terça-feira, 30 de novembro de 2010

Contratações fundamentadas no art. 24, I e II, da Lei nº 8.666/93. Dispensa da comprovação de regularidade fiscal. Possibilidade.


Há quem defenda o entendimento segundo o qual a Administração Pública somente estaria autorizada a contratar, mediante dispensa de licitação em função do reduzido valor (art. 24, I e II, da Lei nº 8.666/93), empresas que comprovem a regularidade fiscal, ao menos, junto ao INSS e ao FGTS.

“Art. 24. É dispensável a licitação:
I - para obras e serviços de engenharia de valor até 10% (dez por cento) do limite previsto na alínea "a", do inciso I do artigo anterior, desde que não se refiram a parcelas de uma mesma obra ou serviço ou ainda para obras e serviços da mesma natureza e no mesmo local que possam ser realizadas conjunta e concomitantemente;
II - para outros serviços e compras de valor até 10% (dez por cento) do limite previsto na alínea "a", do inciso II do artigo anterior e para alienações, nos casos previstos nesta Lei, desde que não se refiram a parcelas de um mesmo serviço, compra ou alienação de maior vulto que possa ser realizada de uma só vez;
(...)
Parágrafo único. Os percentuais referidos nos incisos I e II do caput deste artigo serão 20% (vinte por cento) para compras, obras e serviços contratados por consórcios públicos, sociedade de economia mista, empresa pública e por autarquia ou fundação qualificadas, na forma da lei, como Agências Executivas”

Tal interpretação fundamenta-se, principalmente, no art. 195, § 3º, da Constituição Federal de 1988:

“Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais:
(...)
§ 3º - A pessoa jurídica em débito com o sistema da seguridade social, como estabelecido em lei, não poderá contratar com o Poder Público nem dele receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios. (...)”

Há, ainda, os que afirmam que para fins de contratação mediante dispensa de licitação com fundamento no art. 24, I e II, da Lei nº 8.666/93, também a regularidade em face da Receita Federal deve ser comprovada.

Porém, o Tribunal de Contas da União – TCU, através do Acórdão nº 2616/2008 – Plenário, ponderou que nas hipóteses adstritas aos preceitos do art. 24, I e II, da Lei nº 8.666/93, estaria a Administração Pública dispensada de exigir a comprovação de regularidade fiscal das empresas.

Consoante prescreve o § 1º do art. 32 da Lei nº 8.666/93, “A documentação de que tratam os arts. 28 a 31 desta Lei poderá ser dispensada, no todo ou em parte, nos casos de convite, concurso, fornecimento de bens para pronta entrega e leilão.”

“Se é justificável a dispensa de apresentação de regularidade fiscal nos casos de convite, em razão do diminuto valor do contrato, com mais razão o será nas hipóteses de contratação direta com fulcro nos incisos I e II do artigo 24 da Lei de Licitações, em que os valores dos contratos podem atingir, no máximo, 10% (dez por cento) do maior valor previsto para a modalidade convite.” (Acórdão nº 2616/2008 – Plenário)

Podemos colher, ainda, o seguinte trecho do voto do Ministro Relator, Ubiratan Aguiar:

“Por isso, manifesto minha total concordância com as palavras da representante do Ministério Público, quando salienta que "a busca por uma solução harmônica, diante da colisão entre os princípios, nos conduz à intelecção de que há de prevalecer - nos exatos limites da questão em debate, isto é, nas hipóteses adstritas aos preceitos do art. 24, incisos I e II, da Lei n.º 8.666/93 - os requisitos da eficiência, economicidade e racionalidade administrativa, sob pena de se afastar, visceralmente a incidência dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, igualmente abrigados pela Carta Magna e também norteadores da administração pública". Assim, ciente de que essa é a melhor compreensão para as disposições constitucionais e legais aplicáveis, deve ser provido o recurso.”

Ficou assentado, portanto, que EXCLUSIVAMENTE nas contratações a serem realizadas mediante dispensa de licitação em razão do reduzido valor (art. 24, I e II, da Lei nº 8.666/93), a Administração Pública estaria dispensada de exigir a comprovação de regularidade fiscal, inclusive no que tange ao INSS e ao FGTS.

É que em quaisquer das hipóteses de redução ou de dispensa de documentos de habilitação, leva-se em consideração a natureza do procedimento e que tais casos se inspiram na necessidade de se abrandar a burocracia.

Ressalte-se, porém, que embora disponha da faculdade de reduzir e dispensar documentos, o administrador poderá (deverá) impor a exigência, legitimamente, quando houver conveniência, especialmente ao se constatar que determinado objeto apresenta algum nível de complexidade e/ou quando se fizer necessário assegurar a execução satisfatória da futura contratação.

De qualquer forma, o TCU não pretendeu, com o Acórdão nº 2616/2008 – Plenário, esgotar a discussão, conforme frisou o Ministro Relator:

“Por fim, saliento que não se pretende aqui esgotar a discussão acerca da exceção à regra criada pelo art. 195, § 3º, da Constituição Federal, mas, apenas, suscitar novas reflexões sobre o tema, em especial em decorrência do seu caráter punitivo e das possibilidades de questionamento de débitos previdenciários e conseqüentes alternativas de regularização conferidas pelo próprio Estado.”

Já o Acórdão nº 725/2007 – Plenário, que deu origem ao Acórdão nº 2616/2008 – Plenário, pode ser acessado em https://pesquisa.apps.tcu.gov.br/#/documento/acordao-completo/*/NUMACORDAO%253A725%2520ANOACORDAO%253A2007/DTRELEVANCIA%2520desc%252C%2520NUMACORDAOINT%2520desc/0/%2520

6 comentários:

  1. Ora, as explanações acima são interessantes e construidas com certa coerencia, mas não podemos descartar o cerne que move as compras públicas. vamos a um exemplo pratico para espancar de vez essa dúvida. Um fornecedor X que cumpre todas as suas obrigações junto ao INSS e FGTS bem como Receita Federal me apresenta um produto com valor de 100; um outro fornecedor que esta sonegando os impostos consequentemente aumentando o deficit da Previdencia, não recolhendo ao governo os impostos e contribuições devidas apresenta o mesmo produto com valor de 80. Ora se fosse o caso de se ignorar os documentos solicitados para regularidade fiscal, iria se privilegiar o sonegador em detrimento daquele que cumpre com suas obrigações, ou seja, iriamos partir do principio que sonegar é o correto e que recolher os tributos seria o incorreto. Logo creio que o TCU não analisou a questao a fundo antes de se pronunciar ou que tentou expressar uma outra ideia que nao essa.

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  2. Acredito que é apenas uma medida de simplificação de processos de pequeno valor. E pelo que entendi ainda sim de forma discricionária, o agente público pode dispensar. O que leva a crer que ainda sim se obrigam todos aqueles que desejam contratar com a Administração Pública se manter em dia com todo tipo de obrigação. Pois o agente pode efetuar diligência para esclarecimentos.

    Não vejo a possibilidade de o contratado exigir esse tratamento. Reitero, caso a Administração assim entenda ela dispensa.

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  3. Caro Djalma,

    Seu posicionamento é merecedor do meu respeito.

    Porém, o que se infere do Acórdão nº 2616/2008 – Plenário é que a regularidade fiscal não é requisito indispensável nas hipóteses de contratações mediante dispensa de licitação em razão do valor (art. 24, I e II, da Lei nº 8.666/93) para a execução ou fornecimento de objetos mais simples.

    Ao menos, esse é o entendimento defendido por Marçal Justen Filho, entre outros renomados doutrinadores, e pelo Tribunal de Contas da União, nos termos do Acórdão em questão.
    Inclusive, o TCU já tratou do assunto em outras oportunidades:

    “Nessa linha de raciocínio, o INSS/PA não deve descartar a possibilidade de fazer contratações regionalizadas ou no próprio local em que os serviços serão realizados. Nesse caso, considerando que o valor dos serviços serão bastante reduzidos para cada um dos municípios, deverá adotar procedimento licitatório mais simplificado, contratando inclusive por dispensa, nos termos do inciso II do art. 24 da Lei nº 8.666/92, sem deixar de considerar a possibilidade de reduzir as exigências de habilitação jurídica, de qualificações técnica e econômico-financeira e de regularidade fiscal, conforme facultado pelo art. 32, § 1º, do mesmo estatuto de licitação.” (Acórdão nº 874/2007, 2ª C., rel. Min. Aroldo Cedraz)

    A finalidade de se dispensar a documentação referente à regularidade fiscal, nas hipóteses adstritas aos preceitos do art. 24, incisos I e II, da Lei n.º 8.666/93, é exatamente abrandar a burocracia, que não raro acarreta prejuízos para o erário.

    Infelizmente, muitos órgãos públicos cometem excessos quando da definição dos requisitos de habilitação. Exigem, indevidamente, todos (ou a grande maioria) os documentos previstos nos arts. 27 a 31 da Lei nº 8.666/93, mesmo quando o objeto do contrato não requer o cumprimento de boa parte de tais requisitos, por exemplo.

    Esses excessos ocorrem, basicamente, porque muitos agentes ou funcionários públicos: a) desconhecem a essência das normas e dos princípios que regem as contratações públicas; b) temem excessivamente os órgãos de controle externo, até mesmo quando estes autorizam a prática de determinado ato.

    De qualquer forma, a decisão pela dispensa ou não de certos documentos fica a cargo de cada órgão público, diante do caso concreto, conforme já mencionei.

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  4. Luiz, você entendeu corretamente.

    O agente público deve, diante de cada caso concreto, analisar a necessidade (ou não) de fazer tais exigências.

    E, apenas reiterando o que você já disse, é óbvio que a nenhum particular é dado o direito de pleitear o tratamento em questão. Cabe exclusivamente ao agente público, em face do poder discricionário que lhe é assegurado, promover o exame da situação fática e adotar essa ou aquela medida.

    Portanto, aqueles que exercem funções no âmbito da Administração Pública não precisam se preocupar com eventuais solicitações, por parte dos particulares, de dispensa desse ou daquele documento em virtude do Acórdão mencionado.

    Preocupações e receios dessa natureza devem ser “espancados” com a certeza de que somente à Administração cabe a definição dos requisitos de habilitação, desde que observados os princípios e normas legais pertinentes.

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  5. O caput do Art. 26 da Lei de Licitações, determina que apenas sejam formalizados processos de dispensa de licitação à partir do inciso III, do Art. 24 do referido pergaminho normativo, já que com relação aos incisos I e II não há necessidade de se licitar, posto que estaria ahi incluídas compras e serviços à partir de R$ 1,00 até os limites dos pisos respectivos (R$ 8.000,00 e R$ 15.000,00) respectivamente.Acho uma grande bobagem se discutir formalidades quanto dispensa de licitação enquadráveis nesses dois incisos posto que, a própria Lei estabelece as suas dispensabilidades sem nenhuma condicionante. Perde-se tempo em razão de coisas banais.

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  6. Bom dia! Numa compra direta já empenhado o Orgão pode cancelar meu empenho,devido a minha empresa não ter uma Certidão Estadual em abrangência da data que eles querem?

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