Quando pessoas físicas ou empresas privadas celebram um contrato - regido, obviamente, por normas de direito privado (Direito Civil) - as partes contratantes ficam impedidas de promover qualquer alteração dos termos inicialmente pactuados, salvo mediante acordo.
E, ocorrendo o descumprimento contratual por uma das partes, caberá à outra tão-somente recorrer ao Judiciário a fim de resguardar seus interesses. A nenhum dos particulares é dado, por exemplo, o direito de exigir o cumprimento de determinada cláusula contratual ou aplicar sanções (penalidades), mediante a imposição de sua vontade. Para tanto, será necessário recorrer às medidas judiciais cabíveis.
Em síntese, assim se dá com os contratos de direito privado.
Ocorre, porém, que os contratos administrativos, celebrados entre a Administração Pública e os particulares, em decorrência de regular procedimento licitatório ou de procedimentos de dispensa ou inexigibilidade de licitação, possuem peculiaridades estranhas aos contratos e negócios privados. No sistema legal das contratações públicas, não há lugar para a flexibilidade das negociações privadas.
Tais peculiaridades são denominadas de “prerrogativas da Administração” e constituem verdadeiros princípios de direito público. Esses privilégios decorrem da posição de supremacia da Administração nas relações com os particulares, sendo o contrato administrativo, portanto, um dos instrumentos do Estado para a realização do interesse público.
Em função das prerrogativas que a Lei nº 8.666/93 lhe confere, a Administração Pública pode, por exemplo:
a) alterar unilateralmente (por ato próprio, independente da concordância da empresa contratada) o contrato, modificando o projeto ou as especificações do objeto;
b) alterar unilateralmente o contrato, acrescendo ou diminuindo quantitativamente o objeto;
c) prorrogar o prazo inicialmente estabelecido para a execução do objeto contratual;
d) deixar de pagar a empresa contratada por até 90 (noventa) dias, sem que isso seja motivo para a quebra do contrato por iniciativa do particular;
e) determinar o retardamento da execução da obra ou do serviço, ou de suas parcelas, em virtude de insuficiência financeira ou comprovado motivo de ordem técnica;
f) fiscalizar a execução do contrato;
g) aplicar penalidades às empresas contratadas, em caso de descumprimento das regras contratuais ou editalícias.
h) rescindir unilateralmente o contrato;
i) reter os créditos decorrentes do contrato até o limite dos prejuízos sofridos, em caso de rescisão unilateral.
Entretanto, tais prerrogativas (imprescindíveis à realização do interesse da coletividade) têm no regime jurídico da Lei nº 8.666/93 contornos precisos e limitações com vistas a impedir o desvio de poder ou de finalidade que, invariavelmente, acarretam a nulidade dos atos praticados pela Administração.
Dessa forma, a alteração unilateral dos contratos administrativos, por exemplo, deve ser motivada, decorrer de eventos posteriores ao ato que autorizou a instauração da licitação ou a contratação direta (dispensa ou inexigibilidade de licitação), se limitar às hipóteses previstas no art. 65, I e II, §§ 1º e 2º, da Lei nº 8.666/93 e assegurar a manutenção do equilíbrio econômico-financeiro inicial, nos moldes do art. 65, § 6º, do citado diploma legal.
Portanto, se de um lado a Lei nº 8.666/93 confere à Administração as prerrogativas necessárias à consecução do interesse público, de outro, o ordenamento jurídico (e não apenas a Lei nº 8.666/93) assegura à empresa contratada, entre outros, o direito à manutenção do equilíbrio econômico-financeiro do contrato, ao pagamento pelos fornecimentos ou serviços efetivamente executados, à indenização em situações específicas (desde que presentes os pressupostos legais para tanto) e à ampla defesa e ao contraditório.
Ocorre, porém, que a principal dificuldade enfrentada por muitos é o fato de que a legislação que rege as licitações e os contratos públicos é vasta e complexa.
Os principais diplomas legais que regulamentam a matéria são: a Lei 8.666/93 (Lei de Licitações e Contratos Administrativos), a Lei nº 10.520/02 (que institui a modalidade pregão), o Decreto nº 3.555/2000 (que regulamenta o pregão, na forma presencial), o Decreto nº 5.450/05 (que regulamenta o pregão, na forma eletrônica) e a Lei Complementar nº 123/2006 (que instituiu o Estatuto Nacional da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte).
Além disso, a legislação civil também se aplica às contratações públicas de forma supletiva, sem falar das inúmeras resoluções, portarias, instruções normativas e demais atos expedidos pelas autoridades públicas.
Diante dessa realidade, o particular que pretender contratar com a Administração deve estar bem preparado para a licitação, sob pena de perder diversas oportunidades de negócio, e, também, para os direitos e obrigações a que estará sujeito durante a execução do objeto contratual, com vistas a administrá-la da forma mais vantajosa possível.
No que tange à licitação, deve a empresa licitante atentar-se para as especificações do objeto, para as condições de participação em sentido amplo, para as exigências de habilitação (habilitação jurídica, regularidade fiscal, qualificação técnica e qualificação econômico-financeira), para o valor estimado da contratação, para os requisitos fixados para a apresentação da proposta, para os critérios de julgamento, para os prazos legais para interposição de recursos, para os pressupostos recursais etc.
Já quanto ao contrato, é necessário cuidado especial em relação aos seguintes aspectos (além das prerrogativas da Administração): descrição do objeto e seus elementos característicos, regime de execução (empreitada por preço global ou empreitada por preços unitários) ou forma de fornecimento (parcelada ou integral), condições de execução, prazo para a execução do objeto, vigência contratual, direitos e obrigações de cada uma das partes, penalidades, exigência de garantia contratual, prazos e condições de pagamento e, por fim, se há previsão ou não de subcontratação.
E como se não bastassem as particularidades até aqui apontadas, a acirrada competitividade do mercado vem demonstrando ao empresariado a necessidade de bem estruturar seu negócio para as licitações e futuros contratos, mediante a implantação de metodologias de trabalho que devem abranger desde ações básicas às mais especializadas, tais como: a) identificação das oportunidades; b) contratação de pessoal qualificado; c) análise dos editais de licitação e identificação de eventuais vícios e pontos críticos; d) gestão e preparação dos documentos de habilitação; e) adequada elaboração de propostas; f) acompanhamento do procedimento e adoção das medidas legais destinadas a assegurar o êxito nas licitações; g) acompanhamento cauteloso da execução do objeto do contrato.
Há que se mencionar, por oportuno, que muitos são os vícios encontrados nos editais de licitação, e, da mesma forma, não são poucas as falhas cometidas por alguns particulares que pretendem apresentar propostas e contratar com a Administração.
Porém, esses assuntos serão tratados em outra oportunidade.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Comente! Expresse a sua opinião!