Em julgamento inédito, a Segunda Turma do Superior
Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que uma empresa gaúcha em recuperação
judicial pode participar de licitações públicas. Por maioria, o colegiado
seguiu o voto do ministro Mauro Campbell Marques. A empresa é do ramo de
soluções de tecnologia, com foco comercial dirigido ao setor público.
A empresa recorreu contra decisão individual do
ministro Humberto Martins. A pedido do Ministério Público gaúcho, ele havia
concedido liminar para suspender efeitos de um acórdão do Tribunal de Justiça
do Rio Grande do Sul (TJRS) que permitia à empresa concorrer em licitações
públicas, mesmo estando submetida à recuperação judicial.
Em sua defesa, alegou não ser possível a aplicação
da vedação prevista no artigo 31, inciso II, da Lei 8.666/93, já que não
seria impedida a participação das empresas sob o regime da recuperação judicial
em licitações por falta de previsão legal estrita. Segundo ela, a vedação
atingiria somente empresas em concordata ou falência.
Argumentou que deveria haver a valoração do artigo
47 da Lei 11.101/05, segundo o qual “a recuperação judicial tem por
objetivo viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do
devedor, promovendo a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à
atividade econômica”.
Certidões
O relator, ministro Humberto Martins, manteve seu
entendimento no sentido de suspender a decisão que autorizava a empresa de
participar de licitações públicas. Ele foi acompanhado pelo ministro Herman
Benjamin.
O voto que prevaleceu, no entanto, foi o do
ministro Mauro Campbell Marques, que cassou a liminar anteriormente deferida e
julgou extinta, sem análise de mérito, a medida cautelar. Os ministros Og
Fernandes e Assusete Magalhães acompanharam Campbell.
Segundo o ministro, o tribunal de origem salientou
que a empresa possui todas as certidões negativas constantes do artigo 31 da
Lei 8.666, sendo certo que, por estar em recuperação judicial, não seria capaz
de apresentar apenas a certidão negativa de falência ou concordata.
Conforme destacou Campbell, o TJRS deferiu a
liminar por entender que, além de a Lei 11.101 não exigir essa certidão e de
ser a antiga concordata instituto diferente, o simples fato de a empresa estar
em recuperação judicial não poderia ceifar o seu direito de fazer parte de
procedimentos licitatórios e dar continuidade aos contratos em curso.
Perigo inverso
O ministro também observou que é pacífica a
jurisprudência do STJ no sentido de que a concessão de liminar em medidas
cautelares exige a satisfação cumulativa dos requisitos da urgência (periculum
in mora) e da plausibilidade do direito alegado (fumus boni iuris).
Por fim, o ministro observou que a empresa,
conforme reconhecido pelo TJRS, não é devedora fiscal nem tributária e focou
sua atividade em contratos com os entes públicos, “constituindo-se em 100% de
sua fonte de receitas”. Para Campbell, no caso, é possível a ocorrência de periculum
in mora inverso, pois a subsistência da liminar poderia comprometer a
existência da empresa.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Comente! Expresse a sua opinião!