terça-feira, 8 de julho de 2025

3 cuidados essenciais ao analisar um edital de licitação: evite nulidades, restrições indevidas e prejuízos à sua empresa



No universo das contratações públicas, o edital é a peça central do procedimento licitatório. Ele não apenas estabelece as regras do jogo, mas define os critérios que orientarão todo o certame — da habilitação ao julgamento, da contratação à fiscalização. E é justamente por esse motivo que a análise técnica e minuciosa do edital é uma etapa crucial e indelegável, sobretudo em tempos de Lei nº 14.133/2021, que trouxe exigências mais robustas de planejamento, motivação e transparência.

Ignorar detalhes do edital ou deixá-lo em segundo plano pode significar desde a desclassificação precoce até a assunção de riscos contratuais graves, com reflexos patrimoniais e reputacionais para a empresa.

O exame do edital, em sua integralidade, é fundamental para o sucesso na licitação. Não obstante, a seguir, destaco três cuidados essenciais que todo licitante, especialmente aquele que pretende atuar de forma profissional e sustentável no setor público, precisa adotar ao analisar um edital.

 

1. Verificação da compatibilidade entre objeto, regime de execução e exigências de habilitação

 

O primeiro cuidado fundamental é avaliar se há coerência entre o objeto licitado, o regime de execução previsto e as exigências técnicas e documentais impostas pela Administração.

Nos termos do art. 18, I, da Lei nº 14.133/2021, o edital deve conter a “descrição da necessidade da contratação fundamentada em estudo técnico preliminar que caracterize o interesse público envolvido”. Essa prescrição é reforçada pelo §1º do mesmo dispositivo, que exige que o ETP deverá evidenciar o problema a ser resolvido e a sua melhor solução, de modo a permitir a avaliação da viabilidade técnica e econômica da contratação.

É comum, na prática, encontrar editais que, para um objeto simples (como fornecimento de itens padronizados), impõem exigências de qualificação técnico-operacional incompatíveis, como atestados de capacidade operacional para atividades complexas ou exigência de equipe técnica permanente com engenheiros ou profissionais não relacionados ao objeto.

📌 Jurisprudência do TCU:

“A Administração deve incluir no processo licitatório os motivos das exigências de comprovação de capacidade técnica, seja sob o aspecto técnico-profissional ou técnico-operacional, e demonstrar, tecnicamente, que os parâmetros fixados são necessários e pertinentes ao objeto licitado.” (Acórdão 1937/2003-Plenário - Relator: AUGUSTO SHERMAN)

Atenção especial também deve ser dada ao regime de execução (art. 46 da Lei nº 14.133/21). Exigir, por exemplo, o regime de empreitada por preço global para contratos cuja natureza e imprevisibilidade recomendariam a medição por empreitada por preço unitário pode gerar distorções nos preços e até risco de execução deficitária, o que compromete a vantajosidade do contrato.

 

2. Análise da legalidade e da proporcionalidade das exigências de habilitação

 

Outro cuidado fundamental reside na verificação da legalidade, razoabilidade e proporcionalidade das exigências de habilitação.

Nos termos dos arts. 62 a 70 da Lei nº 14.133/2021, a habilitação do licitante será verificada por meio de documentos relativos:

  • à habilitação jurídica;
  • à regularidade fiscal e trabalhista;
  • à qualificação técnica;
  • à qualificação econômico-financeira.

Porém, a lei deixa claro que tais exigências devem ser compatíveis e proporcionais com as obrigações assumidas. Exigências genéricas, desproporcionais ou que não guardam nexo com o objeto licitado são passíveis de impugnação e, em última análise, podem gerar nulidade do edital.

📌 Exemplo prático: é ilegal exigir capital social mínimo correspondente a 10% do valor do contrato sem justificativa técnica prévia nos estudos que embasaram a licitação. Tal exigência pode configurar restrição à competitividade.

📌 Jurisprudência do TCU:

“A fixação de percentual de capital ou patrimônio líquido mínimo em relação ao valor estimado da contratação deve ser justificada nos autos do processo licitatório.” (Acórdão 668/2005-Plenário - Relator: AUGUSTO SHERMAN)

📌 Base constitucional: tais exigências desproporcionais também violam o princípio da isonomia e o devido processo legal (art. 37, XXI, da CF/88).

Assim, ao se deparar com um edital, o licitante deve perguntar:
“A exigência de habilitação tem nexo com o objeto? Está devidamente justificada tecnicamente? Ou se trata de uma barreira velada à competitividade?”

Essa análise não só previne a desclassificação injusta como abre caminho para impugnações bem fundamentadas, que podem corrigir vícios e abrir espaço para sua empresa competir.

 

3. Exame crítico dos critérios de julgamento da proposta

 

O terceiro ponto essencial é o exame técnico dos critérios de julgamento adotados no edital, pois deles depende a definição da proposta mais vantajosa e a viabilidade da futura execução contratual.

A Lei nº 14.133/2021, em seu art. 33, traz os critérios admissíveis para julgamento:

  • menor preço,
  • maior desconto,
  • melhor técnica ou conteúdo artístico,
  • técnica e preço,
  • maior lance ou oferta, no caso de leilão,
  • maior retorno econômico,

Um erro comum dos editais é utilizar o critério de menor preço global para serviços com múltiplos itens, turnos ou perfis técnicos diferentes, o que pode levar a distorções graves. Empresas “jogam o preço” em alguns itens para vencer, mas não conseguem cumprir a execução com equilíbrio econômico-financeiro, o que prejudica tanto a contratada quanto a Administração.

📌 Jurisprudência do TCU:

“A ausência de critérios pré-definidos para seleção da proposta mais vantajosa viola mandamentos básicos da impessoalidade, da isonomia e do julgamento objetivo, estampados no art. 37, caput e inciso XXI, da CF/1988, art. 3º da Lei 8.666/1993, e no próprio art. 1º do Decreto 2.745/1998, podendo, inclusive, dar margem a direcionamentos indevidos nos procedimentos licitatórios.” (Acórdão 549/2006-Plenário - Relator: WALTON ALENCAR RODRIGUES)

Além disso, os critérios de julgamento devem vir acompanhados da metodologia de avaliação, sobretudo nos casos de técnica e preço, que se destina à licitações para objetos que admitam soluções específicas e alternativas e variações de execução, com repercussões significativas e concretamente mensuráveis sobre sua qualidade, produtividade, rendimento e durabilidade. A ausência de metodologia adequada pode gerar insegurança, subjetividade e questionamentos posteriores.

 

Conclusão: a leitura estratégica do edital é um ato de inteligência jurídica e econômica

 

Analisar um edital não é um ato mecânico, nem protocolar. É, antes, uma operação jurídica, técnica e estratégica. Um exame criterioso do edital permite ao licitante:

  • identificar vícios e inconsistências jurídicas;
  • atuar preventivamente, por meio de impugnações ou pedidos de esclarecimentos;
  • evitar propostas inviáveis, que geram prejuízos financeiros e riscos contratuais;
  • e, sobretudo, aumentar exponencialmente suas chances de êxito na licitação.
Em tempos de nova Lei de Licitações, em que a responsabilidade dos agentes públicos e privados está mais evidenciada, analisar edital com profundidade é mais do que um diferencial competitivo: é uma necessidade de sobrevivência no mercado público.

Um comentário:

  1. Qual o maior desafio que você enfrenta quanto a esse aspecto do processo licitatório?

    Gostaria que eu aprofundasse algum ponto deste tema ou que eu abordasse outro assunto? Deixe sua sugestão aqui.

    ResponderExcluir

Comente! Expresse a sua opinião!