segunda-feira, 23 de junho de 2025

A necessidade de comprovação da exequibilidade da proposta de licitante remanescente


A Administração Pública, ao realizar processos licitatórios, deve observar rigorosamente os princípios que regem a atuação estatal, especialmente os princípios da legalidade, da eficiência, da economicidade, da isonomia e da seleção da proposta mais vantajosa. No entanto, essa “vantajosidade” não se confunde com o menor preço absoluto, sendo imprescindível que a proposta vencedora — e também a dos licitantes remanescentes — seja exequível, ou seja, possível de ser cumprida nos termos ofertados, sem prejuízos à adequada execução contratual.

Nesse contexto, ganha especial relevância a análise da exequibilidade da proposta apresentada por licitante remanescente, convocado para assumir o contrato na hipótese de desclassificação do primeiro colocado, seja por inabilitação, desclassificação da proposta ou recusa em assinar o contrato.

Fundamentação Legal e Doutrinária

A Lei nº 14.133/2021, em seu art. 90, § 2º, ressalvado o disposto no § 4º do mesmo dispositivo, dispõe expressamente sobre a possibilidade de convocação dos licitantes remanescentes, respeitada a ordem de classificação, para assumir as obrigações nos mesmos termos da proposta do primeiro colocado. Vejamos:

 

“Art. 90. [...]

§ 2º Será facultado à Administração, quando o convocado não assinar o termo de contrato ou não aceitar ou não retirar o instrumento equivalente no prazo e nas condições estabelecidas, convocar os licitantes remanescentes, na ordem de classificação, para a celebração do contrato nas condições propostas pelo licitante vencedor.

[...]

§ 4º Na hipótese de nenhum dos licitantes aceitar a contratação nos termos do § 2º deste artigo, a Administração, observados o valor estimado e sua eventual atualização nos termos do edital, poderá:

I - convocar os licitantes remanescentes para negociação, na ordem de classificação, com vistas à obtenção de preço melhor, mesmo que acima do preço do adjudicatário;

II - adjudicar e celebrar o contrato nas condições ofertadas pelos licitantes remanescentes, atendida a ordem classificatória, quando frustrada a negociação de melhor condição.”

 

Ocorre que assumir o contrato “nos mesmos termos” da proposta anterior impõe, muitas vezes, ao licitante remanescente o dever de readequar seus custos a uma realidade orçamentária que ele mesmo não propôs inicialmente, o que pode suscitar dúvidas quanto à exequibilidade da proposta remanescente.

Nesse cenário, a exigência de planilhas de formação de preços detalhadas e comprovações documentais, como notas fiscais, contratos de fornecimento e folhas de pagamento, emerge não apenas como faculdade, mas como uma obrigação técnica da Administração, que deve agir com diligência na verificação da viabilidade econômico-financeira da contratação.

Finalidade da Análise de Exequibilidade

O objetivo da análise da exequibilidade é proteger o interesse público ao:

1) Evitar a contratação de empresas que não têm condições reais de cumprir o objeto nos termos propostos, o que frequentemente leva à rescisão contratual, paralisação da execução e necessidade de nova licitação;

2) Prevenir a prática de preços artificialmente baixos, usados como estratégia para ganhar o certame, mas insustentáveis na fase de execução;

3) Assegurar a continuidade do serviço ou fornecimento contratado, especialmente nos contratos de natureza continuada ou essenciais.

Exigência da Planilha de Formação de Preços

A planilha de composição de custos e formação de preços deve discriminar, de forma transparente e justificada, os custos diretos e indiretos, encargos sociais, lucro, tributos incidentes e demais elementos relevantes para a precificação.

Nos contratos de serviços com dedicação exclusiva de mão de obra, por exemplo, a planilha deverá detalhar salários, encargos previdenciários, provisionamento de benefícios legais e convencionais, custos administrativos, materiais de consumo, EPIs, entre outros. Essa exigência se alinha ao disposto na IN SEGES/ME nº 5/2017, vigente para órgãos da Administração Federal, e também às boas práticas adotadas por estados e municípios.

Importância da Apresentação de Notas Fiscais e Documentos de Suporte

Além da planilha, é recomendável que a Administração exija documentos comprobatórios da realidade mercadológica dos preços apresentados, como:

* Notas fiscais de serviços ou insumos equivalentes emitidas nos últimos meses;

* Contratos de fornecimento vigentes com valores similares;

* Propostas comerciais recebidas de fornecedores;

* Comprovantes de encargos trabalhistas e previdenciários praticados.

Esses documentos conferem lastro documental à proposta do licitante remanescente e permitem ao gestor público verificar se os preços ofertados estão condizentes com a realidade do mercado e com a estrutura de custos da empresa.

Jurisprudência e Orientações de Órgãos de Controle

O Tribunal de Contas da União (TCU), em diversas decisões, tem orientado a Administração a adotar medidas efetivas para garantir a exequibilidade da proposta, mesmo nas situações de convocação de licitante remanescente.

A ausência dessa verificação pode levar à responsabilização do gestor por dano ao erário, na hipótese de a empresa contratada não conseguir cumprir o contrato por inviabilidade financeira.

Conclusão

A convocação de licitante remanescente para assumir contrato nas mesmas condições do primeiro colocado não exime a Administração do dever de diligência quanto à exequibilidade da proposta. Ao contrário, impõe maior atenção, uma vez que o remanescente poderá estar assumindo obrigações que não precificou originalmente.

Assim, a exigência de planilha detalhada de formação de preços e de documentos comprobatórios, como notas fiscais, é uma medida indispensável, tanto do ponto de vista jurídico quanto gerencial, para garantir a legalidade, a eficiência e a segurança da contratação pública.

A omissão nesse aspecto pode configurar falha grave no dever de planejamento e controle da Administração, sujeitando o contrato ao risco de inadimplemento e o gestor à responsabilização por imprudência ou negligência administrativa.

 



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