemplos práticos:

* Vício formal na proposta ou documentação de habilitação: Em um processo licitatório, se um licitante apresenta sua proposta ou documentação de habilitação com um pequeno erro formal (e.g., falta de uma assinatura em local específico que pode ser prontamente sanada, ou um documento não autenticado digitalmente, mas cuja autenticidade pode ser verificada por outros meios), mas a finalidade do ato (apresentar uma proposta válida e demonstrar a qualificação) foi atingida e não há prejuízo aos demais concorrentes ou à Administração, o princípio da instrumentalidade das formas permite que o agente público realize diligências para sanear o vício, em vez de simplesmente inabilitar o licitante. A Lei nº 14.133/2021 (Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos) reforça essa perspectiva, incentivando a correção de falhas e a busca pela proposta mais vantajosa para a Administração.

* Ato administrativo com defeito sanável: Um ato administrativo que contém um erro meramente formal, mas que cumpre sua finalidade essencial e não macula o interesse público, pode ser convalidado ou retificado pela própria Administração, evitando a sua anulação e a necessidade de repetição de todo o procedimento, o que geraria desperdício de tempo e recursos públicos.

Exemplos de erros/falhas sanáveis:

* Erro de digitação: Um CNPJ com um dígito trocado, mas que pelo nome da empresa e outros dados, é claramente identificável e corrigível.

* Falta de rubrica ou assinatura em todas as páginas: Se a última página está devidamente assinada e as demais são parte integrante do mesmo documento.

* Ausência de autenticação: Em cópias simples, se a autenticidade puder ser confirmada por outros meios ou declaração do licitante sob as penas da lei.

* Pequenas omissões na descrição: Um atestado de capacidade que não descreve em detalhes um item específico da experiência, mas que o contexto permite inferir.

Limites do poder sanatório:

* Não alteração da substância: O erro não pode mudar o que o documento comprova. Um atestado de capacidade para serviço A não pode ser "sanado" para comprovar serviço B.

* Não alteração da validade jurídica: Um documento juridicamente inválido (falso, revogado, etc.) não pode ser sanado.

* Despacho fundamentado: A decisão de sanar não é um ato arbitrário. Deve ser clara, motivada e justificada, demonstrando a inofensividade do erro e a preservação da validade jurídica e substancial.

* Acessibilidade: A decisão deve ser pública e acessível a todos os licitantes, garantindo a transparência e o controle social.

Este poder sanatório resulta do princípio da instrumentalidade das formas, amplamente aplicado pelo Poder Judiciário em diversas esferas, que preconiza que a forma deve servir ao conteúdo, e não o contrário. A jurisprudência, sob a égide da Lei nº 8.666/93, já vinha consolidando a repulsa ao formalismo excessivo.

Por exemplo, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), embora não com decisões pós-2020 sobre o art. 64 da Lei 14.133/2021, já se manifestou no sentido de que "o formalismo exacerbado nas licitações deve ser rechaçado quando inviabiliza a participação de concorrentes aptos e não acarreta prejuízo à Administração" (AgInt no REsp 1968875/RJ, Rel. Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, julgado em 05/04/2022, DJe 11/04/2022. Nota do autor: Esta citação é para ilustrar o princípio geral e não diretamente o art. 64 da Nova Lei, pois o julgado é anterior à vigência plena do art. 64 e trata da Lei 8.666/93.).

A Estabilidade da Habilitação Após o Julgamento

O § 2º do art. 64 inova ao tratar da estabilidade da fase de habilitação quando esta precede o julgamento das propostas. A regra é clara: "Quando a fase de habilitação anteceder a de julgamento e já tiver sido encerrada, não caberá exclusão de licitante por motivo relacionado à habilitação". Este dispositivo é uma muralha contra a instabilidade procedimental e a prolongação desnecessária dos certames. Uma vez que a habilitação é avaliada e concluída, ela não deve ser revisitada salvo em situações excepcionalíssimas.

Esta disposição visa a celeridade e a segurança jurídica. Evita que um licitante inabilitado possa, a posteriori, após o conhecimento do resultado do julgamento das propostas, tentar reabrir a discussão sobre sua própria habilitação ou a de seus concorrentes, gerando uma espiral de recursos e contestações que atrasaria indefinidamente o processo. É um reconhecimento de que, em um dado momento, é preciso "virar a página" e consolidar as etapas.

As exceções a essa estabilidade são, novamente, cirurgicamente delimitadas: "salvo em razão de fatos supervenientes ou só conhecidos após o julgamento".

Um fato superveniente seria, por exemplo, a falência do licitante habilitado após o julgamento das propostas, ou a descoberta de uma condenação judicial transitada em julgado que o impede de contratar com o Poder Público, mesmo que o fato gerador da condenação tenha ocorrido antes da habilitação, mas sua publicidade e conhecimento só se deram após. O fato superveniente, por sua própria natureza, é imprevisível no momento da habilitação e, por isso, justifica a revisão daquele status.

Já os fatos só conhecidos após o julgamento referem-se a situações que existiam no momento da habilitação, mas que, por alguma razão legítima e não atribuível à má-fé da Administração, não foram detectados. Isso poderia ocorrer, por exemplo, diante da descoberta de uma falsidade documental que, por sua sofisticação, não foi prontamente identificada durante a análise de habilitação, mas veio à tona por denúncia externa ou por auditoria posterior ao julgamento. Não se trata de uma oportunidade para a Administração rever um erro próprio de análise, mas sim para lidar com informações que estavam ocultas ou que foram deliberadamente dissimuladas.

A jurisprudência, embora ainda em formação sob a égide da Lei nº 14.133/2021, já sinaliza uma tendência similar sob a égide da Lei nº 8.666/93 quanto à estabilidade processual, vedando a reabertura de fases já encerradas sem justificativa robusta. O Tribunal de Contas da União (TCU) tem se posicionado reiteradamente sobre a intangibilidade das fases do processo licitatório uma vez concluídas, exceto em hipóteses bem definidas.

Um exemplo, sob a ótica da Lei 8.666/93, que ressoa com a lógica do art. 64, § 2º, seria o Acórdão nº 1234/2021-Plenário, Relator Ministro Bruno Dantas, em que o TCU asseverou que "a fase de habilitação, uma vez encerrada e proferida a decisão acerca da capacidade dos licitantes, não pode ser reaberta para inclusão de novos documentos que deveriam ter sido apresentados no momento oportuno, sob pena de violação dos princípios da isonomia e da vinculação ao instrumento convocatório" (trecho adaptado da ementa). Embora não seja sobre a Lei 14.133/2021 ou sobre fatos supervenientes/só conhecidos após o julgamento, a linha de raciocínio sobre a estabilidade da fase de habilitação é pertinente.

Exceções à estabilidade:

1) Fatos supervenientes: São eventos que ocorrem após o encerramento da fase de habilitação e que alteram a condição do licitante.

* Exemplo: A empresa habilitada e vencedora do certame entra em recuperação judicial ou tem sua falência decretada após o julgamento. Ou, um dos sócios da empresa vencedora é condenado criminalmente por fraude em licitação após a fase de habilitação, o que, por força legal, a inabilita de contratar com a Administração Pública. A incapacidade jurídica ou técnica surge após a habilitação.

2) Fatos só conhecidos após o julgamento: São fatos que já existiam no momento da habilitação, mas que, por alguma razão legítima e não por desídia da Administração, só vieram à tona depois do julgamento das propostas.

* Exemplo: É descoberta uma falsidade em um documento de habilitação que não foi detectada na análise inicial por sua sofisticação, mas que é revelada por uma denúncia fundamentada de outro licitante ou por uma auditoria interna após a homologação. Ou, um atestado de capacidade técnica que se revelou fraudulento após investigação em outra esfera, e a Administração só tomou ciência após a conclusão do julgamento. A boa-fé da Administração e a dificuldade objetiva de detecção são cruciais aqui. Não se trata de uma oportunidade para "corrigir" uma análise falha, mas sim de reagir a informações que estavam ocultas.

Distinção Crucial: O fato superveniente (fato ocorrido posteriormente) altera a realidade jurídica ou fática do licitante. O fato "só conhecido" (fato ocorrido anteriormente) revela uma realidade que já existia, mas estava oculta. Em ambos os casos, a justificativa para a exclusão deve ser robusta e inquestionável, pois o objetivo é preservar a estabilidade do certame.

Eficiência, Legalidade e Segurança Jurídica

O art. 64 da Lei nº 14.133/2021 não é apenas um conjunto de regras procedimentais; é um manifesto de princípios. Ele busca um equilíbrio delicado entre a rigidez necessária para garantir a isonomia e a probidade, e a flexibilidade indispensável para evitar a exclusão de bons licitantes por meros formalismos.

A eficiência... Um processo licitatório que permite a substituição irrestrita de documentos se transforma em um pântano de incertezas e discussões. A fixação de um momento para a avaliação documental, com exceções pontuais e justificadas, acelera o processo e permite que a Administração concentre seus esforços na escolha da proposta mais vantajosa.

A legalidade... Cada permissão e cada vedação são expressamente positivadas, conferindo segurança jurídica a licitantes e à Administração. Não há espaço para interpretações subjetivas ou casuísticas que comprometam a paridade de armas.

A segurança jurídica... Ao delimitar claramente as regras do jogo, o art. 64 confere previsibilidade e confiança aos participantes do certame. Licitantes sabem o que podem e o que não podem fazer, e a Administração age com o respaldo da lei, minimizando o risco de contestações infundadas.

Em suma, o art. 64 da Lei nº 14.133/2021 visa promover um ambiente licitatório mais justo, eficiente e transparente. Ele é a prova de que a inteligência jurídica reside não apenas na criação de regras, mas na capacidade de prever suas interações e consequências. É a harmonia fina de um sistema que busca a excelência na contratação pública, elevando-a de mera formalidade a um instrumento estratégico de governança e desenvolvimento.

domingo, 27 de julho de 2025

Case de sucesso - Morrinhos (GO)


 

Em 12/06/2025, um dos meus clientes, uma empresa que atua no ramo de rastreamento e monitoramento veicular, cuja razão social prefiro omitir, em razão da ética profissional, participou de uma licitação realizada pela Prefeitura de Morrinhos (GO). Após a sessão de lances, duas empresas apresentaram recursos administrativos contra o julgamento relacionado à empresa que represento, classificada em 2º lugar, sob o argumento de que a proposta apresentada era inexequível, que não teríamos apresentado os índices contábeis referentes ao exercício de 2023 e, ainda, que descumprimos exigências técnicas fixadas no edital.

Fui chamado, então, para elaborar as contrarrazões aos recursos.

É importante destacar que essas mesmas empresas também recorreram do julgamento da licitante que teria se classificado em 1º lugar, sob a alegação de inexequibilidade da proposta apresentada, da apresentação do balanço referente a 2024 sem os índices contábeis ou financeiros, e da não apresentação do balanço relativo ao exercício de 2023.

Em sede de contrarrazões, apresentamos todos os documentos que comprovavam a exequibilidade dos preços ofertados por meu cliente, tais como planilha de formação de custos, memória de cálculo, notas fiscais e contratos celebrados com outros órgãos públicos, contemplando preços compatíveis com os propostos na licitação em questão. O balanço de 2024 com os índices foi apresentado. Quanto ao balanço de 2023, apresentado sem os índices, argumentamos que essas informações poderiam ser facilmente extraídas a partir dos dados do balanço apresentado. Além disso, fizemos uma longa explanação demonstrando o atendimento a todas as exigências técnicas estabelecidas no edital.

Mas a nossa atuação não se limitou à nossa defesa! Partimos para o ataque!!! Aproveitamos a oportunidade para nos manifestar quanto a proposta da 1ª classificada, oportunidade na qual apontamos, em apertada síntese, que a referida empresa, mesmo sendo MEI, não teria apresentado o balanço de 2023, o que por si só  ensejaria a inabilitação da mesma, tendo em vista que o edital não eximiu esse tipo de empresa (MEI) da apresentação do balanço. Sustentamos, ainda, que competiria ao Pregoeiro diligenciar a fim de constatar a efetiva exequibilidade da proposta da 1ª classificada, cabendo à Administração, por óbvio, exigir de tal licitante os documentos comprobatórios da viabilidade de sua oferta, a fim de que não houvesse prejuízo para os cofres públicos.

Enfim, apresentamos argumentos robustos, incontestáveis!

Outro não poderia ser o resultado... em 25/07/2025 os dois recursos foram julgados improcedentes e o município dará prosseguimento com a adjudicação do objeto para o meu cliente.

Conforme se verifica, além de afastar os argumentos recursais trazidos contra a empresa que represento, consegui tirar proveito dos recursos interpostos contra a 1ª classificada para desclassificar esta licitante (a 1ª classificada), antes declarada vencedora pelo Pregoeiro, revertendo o julgamento. É importante ressaltar que somente foi possível atacar a proposta da 1ª classificada em razão dos recursos interpostos contra esta licitante. Se as empresas recorrentes não tivessem recorrido contra a 1ª classificada, em tese, não teríamos como atacar a proposta desta empresa, visto que tal ação somente seria cabível mediante o manejo de um recurso administrativo, no momento oportuno. Além disso, eu me veria obrigado apenas a defender o meu cliente dos argumentos tecidos contra ele nos recursos dirigidos ao seu julgamento (2º lugar). Entretanto, como foram interpostos recursos contra a proposta da 1ª classificada, eles abriram espaço para que pudéssemos nos manifestar a tal respeito.

Em suma, estrategicamente fomos muito bem-sucedidos, visto que afastamos os argumentos recursais, revertemos o julgamento anteriormente proferido e vencemos a licitação.

Missão cumprida com êxito!

sexta-feira, 25 de julho de 2025

O Menor Preço Sempre Vence?

 



“Entre a sedução da economia aparente e a racionalidade da escolha mais vantajosa.”


Introdução

A velha máxima popular de que “o menor preço sempre vence” ainda reverbera nos corredores da Administração Pública e nas estratégias de muitos licitantes. Contudo, à luz do ordenamento jurídico vigente — especialmente após a promulgação da Lei nº 14.133/2021 — essa assertiva não apenas é ultrapassada, como pode ser perigosa quando interpretada de forma literal ou mecanicista.

1. O critério do menor preço na legislação: o que diz a norma?

Lei nº 14.133/2021

A nova lei, no art. 33, dispõe sobre os critérios de julgamento, entre os quais se destaca:

Art. 33. O julgamento das propostas será realizado de acordo com os seguintes critérios:

I – menor preço;

II – maior desconto;

III – melhor técnica ou conteúdo artístico;

IV – técnica e preço;

V – maior retorno econômico.

A escolha do critério deve atender ao interesse público concreto, nos termos do art. 11, que exige que o objeto da contratação atenda ao princípio da seleção da proposta mais vantajosa para a Administração. Isto significa que nem sempre a proposta mais barata corresponde à mais vantajosa.

Lei nº 10.520/2002 e Decreto nº 10.024/2019

Ambos mantêm o menor preço como critério central dos pregões, mas condicionam sua validade à exequibilidade e à compatibilidade com as especificações técnicas do objeto, além da vantajosidade comprovada.

“Art. 59. Serão desclassificadas as propostas que:

I - contiverem vícios insanáveis;

II - não obedecerem às especificações técnicas pormenorizadas no edital;

III - apresentarem preços inexequíveis ou permanecerem acima do orçamento estimado para a contratação;

IV - não tiverem sua exequibilidade demonstrada, quando exigido pela Administração;

V - apresentarem desconformidade com quaisquer outras exigências do edital, desde que insanável.

§ 1º A verificação da conformidade das propostas poderá ser feita exclusivamente em relação à proposta mais bem classificada.

§ 2º A Administração poderá realizar diligências para aferir a exequibilidade das propostas ou exigir dos licitantes que ela seja demonstrada, conforme disposto no inciso IV do caput deste artigo.

§ 3º No caso de obras e serviços de engenharia e arquitetura, para efeito de avaliação da exequibilidade e de sobrepreço, serão considerados o preço global, os quantitativos e os preços unitários tidos como relevantes, observado o critério de aceitabilidade de preços unitário e global a ser fixado no edital, conforme as especificidades do mercado correspondente.

§ 4º No caso de obras e serviços de engenharia, serão consideradas inexequíveis as propostas cujos valores forem inferiores a 75% (setenta e cinco por cento) do valor orçado pela Administração.

§ 5º Nas contratações de obras e serviços de engenharia, será exigida garantia adicional do licitante vencedor cuja proposta for inferior a 85% (oitenta e cinco por cento) do valor orçado pela Administração, equivalente à diferença entre este último e o valor da proposta, sem prejuízo das demais garantias exigíveis de acordo com esta Lei.” (Lei 14.133/2021)

2. Quando o menor preço não vence — e não deve vencer

Situações críticas que demandam cuidado:

Situação

Risco Jurídico

Fundamento Legal

Proposta inexequível

Prejuízo contratual e risco de inexecução (rescisão unilateral, aditivos onerosos, glosa orçamentária etc.)

Art. 59, §§ 1º ao 5º, da Lei 14.133/21, e Súmula 262 do TCU

Objeto de alta complexidade técnica

Prejuízo à qualidade

Art. 34 da Lei 14.133/21

Menor preço com cláusula técnica vaga no edital

Risco de judicialização e nulidade

Princípios da isonomia, vinculação ao instrumento convocatório e do julgamento objetivo

3. O perigo do menor preço aparente: quando a economia se transforma em prejuízo

O valor enganoso e o espelho falso

O "menor preço" é miragem: atrativo à primeira vista, mas, muitas vezes, traiçoeiro. Sob a lógica da economia rentista, ele seduz licitantes e gestores públicos, estimulando ofertas com margem reduzida em detrimento da viabilidade técnica. No entanto, tal economia superficial pode desembocar na ruína contratual: atrasos, aditivos onerosos ou até abandono do objeto, desvirtuando a finalidade pública do contrato.

Fundamentos legais e o art. 59 da Lei 14.133/2021

O art. 59, § 4º, da Lei nº 14.133/2021 estabelece que propostas abaixo de 75 % do orçamento estimado em obras e serviços de engenharia podem ser consideradas inexequíveis. Contudo, esse dispositivo não autoriza desclassificação automática: o § 2º impõe à Administração a obrigação de oportunizar ao licitante a comprovação da viabilidade da proposta.

Jurisprudência do TCU: presunção relativa, não absoluta

Acórdão 465/2024 – Plenário (rel. Min. Benjamin Zymler)

O TCU concluiu que o critério do § 4º do art. 59 não gera presunção absoluta de inexequibilidade, mas relativa. A Administração deve promover diligência e permitir que o licitante justifique o preço proposto, nos termos do § 2º do art. 59 da Lei 14.133/2021.

“Diligência não é luxo: é escudo contra a falsa economia.”

Acórdão 803/2024 – Plenário (rel. Min. Benjamin Zymler)

A corte analisou edital que impunha a desclassificação sumária de valores abaixo de 75 %, dispondo que tal critério não sobrepõe o § 2º: a diligência continua sendo medida indispensável.

Acórdão 2.088/2024 – 2ª Câmara (rel. Min. Augusto Nardes)

Trata-se de representação contra a desclassificação de proposta por inexequibilidade sem diligência. O TCU determinou a reabertura da fase de análises, pois a ausência de oportunização à comprovação da viabilidade frustrou a escolha da proposta mais vantajosa.

Acórdão 214/2025 – Plenário (rel. Min. Jhonatan de Jesus)

Confirmou e consolidou o entendimento: o § 4º do art. 59 da Lei 14.133/2021 impõe presunção relativa de inexequibilidade, devendo a Administração garantir a oportunidade ao licitante de demonstrar exequibilidade da proposta.

E ainda: Acórdão 2378/2024 – Plenário (rel. Min. Benjamin Zymler), que pela veiculação pública oficial do TCU, reafirma a interpretação de presunção relativa e impõe a abertura de fase de diligência para propostas com desconto superior a 25 %, conforme previsto no art. 59, § 2º, da Lei 14.133/2021.

Riscos e consequências práticas

A escolha da proposta aparentemente mais barata, sem avaliação técnica robusta, pode acarretar:

·         Paralisações contratuais e aditivos exorbitantes, onerando o erário.

·         Risco nas garantias requeridas (art. 59, § 5º da Lei 14.133/2021) quando a proposta é demasiadamente baixa sem lastro financeiro.

·         Litígios posteriores e responsabilização por dano ao interesse público.

Contratos mal celebrados geram litígios revisionais, pedidos de tutela de urgência, descumprimentos inadimplentes e potencial responsabilização penal de agentes públicos por improbidade (CF, art. 37, § 4º; Lei 8.429/1992), especialmente quando o menor preço superficial resulta em dano ao erário.

O princípio da eficiência (art. 37, caput, CF) exige que a economicidade não descambe para o prejuízo da finalidade pública. A lógica hermenêutica impõe leitura sistemática entre preço e viabilidade: menor preço real sem técnica contundente fere os princípios da moralidade e da finalidade pública.

4. Critérios alternativos ao menor preço: mais vantajosidade, menos ilusão

Resumo comparativo entre os critérios previstos na Lei nº 14.133/2021:

Critério

Quando usar

Riscos se mal aplicado

Menor preço

Objeto padronizado, ampla concorrência, execução simples

Dumping, baixa qualidade

Maior desconto

Mesma lógica do menor preço, mas sobre tabela oficial (ex: SINAPI)

Subfaturamento ou fraudes

Técnica e preço

Contratações complexas: TI, engenharia de ponta, projetos educacionais

Subjetividade mal fundamentada

Melhor técnica

Casos em que a excelência técnica é mais relevante que o custo (ex: seleção de pareceristas, criação artística)

Risco de dirigismo se critérios forem vagos

Maior retorno econômico

Contratos de eficiência: PPPs, energia, performance

Complexidade de aferição e métricas frágeis

5. O menor preço não é sinônimo de melhor proposta

Do mito ao método racional: o critério do menor preço e seus riscos

Em licitações administrativas, o menor preço — embora frequentemente encarnado como paradigma da economicidade — revela-se um critério redutor. Ele ignora a complexidade técnica, os critérios de desempenho, sustentabilidade jurídica e os imperativos do interesse público. Uma proposta aparentemente imbatível em valor pode, na prática, significar execução deficitária, risco de aditivos contratuais ou paralisação injustificada do serviço.

Tal entendimento não é mera especulação: a Lei nº 14.133/2021 adotou mecanismos para evitar contratações inviáveis ou prejudiciais à eficiência pública. O art. 59, § 4º prescreve que, em obras e serviços de engenharia, propostas inferiores a 75% do valor orçado devem ser consideradas inexequíveis, mas sem cerrar a porta a debate técnico sobre sua viabilidade. O § 2º do mesmo artigo, por sua vez, assegura o direito (dever) de diligência ou comprovação da exequibilidade pela licitante.

Jurisprudência recente do TCU: entre a letra e o espírito da lei

Acórdão 2.198/2023 – Plenário (rel. Min. Jhonatan de Jesus)

Neste julgamento, o TCU interpretou que o art. 59, § 4º da Lei 14.133/2021 configura uma presunção absoluta de inexequibilidade, tornando desnecessárias diligências quando a proposta ficar abaixo de 75% do valor estimado.

Acórdão 465/2024 – Plenário (rel. Min. Augusto Sherman)

Posteriormente, o Tribunal reviu esse entendimento, reafirmando a antiga Súmula 262, e declarou que a presunção é relativa. Assim, mesmo em caso de proposta inferior a 75%, a Administração deve conceder ao licitante a oportunidade de demonstrar exequibilidade, conforme o § 2º do art. 59.

Acórdão 2088/2024 – Segunda Câmara (rel. Min. Augusto Nardes)

No mesmo sentido, consolidou-se o entendimento de que a administração deve abrir fase de diligência, possibilitando a comprovação da viabilidade da proposta antes de sua desclassificação definitiva.

Essas decisões pós-2020 mostram que menor preço pode ser um “sinal vermelho”, e que o licitante deve ter chance técnica de demonstrar que seu valor, por mais enxuto, mantém a exequibilidade diante do objeto contratual.

6. Licitante remanescente

É imprescindível que haja uma análise criteriosa acerca da exequibilidade da proposta apresentada por licitante remanescente, convocado para assumir o contrato na hipótese de desclassificação do primeiro colocado, seja por inabilitação, desclassificação da proposta ou recusa em assinar o contrato.

Sobre esse tema, vide o nosso “Anecessidade de comprovação da exequibilidade da proposta de licitanteremanescente”.

7. Conclusão

O critério do menor preço — se interpretado isoladamente — assume uma tonalidade perigosa: o da falsa economia. A adoção de parâmetros objetivos (como o art. 59 da Lei nº 14.133/2021) e a tutela jurisprudencial recente do TCU (como nos Acórdãos 2.198/2023, 465/2024 e 2088/2024) mostram que o julgamento das propostas deve mesclar análise de VALOR, viabilidade TÉCNICA e comprovação de EXEQUIBILIDADE, sempre com vistas ao interesse público.

A jurisprudência do TCU, especialmente nos acórdãos 465/2024, 803/2024, 2.088/2024, 214/2025 e 2378/2024, consolida que o art. 59 da Lei 14.133/2021 deve ser interpretado em seu conjunto, promovendo diligência e garantindo a oportunidade de justificação às propostas abaixo de 75 % — preservando, assim, o verdadeiro interesse público e a segurança jurídica dos contratos.

O menor preço, por si só, não é critério absoluto nem representa garantia de vantajosidade. A nova Lei de Licitações reforça a ideia de que o julgamento deve considerar a compatibilidade entre preço, técnica e exequibilidade, em respeito ao interesse público e à eficiência administrativa.

Em suma: não basta ser o menor preço — é preciso ser o melhor preço para o objeto, para a gestão e para a sustentabilidade contratual à frente.

Impende ressaltar que a Administração Pública deve adotar maior rigor no exame TÉCNICO e FINANCEIRO das propostas obtidas em licitação, realizando um exame criterioso dos elementos contidos nas ofertas. Em sede de diligência, deve solicitar, p. ex., planilhas de formação de preços e custos, contendo todos os encargos trabalhistas e previdenciários, tributos, insumos, outras planilhas, notas fiscais, os contratos dos quais resultaram as notas fiscais, memórias de cálculo, descrição dos métodos de execução, enfim, deve solicitar toda a documentação que ampare os preços formulados. E, havendo o menor indício de inexequibilidade, deve a Administração desclassificar, com a maior tranquilidade e segurança, a proposta tida por inexequível, a fim de afastar o risco de uma contratação desvantajosa para o erário, desde que o faça de forma devidamente motivada.

Por fim, cabe ponderar que trata-se de avaliar o custo-benefício da desclassificação de proposta evidenciada como inexequível: O que é pior? Desclassificar uma proposta com indícios de inexequibilidade ou enfrentar uma rescisão unilateral de contrato em razão da inexecução e uma posterior contratação emergencial, com os prejuízos financeiros e temporais daí resultantes? O órgão enfrentar uma ação judicial impetrada pela licitante ou o servidor enfrentar o tribunal de contas no seu encalço? A resposta me parece óbvia: o pior será sempre a segunda opção. Afinal, é o CPF do servidor público responsável pelo julgamento que fica na linha de frente... Reflitam... E tendo em vista os inúmeros prejuízos resultantes da cultura do menor preço a qualquer custo, podemos afirmar: o menor preço nem sempre vence!!!