quarta-feira, 26 de março de 2025

O papel do edital como norma vinculante da licitação

 


O processo licitatório é um dos principais instrumentos utilizados pela Administração Pública para garantir a contratação de bens e serviços de forma transparente, impessoal e eficiente. No cerne desse processo, encontra-se o edital, documento que estabelece as regras e condições que regerão a licitação.

 

O edital não é apenas um mero informativo, mas sim uma norma vinculante tanto para a Administração quanto para os licitantes, servindo como diretriz para a condução do certame e garantindo a segurança jurídica dos envolvidos.

 

A licitação não deve ser encarada como uma gincana... como um conjunto de tarefas destinadas a premiar quem melhor as desempenha! Além disso, muitas exigências editalícias não passam de regras destituídas de finalidade (documentação e/ou proposta encadernada, numerada ou apresentada em determinada sequência, proposta contendo o CNPJ etc.), criadas pela administração por despreparo ou incompetência, desleixo ou, infelizmente, para direcionar a contratação. O descumprimento desse tipo de exigência, constante de muitos editais, não deve acarretar a inabilitação da licitante ou a desclassificação de sua proposta. Como se não bastasse, há regras que devem ser interpretadas com menos rigor, tendo em vista a possibilidade de realização de diligências e de a informação ausente estar implícita em documento já entregue.

 

Aplica-se, por óbvio, o princípio do formalismo moderado.

 

A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 37, inciso XXI, determina que as contratações realizadas pelo poder público devem ser precedidas de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes. Para que esse princípio seja efetivado, o edital assume um papel fundamental ao estabelecer critérios objetivos de participação e julgamento, impedindo favorecimentos ou discriminações indevidas.

 

O caráter vinculante do edital decorre de sua função normativa dentro do processo licitatório. Isso significa que tanto os licitantes quanto a Administração devem cumprir rigorosamente o que está disposto no instrumento convocatório. O descumprimento de qualquer regra previamente estabelecida pode resultar na inabilitação do licitante ou na anulação do certame, caso a Administração descumpra suas próprias diretrizes. Essa vinculação confere previsibilidade e estabilidade ao procedimento, assegurando que todos os participantes sejam tratados de forma isonômica.

 

“O instrumento convocatório cristaliza a competência discricionária da Administração, que se vincula a seus termos. (...) Sob um certo ângulo, o edital é o fundamento de validade dos atos praticados no curso da licitação, na acepção de que a desconformidade entre o edital e os atos administrativos praticados no curso da licitação se resolve pela invalidade destes últimos.” (JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos, Revista dos Tribunais, 17ª edição, 2016, p. 904)

 

O princípio da vinculação ao edital está expressamente previsto na Lei nº 14.133/2021, conhecida como Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos, que reforça a obrigatoriedade de respeito às condições previamente estipuladas no instrumento convocatório. O artigo 5º dessa lei dispõe que o procedimento licitatório deve ser conduzido conforme as regras estabelecidas no edital, de modo que eventuais modificações durante o processo devem ser formalizadas e divulgadas com a devida antecedência, garantindo a ampla publicidade e a igualdade de oportunidades entre os concorrentes.

 

“Art. 5º Na aplicação desta Lei, serão observados os princípios da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da publicidade, da eficiência, do interesse público, da probidade administrativa, da igualdade, do planejamento, da transparência, da eficácia, da segregação de funções, da motivação, da vinculação ao edital, do julgamento objetivo, da segurança jurídica, da razoabilidade, da competitividade, da proporcionalidade, da celeridade, da economicidade e do desenvolvimento nacional sustentável, assim como as disposições do Decreto-Lei nº 4.657, de 4 de setembro de 1942 (Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro).” (grifos nossos)

 

Além de garantir a legalidade e a isonomia, o caráter vinculante do edital protege o interesse público, assegurando que a Administração contratará a proposta mais vantajosa dentro dos critérios estabelecidos. Isso impede que decisões discricionárias sejam tomadas sem respaldo normativo, reduzindo riscos de favorecimentos e corrupção. Dessa forma, o edital se torna um instrumento essencial para a eficiência da gestão pública, pois obriga a Administração a seguir um planejamento detalhado e objetivos claros ao contratar serviços ou adquirir produtos.

 

Outro ponto relevante é que o edital também funciona como um mecanismo de controle social. A publicidade do documento permite que cidadãos, órgãos de controle e empresas acompanhem os processos licitatórios, fiscalizando o cumprimento das regras e denunciando eventuais irregularidades. Essa transparência fortalece a confiança nas contratações públicas e contribui para um ambiente de negócios mais competitivo e equilibrado.

 

Contudo, para que o caráter vinculante do edital seja efetivo, é fundamental que o documento seja elaborado com clareza, objetividade e respeito às normas legais. Erros ou ambiguidades podem comprometer a segurança jurídica do certame, resultando em questionamentos administrativos e judiciais que podem atrasar ou até mesmo anular a licitação. Portanto, a Administração deve se atentar à redação do edital, garantindo que todas as exigências sejam justificadas e compatíveis com o objeto da contratação.

 

O edital, ressalte-se, apenas prevalecerá sobre os atos administrativos praticados se tal peça estiver elaborada em conformidade com a lei e com os princípios que norteiam a atividade administrativa, nem que para isso se recorra ao Judiciário.

 

Um edital viciado, por óbvio, não deve pautar decisões equivocadas, sem fundamentação jurídica válida.


Em suma, o edital desempenha um papel crucial como norma vinculante na licitação, sendo a base que assegura a transparência, a isonomia e a legalidade do procedimento. Seu cumprimento rigoroso é essencial para garantir que as contratações públicas sejam realizadas de forma justa e eficiente (desde que seja bem elaborado), beneficiando tanto a Administração quanto os licitantes e a sociedade como um todo. Dessa forma, a observância estrita das regras editalícias se revela não apenas um requisito formal, mas um imperativo para a boa gestão dos recursos públicos e a concretização dos princípios constitucionais da administração pública.

quarta-feira, 19 de março de 2025

A Pena de Multa e o Contrato Administrativo

 


O contrato administrativo é um instrumento essencial para a formalização das relações entre a Administração Pública e particulares na execução de serviços, fornecimento de bens e realização de obras. Para assegurar o cumprimento das obrigações pactuadas, a legislação prevê diversas sanções, entre elas a pena de multa. A aplicação de penalidades é fundamental para garantir a efetividade dos contratos, disciplinando condutas e prevenindo descumprimentos contratuais.

1. O Conceito de Contrato Administrativo

O contrato administrativo é aquele celebrado entre a Administração Pública e particulares, regido por normas específicas que visam assegurar a supremacia do interesse público. Diferentemente dos contratos privados, o contrato administrativo é marcado por prerrogativas da Administração, como a possibilidade de aplicação de penalidades e a rescisão unilateral.

A Lei nº 14.133/2021, que substituiu a Lei nº 8.666/1993, estabelece regras detalhadas sobre a celebração, execução e sanção nos contratos administrativos. Dentro desse contexto, a pena de multa surge como uma das principais ferramentas de coerção e garantia da execução eficiente do contrato.

2. A Pena de Multa nos Contratos Administrativos

A pena de multa é uma sanção de natureza pecuniária aplicada a contratados que descumprem obrigações contratuais. Ela pode ser imposta por diversos motivos, como atraso na execução do contrato, entrega de bens em desacordo com as especificações, descumprimento de prazos ou qualquer outra infração estipulada no edital ou no próprio contrato.

2.1. Fundamentos Legais da Aplicação da Multa

A aplicação da pena de multa está prevista na legislação que rege os contratos administrativos, notadamente na Lei nº 14.133/2021, que confere à Administração a prerrogativa de impor penalidades ao contratado que descumprir suas obrigações.

2.2. Tipos de Multa Previstas

As multas aplicáveis em contratos administrativos podem ser classificadas em diferentes tipos:

* Multa Moratória: aplicada quando há atraso no cumprimento das obrigações, como a entrega de um serviço ou fornecimento de um bem após o prazo estabelecido.

* Multa Compensatória: aplicada como forma de reparação por danos causados à Administração pelo descumprimento contratual.

A definição do tipo e do valor da multa deve estar claramente prevista no contrato, garantindo previsibilidade e segurança jurídica para as partes.

3. Critérios para Aplicação da Multa

A aplicação da pena de multa deve obedecer a critérios objetivos e atender aos princípios da administração pública, como a legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. Assim, alguns fatores precisam ser considerados:

* Grau da infração: a gravidade do descumprimento influencia a dosimetria da multa.

* Prejuízos causados à Administração: danos ao erário público podem justificar sanções mais severas.

* Histórico do contratado: empresas com recorrentes descumprimentos podem sofrer penalidades mais rígidas.

* Possibilidade de defesa: o princípio do contraditório e da ampla defesa deve ser respeitado, garantindo que o contratado tenha a oportunidade de apresentar justificativas antes da aplicação da sanção.

4. Necessidade de previsão editalícia ou contratual

Entretanto, é imprescindível que a multa esteja prevista nos editais ou nos contratos, devendo respeitar os princípios da razoabilidade e proporcionalidade.

A ausência de previsão de multa no edital ou no contrato inviabiliza a sua aplicação, por afronta à previsibilidade e à segurança jurídica da contratação.


“Art. 92. São necessárias em todo contrato cláusulas que estabeleçam:

(...)

XIV - os direitos e as responsabilidades das partes, as penalidades cabíveis e os valores das multas e suas bases de cálculo;

(...)” (grifos nossos)

 

“Art. 162. O atraso injustificado na execução do contrato sujeitará o contratado a multa de mora, na forma prevista em edital ou em contrato.” (grifos nossos)

Dito de outra forma, o edital ou o contrato devem prever, com clareza e objetividade a possibilidade de aplicação da multa e, mais que isso, o percentual e a forma de aplicação da multa. Exs.:

a) Multa de mora: 0,5% por dia de atraso na entrega do objeto, incidente sobre o valor da quantidade que deveria ser entregue (...);

b) Multa compensatória: 20% (vinte por cento) sobre o valor do contrato, em caso de inexecução parcial ou total do objeto.


“A multa moratória tem natureza autônoma e distinta da multa compensatória, não se fazendo necessária a comprovação da ocorrência de prejuízo decorrente do atraso no cumprimento do contrato para efeito de sua aplicação. Culpa exclusiva da contratada. Multa aplicada em percentual razoável, não autoriza a intervenção judicial para sua redução, sob pena de invasão de competência administrativa pelo Judiciário. Apelo da ECT provido.” (TRF5, Quarta Turma, AC nº 2008.83.00.009739-0, Rel. Des. Fed. Lazaro Guimarães, j. 24/08/2010, DJ. 02/09/2010, p. 623)

5. Consequências da Aplicação da Multa

O impacto da pena de multa sobre o contratado pode ser significativo, afetando sua reputação e sua capacidade de participar de futuras contratações com a Administração Pública. Entre as principais consequências estão:

* Descontos em pagamentos devidos: a multa pode ser descontada diretamente dos valores a serem pagos pelo contrato.

* Cobrança judicial: caso a multa não seja quitada, a Administração pode inscrevê-la em dívida ativa e executá-la judicialmente.

* Rescisão contratual: o não pagamento da multa pode resultar na rescisão unilateral do contrato.

* Impedimento para contratar com a Administração: multas elevadas podem levar à aplicação de outras penalidades, como a suspensão temporária de participação em licitações.

6. Defesa e Recursos Contra a Aplicação da Multa

Os contratados têm direito à ampla defesa e ao contraditório antes da aplicação da penalidade. O procedimento para impugnar a multa deve seguir as regras estabelecidas no contrato e na legislação vigente. Entre os principais argumentos que podem ser utilizados na defesa, destacam-se:

* Caso fortuito ou força maior: situações imprevisíveis que inviabilizaram o cumprimento do contrato podem ser justificadas.

* Erro na aplicação da multa: falhas na fundamentação da penalidade podem ser questionadas.

* Proporcionalidade da sanção: se a multa aplicada for desproporcional ao descumprimento, pode ser revista.

Os recursos administrativos devem ser apresentados dentro dos prazos estabelecidos no contrato e na legislação, garantindo que a defesa seja devidamente analisada pela Administração.

7. Conclusão

A pena de multa nos contratos administrativos é um mecanismo fundamental para garantir a execução eficiente dos serviços e bens contratados pela Administração Pública. Sua aplicação deve seguir critérios objetivos, respeitando os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, bem como assegurando o direito de defesa do contratado.

Ao mesmo tempo em que serve como um instrumento de coerção, a multa também desempenha um papel pedagógico, incentivando o cumprimento rigoroso dos contratos e contribuindo para a integridade das contratações públicas. Dessa forma, a correta aplicação das penalidades fortalece a confiança no sistema de compras públicas, assegurando que os interesses da Administração e da sociedade sejam preservados.

quarta-feira, 12 de março de 2025

Atestado de Capacidade Técnica Operacional x Atestado de Capacidade Técnico-Profissional: Diferenças e Características

 

 

No contexto das licitações e contratações públicas, a comprovação da capacidade técnica das empresas participantes é um requisito fundamental para garantir que os serviços, obras ou compras sejam executados com qualidade e eficiência. Dois dos documentos mais utilizados para essa finalidade são o Atestado de Capacidade Técnica Operacional e o Atestado de Capacidade Técnico-Profissional. Embora ambos tenham como objetivo demonstrar a aptidão da empresa para realizar determinada atividade, eles possuem naturezas, finalidades e características distintas.

 

Atestado de Capacidade Técnica Operacional é um documento que comprova a capacidade da empresa de executar obras, serviços ou fornecer produtos com base em sua experiência prévia e em sua estrutura operacional. Esse atestado é emitido por órgãos ou entidades públicas ou privadas que tenham contratado a empresa para a realização de atividades semelhantes àquelas objeto da licitação. Ele serve como uma prova de que a empresa possui know-how, recursos humanos, equipamentos e infraestrutura necessários para cumprir com as exigências do contrato.

 

Por outro lado, o Atestado de Capacidade Técnico-Profissional está relacionado à qualificação dos profissionais que compõem o quadro permanente da empresa. Esse documento comprova que a empresa conta com profissionais capacitados, habilitados e experientes para desempenhar as atividades técnicas exigidas no edital. Diferentemente do atestado operacional, que foca na empresa como um todo, o atestado técnico-profissional destaca a competência individual dos colaboradores, como engenheiros, arquitetos, técnicos e outros especialistas.

 

Registre-se, por oportuno, que a comprovação de que determinado profissional integra o “quadro permanente da empresa” se faz mediante a apresentação de:

 

a) No caso de sócio, por meio do contrato social e sua última alteração; b) no caso de empregado permanente, através de cópia das anotações da Carteira de Trabalho e Previdência Social – CTPS, de Contrato de Trabalho por Tempo Indeterminado ou de qualquer outro documento comprobatório de vínculo empregatício previsto na legislação de regência da matéria; c) no caso de profissional contratado nos termos da legislação comum, mediante apresentação da cópia do contrato de prestação de serviços (Acórdão TCU nº 6550/2024 - Primeira Câmara); d) no caso de responsável técnico, pela certidão de registro; e, e) no caso de contratação futura, pela declaração de contratação futura do(s) profissional(is) para prestação de serviço, firmada pelas partes.

 

Acerca da exigência de número mínimo de atestados, da fixação de quantitativos mínimos e do somatório desses atestados, eis o posicionamento do TCU:

 

“É ilícita a exigência de número mínimo de atestados de capacidade técnica, assim como a fixação de quantitativo mínimo nesses atestados superior a 50% dos quantitativos dos bens ou serviços pretendidos, a não ser que a especificidade do objeto recomende o estabelecimento de tais requisitos.” (Acórdão 1052/2012-Plenário, Relator: Marcos Bemquerer)

 

“A vedação ao somatório de atestados, para o fim de comprovação da capacidade técnico-operacional, deve estar restrita aos casos em que o aumento de quantitativos acarretar, incontestavelmente, o aumento da complexidade técnica do objeto ou uma desproporção entre quantidades e prazos de execução, capazes de exigir maior capacidade operativa e gerencial da licitante e ensejar potencial comprometimento da qualidade ou da finalidade almejadas na contratação, devendo a restrição ser justificada técnica e detalhadamente no respectivo processo administrativo.” (Acórdão 1153/2024-Plenário, Relator: Antônio Anastasia)

 

Uma das principais diferenças entre os dois atestados está no seu escopo. Enquanto o Atestado de Capacidade Técnica Operacional avalia a empresa de forma global, considerando sua estrutura, histórico de execução de projetos e capacidade de entrega, o Atestado de Capacidade Técnico-Profissional foca na qualificação e experiência dos profissionais que atuam na empresa. Essa distinção é crucial, pois atende a diferentes necessidades do processo licitatório: o primeiro garante que a empresa tem condições operacionais para realizar o trabalho, enquanto o segundo assegura que os profissionais envolvidos possuem as competências técnicas necessárias.

 

Outra diferença importante está na forma de obtenção desses documentos. O Atestado de Capacidade Técnica Operacional é emitido por clientes anteriores da empresa, sejam eles órgãos públicos ou privados, que atestam a execução de serviços ou obras de natureza semelhante. Já o Atestado de Capacidade Técnico-Profissional é emitido com base na comprovação da formação acadêmica, registros profissionais (como CREA, CAU, CRM, entre outros) e experiência (acervo) dos técnicos envolvidos. Em alguns casos, pode ser necessário apresentar currículos, certificados e declarações de empregadores anteriores.

 

A aplicação desses atestados também varia conforme o tipo de licitação e o objeto do contrato. Em licitações para obras de grande porte, por exemplo, o Atestado de Capacidade Técnica Operacional é essencial para demonstrar que a empresa já realizou projetos de complexidade e magnitude semelhantes. Já em licitações que exigem conhecimentos especializados, como projetos de engenharia, consultorias ou serviços de saúde, o Atestado de Capacidade Técnico-Profissional ganha maior relevância, pois comprova que a empresa conta com profissionais qualificados para desempenhar as atividades específicas.

 

A importância desses atestados no processo licitatório não pode ser subestimada. Eles servem como mecanismos de garantia para a administração pública, assegurando que as empresas contratadas possuem tanto a infraestrutura operacional quanto a expertise técnica necessárias para cumprir com as obrigações contratuais. Além disso, esses documentos contribuem para a equalização das oportunidades entre os participantes, uma vez que estabelecem critérios objetivos para a avaliação da capacidade técnica.

 

No entanto, a elaboração e a análise desses atestados exigem atenção e rigor. Por parte das empresas, é fundamental que os documentos sejam precisos, verídicos e atualizados, refletindo fielmente sua capacidade operacional e a qualificação de seus profissionais. Por parte da administração pública, é necessário que os editais estabeleçam critérios claros para a apresentação e a avaliação dos atestados, evitando subjetividades que possam comprometer a lisura do processo.

 

Um dos desafios comuns no uso desses atestados é a possibilidade de fraudes ou irregularidades. Em alguns casos, empresas podem apresentar documentos falsificados ou inflacionar sua capacidade técnica para atender aos requisitos do edital. Para combater essas práticas, é essencial que os órgãos licitantes realizem verificações minuciosas, como a confirmação dos atestados com os emissores e a análise detalhada dos currículos e registros profissionais.

 

Outro aspecto relevante é a necessidade de atualização constante desses documentos. A capacidade técnica de uma empresa e a qualificação de seus profissionais não são estáticas; elas evoluem com o tempo, seja por meio da realização de novos projetos, da aquisição de equipamentos modernos ou da capacitação dos colaboradores. Portanto, é importante que os atestados reflitam a realidade atual da empresa, e não apenas experiências passadas.

 

Assim, o Atestado de Capacidade Técnica Operacional e o Atestado de Capacidade Técnico-Profissional são instrumentos complementares e essenciais no processo licitatório. Enquanto o primeiro comprova a capacidade da empresa de executar obras, serviços ou fornecer produtos com base em sua estrutura e experiência, o segundo atesta a qualificação e a competência dos profissionais envolvidos. Ambos desempenham um papel crucial na garantia da qualidade e da eficiência das contratações públicas, contribuindo para a transparência, a competitividade e a igualdade de oportunidades no processo licitatório.


Em conclusão, para que esses documentos cumpram seu propósito, é fundamental que sejam elaborados com precisão, analisados com rigor e atualizados regularmente. Além disso, a administração pública deve adotar medidas de controle e fiscalização para prevenir fraudes e irregularidades. Somente assim será possível garantir que as licitações resultem em contratações que atendam ao interesse público e promovam o bom uso dos recursos do Estado.

terça-feira, 4 de março de 2025

Exigência de Amostras em Licitações: Aspectos Legais, Benefícios e Controvérsias

 


A exigência de amostras em licitações é um tema de grande relevância no âmbito das contratações públicas, gerando debates acerca de sua legalidade, pertinência e impactos na competição entre os licitantes. A prática de solicitar amostras dos produtos ofertados pelos participantes visa garantir a qualidade e a conformidade dos itens adquiridos pela Administração Pública, prevenindo problemas decorrentes da aquisição de produtos inadequados ou de baixa qualidade. No entanto, essa exigência também pode ser utilizada de forma abusiva, restringindo a competição e favorecendo determinados fornecedores.

 

1.        Conceito e Fundamentação Legal 

A exigência de amostras em licitações ocorre quando o edital prevê que os licitantes devem fornecer exemplares dos produtos que pretendem fornecer à Administração Pública para análise e avaliação antes da adjudicação do contrato. Essa prática está amparada nos arts. 17, § 3º, 41, II e 42, § 2º na Lei nº 14.133/2021, que regula as contratações públicas no Brasil, bem como em normas correlatas que disciplinam critérios de julgamento e qualificação técnica. 

O artigo 37 da Constituição Federal impõe os princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência para a Administração Pública, os quais devem ser observados na formulação dos editais e na condução dos processos licitatórios. A exigência de amostras está alinhada com esses princípios quando visa garantir a aquisição de produtos de qualidade adequada, prevenindo a entrega de materiais incompatíveis com as necessidades do órgão contratante. 


2. Benefícios da Exigência de Amostras

A solicitação de amostras traz vários benefícios para a Administração Pública, incluindo:

 

1. Assegurar a qualidade dos produtos adquiridos: A análise de amostras permite que a Administração verifique se o material ofertado atende aos padrões exigidos no edital, evitando aquisição de itens inadequados ou de qualidade inferior.

 

2. Prevenir fraudes e descumprimento contratual: A conferência antecipada dos produtos reduz os riscos de que fornecedores entreguem produtos diferentes dos apresentados na licitação.

 

3. Favorecer a transparência e a equidade na seleção de fornecedores: A análise técnica das amostras pode ser um critério objetivo de julgamento, reduzindo a subjetividade nas decisões administrativas.

 

4. Evitar desperdício de recursos públicos: A aquisição de produtos inadequados pode resultar em gastos adicionais com substituições e retrabalho, onerando os cofres públicos. 


3. Controvérsias e Possíveis Abusos

Apesar das vantagens, a exigência de amostras também pode gerar controvérsias e dificuldades para os licitantes. Alguns pontos problemáticos incluem:

 

1. Restrição indevida da concorrência: A exigência de amostras pode ser utilizada como barreira para limitar a participação de concorrentes, especialmente pequenas empresas que podem não ter condição financeira para fornecer amostras gratuitas.

 

2. Critérios subjetivos de avaliação: Em alguns casos, a análise das amostras pode envolver julgamentos subjetivos, favorecendo determinados fornecedores de forma arbitrária.

 

3. Custos elevados para os licitantes: A produção e envio de amostras podem representar um custo significativo para os participantes, desencorajando a participação na licitação.

 

4. Risco de descarte inadequado das amostras: Em situações em que a amostra não é devolvida ao licitante, há questionamentos sobre o destino final dos produtos, podendo haver desperdício ou uso indevido.


4. Boas Práticas para a Exigência de Amostras

Para evitar abusos e garantir que a exigência de amostras seja utilizada de forma justa e eficiente, algumas boas práticas podem ser adotadas:

 

1. Justificativa técnica no edital: A exigência deve ser fundamentada tecnicamente, demonstrando a necessidade da amostra para a verificação da qualidade do produto.

 

2. Critérios objetivos de avaliação: A análise das amostras deve ser baseada em critérios técnicos claros e verificáveis, evitando subjetividade.


3. Devolução das amostras: Sempre que possível, os produtos enviados como amostras devem ser devolvidos aos licitantes, minimizando prejuízos.


4. Tratamento isonômico entre os participantes: Todos os licitantes devem ser tratados de forma equitativa, garantindo que a exigência não favoreça ou prejudique determinados concorrentes.


5. Compatibilidade com o objeto da licitação: A exigência de amostras deve ser restrita a situações em que realmente seja necessária para avaliar a qualidade do produto ofertado.


5. TCU

 

“Somente é cabível exigir amostra de produto objeto de certame ao licitante classificado provisoriamente em primeiro lugar.” (Acórdão 1634/2007-Plenário, Relator: Ubiratan Aguiar)

 

“No caso de exigência de amostra de produto, devem ser estabelecidos critérios objetivos, detalhadamente especificados, de apresentação e avaliação, bem como de julgamento técnico e de motivação das decisões relativas às amostras  apresentadas.” (Acórdão 2077/2011-Plenário, Relator: Augusto Sherman)

 

A desclassificação de licitante deve estar amparada em laudo ou parecer que indique, de modo completo, as deficiências na amostra do produto a ser adquirido, quando esta é exigida.” (Acórdão 1291/2011-Plenário, Relator: Augusto Sherman)


Não se admite a entrega pela contratada de produto diferente da amostra apresentada e aprovada na licitação, pois a aceitação do produto demandaria nova avaliação técnica, prejudicando a celeridade da execução contratual e favorecendo a contratada em relação às demais participantes do certame.” (Acórdão 2611/2016-Plenário, Relator: Bruno Dantas)

 

“A apresentação de amostra não é procedimento obrigatório nas licitações, mas, uma vez prevista no instrumento convocatório, não se deve outorgar ao gestor a faculdade de dispensá-la, sob pena de violação dos princípios da isonomia e da impessoalidade (art. 3º, caput e § 1º, inciso I, da Lei 8.666/1993).” (Acórdão 1948/2019-Plenário, Relator: Raimundo Carreiro)

6. Conclusão

A exigência de amostras em licitações públicas é uma ferramenta importante para garantir a qualidade dos bens adquiridos pela Administração Pública. No entanto, seu uso deve ser criterioso e alinhado aos princípios da legalidade, impessoalidade e competitividade. Quando aplicada de forma adequada, a exigência de amostras contribui para uma aquisição eficiente e transparente. Por outro lado, quando imposta sem justificativa técnica ou com critérios subjetivos, pode restringir indevidamente a competição e comprometer a isonomia do certame. Assim, é essencial que os gestores públicos utilizem essa prática de maneira equilibrada, evitando distorções e assegurando que as licitações ocorram de forma justa e eficiente.

sábado, 22 de fevereiro de 2025

Certidões negativas: aspectos gerais

 

 

As certidões negativas desempenham um papel fundamental no processo de licitação pública, garantindo a idoneidade das empresas participantes e assegurando que estas estejam em conformidade com as exigências legais. Esses documentos são exigidos pelos órgãos públicos como forma de comprovar a regularidade jurídica, fiscal, trabalhista e econômico-financeira dos licitantes, sendo essenciais para garantir um ambiente competitivo e transparente.

 

a) Habilitação ou regularidade jurídica: certidões expedidas pela Junta Comercial;

b) Regularidade fiscal: CNDs federal, estadual e municipal e FGTS;

c) Regularidade trabalhista: CNDT;

d) Qualificação econômico-financeira: certidão de falência e recuperação judicial.

 

A exigência das certidões negativas decorre dos princípios que norteiam a administração pública, especialmente os da legalidade, moralidade e isonomia.

 

Por meio desses documentos, a Administração Pública pode verificar se a empresa licitante não possui pendências que possam comprometer a execução do contrato ou gerar riscos para o erário. Dessa forma, as certidões negativas funcionam como instrumentos de controle e prevenção de fraudes.

 

Dito de outra forma, o que se pretende é proibir a contratação de empresa que não paga os seus tributos regularmente, ou seja, empresa em débito com a Administração Pública.

 

Dentre as principais certidões exigidas em licitações, destacam-se:

 

1) Certidão Negativa de Débitos Relativos a Tributos Federais e à Dívida Ativa da União – Comprova que a empresa está em dia com suas obrigações fiscais perante a Receita Federal e a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional.

https://solucoes.receita.fazenda.gov.br/servicos/certidaointernet/pj/emitir

 

2) Certidão Negativa de Regularidade do FGTS – Confirma que a empresa está adimplente com as contribuições ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço.

https://consulta-crf.caixa.gov.br/consultacrf/pages/consultaEmpregador.jsf

 

3) Certidão Negativa de Débitos Trabalhistas (CNDT) – Garante que a empresa não possui pendências trabalhistas, protegendo os direitos dos trabalhadores.

https://cndt-certidao.tst.jus.br/inicio.faces

 

4) Certidão Negativa de Débitos Estaduais e Municipais – Verifica a regularidade da empresa no âmbito estadual e municipal.

Obtidas nos sites dos governos estaduais e das prefeituras.

 

5) Certidão Negativa de Falência e Recuperação Judicial – Demonstra que a empresa não está em processo de falência ou recuperação judicial, garantindo sua capacidade financeira para cumprir o contrato.

Obtidas nos sites dos Tribunais de Justiça do respectivo estado.

 

A validade das certidões negativas varia de acordo com o órgão emissor e a legislação aplicável. Em geral, os prazos mais comuns são de 30 a 180 dias, sendo imprescindível que as empresas estejam atentas à renovação periódica desses documentos para evitar sua inabilitação em certames licitatórios. No caso da CNDT e da Certidão de Débitos Relativos a Tributos Federais, por exemplo, a validade é de 180 dias.

 

O não cumprimento da exigência de apresentação de certidões negativas dentro do prazo de validade acarreta a desclassificação da empresa na licitação, impedindo-a de participar do certame ou até mesmo de assinar o contrato. Além disso, a falta de regularidade pode gerar desconfiança por parte da Administração Pública e comprometer futuras contratações.

 

Um parêntese se faz necessário em relação às MEs e às EPPs, visto que, por força dos arts. 42 e 43 da Lei Complementar nº 123/2006, a comprovação de regularidade fiscal e trabalhista de tais empresas será exigida apenas para efeito de assinatura do contrato. Ocorre, porém, que as MEs e as EPPs têm a obrigação de apresentar todas as certidões no prazo fixado no edital, ainda que haja alguma restrição nesses documentos (certidão positiva, por exemplo), sob pena de inabilitação. E vencido o prazo para a regularização da pendência e esta não vier a ser solucionada, a inabilitação se fará necessária.

 

“Portanto, o benefício reside não na dispensa de apresentação de documentos de regularidade fiscal. Nem se trata da dilação quanto à oportunidade própria para exibição dos documentos. O que se faculta é a desnecessidade de perfeita e completa regularidade fiscal no momento da abertura ou do julgamento do certame.” (JUSTEN FILHO, Marçal. O Estatuto da Microempresa e as Licitações Públicas, Dialética, São Paulo, 2007, p. 42)

 

Com a digitalização dos serviços públicos, muitos órgãos passaram a disponibilizar certidões negativas online, facilitando o acesso e agilizando o processo para os licitantes. No entanto, é essencial que as empresas mantenham um controle interno eficiente sobre a validade desses documentos, evitando problemas e garantindo sua participação em licitações sem contratempos.


Em suma, as certidões negativas são documentos indispensáveis no processo licitatório, assegurando que apenas empresas idôneas e regulares possam contratar com a Administração Pública. Sua exigência contribui para a moralidade e a eficiência das contratações públicas, protegendo os interesses do Estado e da sociedade. Portanto, a correta gestão dos prazos de validade e a manutenção da regularidade fiscal e trabalhista devem ser prioridades para qualquer empresa que deseja atuar no mercado de licitações.