sexta-feira, 29 de novembro de 2024

Sobrepreço – Possibilidade de responsabilização de empresa privada

 


As empresas que firmam contratos com a Administração Pública têm a obrigação de apresentar propostas com valores alinhados aos preços de mercado. Caso seja identificado sobrepreço no contrato, as empresas podem ser responsabilizadas. Isso ocorre porque o regime jurídico-administrativo que rege as contratações públicas, incluindo a exigência de observância aos preços praticados no mercado, é aplicável tanto aos órgãos públicos quanto aos entes privados.


quarta-feira, 27 de novembro de 2024

Necessidade de se estabelecer critérios objetivos para a avaliação da qualificação técnico-operacional

 


A ausência de critérios objetivos no edital relacionados à qualificação técnico-operacional gera sérias implicações para a lisura do processo licitatório e contraria os princípios fundamentais da administração pública, tais como a transparência, impessoalidade e julgamento objetivo.

O princípio da transparência garante que todas as regras do processo licitatório sejam claras e acessíveis aos particulares. A falta de parâmetros objetivos sobre a qualificação técnico-operacional no edital cria um cenário de insegurança jurídica, pois os participantes não conseguem antecipar quais documentos ou comprovações serão considerados suficientes para atestar a compatibilidade exigida.

Sem diretrizes claras, abre-se espaço para interpretações subjetivas por parte da Administração, o que dificulta o controle externo e interno do processo e compromete a confiança das partes.

A impessoalidade exige que a administração pública trate todos os licitantes de forma igualitária, sem favorecimentos ou discriminações. Contudo, quando o edital não apresenta critérios objetivos para análise da qualificação técnico-operacional, a decisão sobre a habilitação pode ser influenciada por aspectos subjetivos ou discricionários, favorecendo alguns concorrentes em detrimento de outros.

Essa lacuna normativa pode dar margem a condutas anticompetitivas, como direcionamento da licitação para empresas específicas, ou que ferem a essência do princípio da impessoalidade.

O julgamento objetivo é um dos pilares do procedimento licitatório, pois garante que as propostas sejam apresentadas com base em critérios claros, previamente estabelecidos no edital. A ausência de parâmetros para avaliar a qualificação técnico-operacional viola esse princípio, já que permite decisões baseadas em critérios não divulgados anteriormente ou subjetivos.

Por exemplo, ao exigir “experiência em serviços compatíveis” ou, ainda, “experiência compatível ao objeto desta licitação”, sem definir o que caracteriza essa compatibilidade, o edital deixa aberta a possibilidade de decisões arbitrárias, colocando em risco a isonomia entre os licitantes.

Como consequência, instaura-se a insegurança jurídica no procedimento, a fragilidade das decisões e o risco de corrupção.

Assim, é imprescindível que o edital estabeleça, com clareza, os parâmetros pelos quais avaliará a qualificação técnico-operacional das licitantes, com vistas a comprovar a prestação de serviços realmente pertinentes e compatíveis com o objeto licitado.

Em resumo, a ausência de parâmetros objetivos para a qualificação técnico-operacional prejudica não apenas os licitantes, mas também a própria administração pública, que corre o risco de contratar empresas privadas inaptas ou que ofertaram preços excessivos ou, ainda, ser alvo de questionamentos jurídicos. 

sexta-feira, 22 de novembro de 2024

Ao pregoeiro não compete avaliar o conteúdo da pesquisa de preços

 


Em regra, ao pregoeiro não cabe avaliar o conteúdo da pesquisa de preços realizada pelo setor competente do órgão público. Sua função restringe-se à condução do procedimento licitatório, o que inclui a verificação de conformidade das propostas, julgamento das ofertas e demais atos relacionados à regularidade formal do processo licitatório.

A pesquisa de preços, por sua vez, é uma atividade técnica realizada por setores especializados da administração pública, cujo objetivo é definir a estimativa de preços para a contratação. Portanto, a avaliação da adequação dos preços estimados ao mercado, bem como sua justificativa, são de competência dos órgãos responsáveis pela fase interna da licitação, e não do pregoeiro, que atua na fase externa do processo.

Essa separação de responsabilidades está em consonância com os princípios da segregação de funções e especialização, que visam garantir a legalidade e eficiência no processo licitatório e, além disso, resguarda o pregoeiro de eventuais responsabilizações em face de julgamentos relacionados ao conteúdo do orçamento ou pesquisa de preços.

segunda-feira, 18 de novembro de 2024

Propostas - Valores alinhados aos preços de mercado


As empresas que firmam contratos com a Administração Pública têm a obrigação de apresentar propostas com valores alinhados aos preços de mercado. Caso seja identificado sobrepreço no contrato, as empresas podem ser responsabilizadas. Isso ocorre porque o regime jurídico-administrativo que rege as contratações públicas, incluindo a exigência de observância aos preços praticados no mercado, é aplicável tanto aos órgãos públicos quanto aos entes privados. 

quinta-feira, 14 de novembro de 2024

Critérios de aceitabilidade dos preços: Unitários x Global

 


O edital deve especificar se as critérios de aceitabilidade previstas no artigo 59, inciso III, da Lei nº 14.133/2021 se aplicam apenas ao preço global da proposta ou também aos preços unitários dos itens. Essa explicação é essencial para evitar interpretações ambíguas e para garantir a isonomia entre os licitantes.

 

“Art. 59. Serão desclassificadas as propostas que:

(...)

III - apresentarem preços inexequíveis ou permanecerem acima do orçamento estimado para a contratação;

(...)”


O artigo 59, inciso III, determina que a administração deve estabelecer critérios objetivos para a aceitabilidade dos preços propostos, mas não especifica se isso se refere ao preço total ou aos valores individuais de cada item. Por isso, cabe ao edital esclarecer essa questão. Assim, o órgão licitante deve indicar se a seleção de aceitabilidade será aplicada ao valor global ou se cada item deverá respeitar os limites de preço unitário, o que pode ser especialmente relevante em licitações que envolvem grandes quantidades.

Isso ajuda a evitar contestações futuras e garante que todos os licitantes tenham conhecimento das condições desde o início do processo licitatório.

terça-feira, 12 de novembro de 2024

Exigências referentes ao SPED no âmbito da qualificação econômico-financeira

 


A qualificação econômico-financeira nas licitações é um requisito crucial para garantir que os concorrentes possuam saúde financeira suficiente para assumir e concluir o objeto contratual. Trata-se de uma análise que visa minimizar os riscos de inadimplência, garantindo que apenas empresas com capacidade se habilitem a apresentar propostas.

Entre os documentos exigidos para a comprovação da qualificação econômico-financeira estão balanços patrimoniais e projeções contábeis dos últimos exercícios sociais. E, nesse contexto, o Sistema Público de Escrituração Digital (SPED) exerce um papel fundamental. Instituído para unificar as atividades de recepção, validação, armazenamento e autenticação de livros e documentos contábeis e fiscais das empresas, o SPED permite às entidades públicas acesso a informações precisas e padronizadas, tornando o processo de qualificação mais transparente e equilibrado.

O uso do SPED na fase de habilitação econômico-financeira traz vantagens tanto para os órgãos licitantes quanto para os licitantes. Do ponto de vista das empresas, ele simplifica e agiliza a apresentação de documentos, permitindo a utilização de dados diretamente do sistema contábil da empresa, o que reduz erros e inconsistências e elimina a necessidade de autenticação em cartórios, o que representa uma economia de tempo e de recursos. Já para o órgão público, a verificação dos documentos contábeis digitalizados no SPED facilita a análise de conformidade fiscal e financeira, reduzindo a subjetividade e aumentando a segurança do processo.

É importante que as empresas mantenham suas obrigações contábeis rigorosamente atualizadas e em conformidade com o SPED, pois a ausência de registros ou a inconsistência nas informações contábeis podem levar à inabilitação. A cada ano, os órgãos de controle aprimoram as verificações, buscando identificar empresas que não estejam em conformidade fiscal, ou que reforcem a necessidade de uma escrituração contábil precisa e em dia.

Além disso, o SPED colabora com a fiscalização da Receita Federal, pois os dados contábeis transmitidos pelas empresas são cruzados com as informações fiscais, o que torna possível identificar divergências e fraudes. Assim, empresas que buscam manipular informações para aparentar uma solidez financeira que não possuem são identificadas com mais facilidade, o que aumenta a supervisão dos processos licitatórios. Esse sistema reforça o papel fiscalizador dos órgãos públicos, promovendo uma análise mais criteriosa e uma seleção de fornecedores realmente qualificados.

As exigências de qualificação econômico-financeira baseadas em informações do SPED promovem, portanto, um ambiente de concorrência mais saudável e equilibrado, no qual a competitividade é alicerçada em bases financeiras sólidas e transparentes. Empresas que investem em uma contabilidade regular e em conformidade com o SPED ganham vantagem em processos licitatórios, já que estão aptas a comprovar de forma clara e indiscutível sua capacidade de execução do contrato e de cumprimento dos compromissos financeiros ao longo do projeto. Essa clareza e padronização dos dados financeiros garantem que a empresa atenda às exigências da Administração Pública, demonstrando que possui os recursos e a estrutura necessária para arcar com as obrigações contratuais sem comprometer a qualidade da prestação.

Em suma, o SPED não apenas simplifica a rotina documental das empresas e do próprio órgão licitante, mas também contribui para uma Administração Pública mais eficaz e para contratações mais seguras e sustentáveis. No ambiente licitatório, onde a transparência e a probidade são fundamentais, a qualificação econômico-financeira reforçada no SPED representa um avanço significativo, proporcionando à sociedade uma prestação de serviços públicos de qualidade e com menos riscos de interferências, inadimplências e falhas contratuais. O SPED garante que apenas empresas que apresentem solidez e regularidade contábil possam participar e se qualificar, evitando que licitações sejam vencidas por empresas sem estrutura financeira adequada, que poderiam, eventualmente, abandonar projetos ou entregar serviços de baixa qualidade.

A Lei de Licitações e Contratos Administrativos (Lei nº 14.133/2021) já prevê, em seu artigo 69, I, a necessidade de comprovação de capacidade econômico-financeira dos licitantes, exigindo que as empresas apresentem balanço patrimonial, demonstração de resultado de exercício e demais demonstrações contábeis dos 2 (dois) últimos exercícios sociais. Com o advento do Sistema Público de Escrituração Digital (SPED), instituído pelo Decreto nº 6.022/2007, esse processo se tornou mais rigoroso e padronizado. O SPED representa um avanço no controle e na fiscalização contábil e tributária, exigindo que as empresas mantenham sua escrituração de maneira digital, integrada e atualizada.

No contexto das licitações, o SPED trouxe um novo nível de transparência e confiabilidade, sendo atualmente uma exigência indireta, pois é obrigatório para todas as empresas que utilizam o regime de tributação pelo lucro real e pelo lucro presumido, conforme determinações da Receita Federal. Desta forma, empresas que participam de licitações e se enquadram nesses regimes tributários precisam, obrigatoriamente, utilizar o SPED para realizar sua contabilidade, sob pena de estarem em desconformidade com a legislação fiscal e contábil, o que pode afetar sua habilitação.

A obrigatoriedade de utilização do SPED implica que as empresas apresentem projeções contábeis padronizadas e validadas digitalmente, o que facilita a análise da qualificação econômico-financeira pelo órgão licitante. O SPED permite que as informações contábeis sejam cruzadas com outros sistemas da Receita Federal, como a EFD (Escrituração Fiscal Digital) e a ECD (Escrituração Contábil Digital), possibilitando uma verificação minuciosa da situação financeira e tributária da empresa. Dessa forma, inconsistências ou omissões podem ser facilmente identificadas, e as empresas são incentivadas a manter uma contabilidade rigorosa e em conformidade.

De forma geral, a maioria das pessoas jurídicas é obrigada a enviar a SPED Contábil, inclusive as pessoas físicas equiparadas às pessoas jurídicas, as isentas e as imunes ficam obrigadas a apresentar a ECD. 

Enquanto o balanço patrimonial encontra fundamento legal no Código Civil, o SPED possui diploma legal próprio, o Decreto nº 6.022, de 22 de janeiro de 2007.

A seu turno, a Instrução Normativa RFB 2003 de 2021 define quais são as empresas que precisam entregar o SPED Contábil.

De acordo com o art. 3º do Instrução Normativa retro citada, “deverão apresentar a Escrituração Contábil Digital (ECD) as pessoas jurídicas, inclusive as equiparadas e as entidades imunes e isentas, obrigadas a manter escrituração contábil nos termos da legislação comercial.”

De outro lado, o § 1º do mesmo art. 3º da IN RFG 2003, de 2021, estabelece que ficam dispensados do envio do SPED contábil:

 

a - as pessoas jurídicas optantes pelo Regime Especial Unificado de Arrecadação de Tributos e Contribuições devidos pelas Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Simples Nacional), instituído pela Lei Complementar nº 123, de 14 de dezembro de 2006;

 

b - os órgãos públicos, às autarquias e às fundações públicas;

 

c - as pessoas jurídicas inativas, assim consideradas aquelas que não tenham efetuado qualquer atividade operacional, não operacional, patrimonial ou financeira, inclusive aplicação no mercado financeiro ou de capitais, durante todo o ano-calendário, as quais devem cumprir as obrigações acessórias previstas na legislação específica;

 

d - as pessoas jurídicas imunes e isentas que auferiram, no ano-calendário, receitas, doações, incentivos, subvenções, contribuições, auxílios, convênios e ingressos assemelhados cuja soma seja inferior a R$ 4.800.000,00 (quatro milhões e oitocentos mil reais) ou ao valor proporcional ao período a que se refere a escrituração contábil;

 

e - as pessoas jurídicas tributadas com base no lucro presumido que cumprirem o disposto no parágrafo único do art. 45 da Lei nº 8.981, de 20 de janeiro de 1995; e

 

f - a entidade Itaipu Binacional, tendo em vista o disposto no art. XII do Decreto nº 72.707, de 28 de agosto de 1973.

A obrigatoriedade do SPED torna o processo de habilitação mais seguro para a Administração, pois os documentos contábeis transmitidos pelo sistema são autenticamente validados, permitindo ao órgão público verificar a conformidade dos dados de maneira eficiente. Isso reduz a subjetividade na análise econômico-financeira e garante que as informações comprovadas reflitam a condição real da empresa. Além disso, a padronização facilita a comparação entre concorrentes, pois todos são avaliados com base em critérios pré-estabelecidos.

Para as empresas que participam de licitações, o uso do SPED é também uma questão estratégica. Aqueles que têm sua escrituração contábil rigorosamente organizada e em dia ganham um diferencial competitivo, pois estão aptos a comprovar sua solidez financeira de maneira clara e documentada, aumentando suas chances de habilitação. Além disso, o SPED reduz o risco de negociação tributária, uma vez que obriga as empresas a cumprir fielmente suas obrigações fiscais e contábeis, o que também contribui para a transparência e confiabilidade nas operações financeiras.

A ausência de utilização do SPED ou o envio de dados incompletos pode levar à inabilitação de uma empresa no processo licitatório, pois a Administração tem acesso a informações cruzadas que demonstram a situação contábil e fiscal do licitante. Empresas que, por exemplo, tentam mascarar sua condição financeira, omitindo passivos ou inflando ativos, podem ser facilmente detectadas pelo órgão licitante, graças ao cruzamento de informações contábeis no SPED, o que previne fraudes e promessas de execução que não são finitas.

Em resumo, a obrigatoriedade da contabilização via SPED representa um avanço significativo na qualidade econômico-financeira comum nas licitações. Ao integrar e padronizar as informações contábeis e fiscais, o SPED torna o processo licitatório mais transparente, seguro e eficiente, garantindo que apenas empresas financeiramente saudáveis ​​e em conformidade com a legislação adequada a competir por contratos públicos. Para a Administração, isso significa a redução de riscos e o aumento da confiabilidade nos fornecedores contratados. Para as empresas, a utilização do SPED não é apenas uma obrigação legal, mas também uma oportunidade de demonstrar um perfil mais transparente e sólido ao mercado.


sexta-feira, 8 de novembro de 2024

Estratégias para elaborar um bom recurso administrativo ou impugnação a edital

 



1 – Introdução;

2 – Estrutura;

2.1 – Endereçamento;

2.2 - Indicação do número do edital e do número do processo;

2.3 – Preâmbulo;

2.4 – Tempestividade;

2.5 – Razões do recurso ou da impugnação;

2.5.1 – Narrativa clara e lógica dos fatos;

2.5.1.1 – Roteiro;

2.5.1.1.1 – Sugestão de tópicos genéricos para argumentação;

2.5.2 – Elementos de fundamentação;

2.5.2.1 – Menção e transcrição dos dispositivos legais violados;

2.5.2.2 – Princípios jurídicos;

2.5.2.3 – Argumento de autoridade;

2.5.2.4 – Disposições editalícias;

2.5.3 – Documentação que possa ser apresentada para reforçar os argumentos apresentados;

2.6 – Requerimento;

3 – Estratégias pontuais;

4 – Considerações finais.

 

1 – Introdução

 

Atendendo a pedidos, hoje iremos abordar, de forma direta e prática, um tema bastante sensível na área das licitações e contratos: recurso e impugnação ao edital.

De início, é importante ressaltar que eu já tive a oportunidade de tratar do assunto em outro post (https://olicitante.blogspot.com/2013/11/impugnacao-de-edital-de-licitacao-e.html), sendo que a leitura daquele pode complementar o entendimento deste.

Foi dito, naquela oportunidade que o particular deve fundamentar adequadamente o seu pedido a fim de obter um julgamento favorável.

Pontuamos, ainda, que:

 

“A legislação referente ao pregão, por exemplo, exige que até mesmo a manifestação da intenção de recurso se dê de forma motivada (fundamentada).

 

(...)

 

A propósito, a doutrina especializada é no sentido de que um recurso que não aponta vícios, equívocos ou divergências na decisão recorrida não deve ser conhecido.

 

Assim, além de narrar os fatos com clareza, o particular deve indicar o vício da decisão atacada, correlacionando-a com a norma legal ou editalícia infringida, sendo certo afirmar, também, que o licitante ou contratado não está obrigado a citar ou transcrever doutrina e jurisprudência em suas peças.”

Entretanto, conforme ficou pontuado naquela oportunidade, muito embora o licitante ou contratado não esteja obrigado a citar ou transcrever doutrina e jurisprudência em suas peças, o êxito de qualquer pleito formulado em face da Administração Pública (AP) depende, em especial, da adequada fundamentação jurídica (indicação dos dispositivos legais aplicáveis/violados, citações doutrinárias e orientações jurisprudenciais), tendo em vista a complexidade da matéria, a arbitrariedade muitas vezes manifestada pela Administração, as praxes reprováveis de alguns órgãos ou entes públicos e, até mesmo, o desconhecimento da Administração.

Mas vamos deixar um pouco de lado a teoria e vamos à prática...

Então, como elaborar um bom recurso administrativo ou impugnação de edital?

Vamos ao passo a passo...

 

2 – Estrutura

 

Em primeiro lugar, você deve estruturar bem o seu recurso ou impugnação. E o que se entende por “estruturar bem”? É necessário que a peça contenha o endereçamento, a indicação do número do edital e do número do processo, o preâmbulo, considerações sobre a tempestividade, as razões do recurso/impugnação e o requerimento (pedido).

 

ð    Endereçamento

ð    Indicação do número do edital

ð    Indicação do número do processo (caso o edital traga esse número)

ð    Preâmbulo

ð    Considerações sobre a tempestividade

 

I – Da Tempestividade

 

ð    Razões de Recurso/Impugnação

 

II – .......(conforme o caso concreto)........

III - .......(conforme o caso concreto)........

IV - .......(conforme o caso concreto)........

(...)

 

ð    Requerimento

 

VI – Do Pedido


2.1 – Endereçamento

 

O endereçamento da peça recursal é a primeira parte de uma peça processual, na qual se identifica a autoridade ou órgão a quem a petição será dirigida. Esse endereçamento deve ser feito de forma precisa, pois direciona o recurso à autoridade competente para conhecê-lo e julgá-lo. Em licitações e contratos administrativos, isso geralmente envolve endereçar o recurso à própria autoridade administrativa responsável pelo julgamento ou decisão, dependendo do tipo de recurso e do procedimento adotado no edital.

Exemplo:

 

“ILMO. SR. PREGOEIRO DA SECRETARIA MUNICIPAL DE CULTURA DE FORTALEZA.”

 

“ILMOS. SRS. MEMBROS DA COMISSÃO PERMANENTE DE LICITAÇÃO DA SECRETARIA DE ESTADO DE SAÚDE DE MINAS GERIAS”

 

“ILMO. SR. SECRETÁRIO ESTADUAL DE SAÚDE DE MINAS GERAIS” (no caso de recurso contra a aplicação de penalidade, de rescisão contratual ou de anulação ou revogação de licitação, p. ex.) (Deve-se verificar no edital ou nos atos normativos do ente público quem é autoridade competente para o julgamento do recurso)

 

 

2.2 - Indicação do número do edital (ou do contrato, conforme o caso) e do número do processo

 

Em seguida, deve ser feita menção ao número do edital ou do contrato e ao número do processo (caso o edital traga esse número):

 

“ILMOS. SRS. MEMBROS DA COMISSÃO PERMANENTE DE LICITAÇÃO DA SECRETARIA DE ESTADO DE SAÚDE DE MINAS GERIAS.

 

Concorrência nº ___/_____

Processo n° __________________

 

 

(.....aproximadamente 10 linhas de espaço...)

 

 

ð    Preâmbulo

ð    Considerações sobre a tempestividade

ð    Razões do recurso/impugnação

ð    Requerimento (pedido)”

 

2.3 - Preâmbulo

 

O preâmbulo é a parte introdutória da peça que contém o nome e a qualificação das partes envolvidas; a capacidade postulatória (neste ato representada por seu sócio, fulano de tal, ou por intermédio do seu procurador infra-assinado); o inconformismo (“contra o julgamento/decisão da d. CPL (ou do I. Secretário Estadual de Saúde)” ou “em razão dos vícios que o maculam”); o fundamento legal (citação do dispositivo legal pertinente); o nome da peça (RECURSO ADMINISTRATIVO/IMPUGNAÇÃO AO EDITAL ...); o oferecimento das razões (“pelos motivos de fato e de direito a seguir aduzidos”).

 

O preâmbulo deverá ser iniciado após saltar-se, aproximadamente, 10 linhas do endereçamento ou da identificação do edital e do processo, o que por último tiver ocorrido.

 

Exemplo:

 

“ILMOS. SRS. MEMBROS DA COMISSÃO PERMANENTE DE LICITAÇÃO DA SECRETARIA DE ESTADO DE SAÚDE DE MINAS GERIAS.

 

Concorrência nº ___/_____

Processo n° __________________

 

 

(.....aproximadamente 10 linhas de espaço...)

 

 

______(RAZÃO SOCIAL DA EMPRESA)____, pessoa jurídica de direito privado regularmente constituída, inscrita no CNPJ/MF sob o nº ________________, sediada na Rua/Av. ____________________, nº ___, Sala ____, bairro ___________, em ___(cidade)____, ___(estado)___, na qualidade de licitante, neste ato representada por seu sócio ____(FULANO DE TAL)___, brasileiro, casado, empresário, residente e domiciliado à Rua/Av. ____________________, nº ___, bairro ___________, em ___(cidade)____, ___(estado)___, portador da Cédula de Identidade nº _____________, expedida pela ________, e do CPF/MF nº ___________, vem, tempestivamente, com respeito e acatamento devidos à presença de Vossas Senhorias, para interpor (...)

 

(...) RECURSO ADMINISTRATIVO contra o julgamento da d. Comissão Permanente de Licitação, com fundamento no art. 165, inciso I, alínea (“a”, “b”, “c”, “d” ou “e”, conforme o caso) (ou art. 157 ou 158, em caso de penalidade) da Lei nº 14.133/2021, pelos motivos de fato e de direito a seguir aduzidos.

 

OU

 

(...) IMPUGNÇAÕ AO EDITAL EM EPÍGRAFE, em razão dos vícios que o maculam, com fundamento no art. 164 da Lei nº 14.133/2021, pelos motivos e fundamentos a seguir aduzidos.”

 


2.4 – Tempestividade

 

 

A tempestividade de uma peça recursal refere-se ao cumprimento do prazo legal para a interposição do recurso ou para a apresentação da impugnação ao edital. Esse é um requisito essencial para que o recurso ou impugnação sejam conhecidos, ou seja, para que eles possam ser admitidos e apreciados pela autoridade competente. No contexto de licitações e contratos administrativos, os prazos para recursos e impugnações são geralmente curtos e estabelecidos na própria legislação ou no edital, e o não cumprimento desses prazos leva ao arquivamento do recurso por intempestividade, sem apreciação do mérito.

 

 

“I – DA TEMPESTIVIDADE

 

“Considerando que o julgamento fora proferido em 29/10/24, conforme ‘Termo de Julgamento’, e que a intenção de recurso fora manifestada nesse mesmo dia (doc. anexo), resta evidenciada a tempestividade do presente Recurso, visto que interposto em conformidade com as regras estampadas no art. 165, I, “c”, da Lei nº 14.133/2021 e nos itens 11.1, 11.2 e 11.3.3 do edital em comento.”

 

 

“Tendo em vista que a ora Recorrente manifestou a sua intenção de recorrer no dia ___/___/___, às 17:00 horas, data em que fora proferido o julgamento, as presentes razões recursais se afiguram tempestivas, visto que atendem à regra estampada no § 1º do art. 44 da do Decreto nº 10.024/2019:

 

Art. 44.  Declarado o vencedor, qualquer licitante poderá, durante o prazo concedido na sessão pública, de forma imediata, em campo próprio do sistema, manifestar sua intenção de recorrer.

§ 1º  As razões do recurso de que trata o caput deverão ser apresentadas no prazo de três dias.

(...).” 

 

2.5 – Razões do recurso/impugnação


 

As razões de recurso ou da impugnação são o cerne da peça recursal, onde o requerente expõe de maneira fundamentada os motivos pelos quais a decisão administrativa ou o ato deve ser revisto. Essa seção é fundamental, pois é nela que o particular irá desenvolver sua argumentação, apontando os erros, irregularidades, ou equívocos que identificou no ato impugnado, buscando convencer a autoridade competente a reformar a decisão.

 

Aqui estão os elementos essenciais que devem compor as razões de recurso/impugnação:

 

1. Exposição detalhada e objetiva dos Fatos

2. Identificação das Irregularidades ou Vícios

3. Fundamentação Jurídica

4. Demonstração do Prejuízo para a Recorrente e, se for o caso, para a Administração;

5. Pedido de Revisão ou Reforma.

 

As razões de recurso/impugnação são, portanto, uma exposição fundamentada, lógica e detalhada dos motivos pelos quais a requerente entende que a decisão/ato deve ser revista(o). Ao estruturar essa parte com cuidado e precisão, aumenta-se significativamente a chance de acolhimento do recurso.

 

É nas razões de recurso ou da impugnação que são abordados os tópicos de argumentação, organizados em títulos e subtítulos (tratados no item “Roteiro”, adiante).

 


2.5.1 – Narrativa clara e lógica dos fatos;

 

A narrativa dos fatos consiste no relato, em ordem cronológica, dos fatos juridicamente relevantes para fins de aplicação da lei, ou seja, consiste no relato dos vícios e dos prejuízos resultantes de eventual decisão (recurso), julgamento (recurso) ou cláusula (impugnação) estabelecida pela Administração Pública, contendo a devida fundamentação jurídica. Dito de outra forma, consiste em demonstrar o motivo que está levando o particular a interpor o recurso ou a impugnação ao edital.

É importante ressaltar que é de extrema importância que o recurso ou impugnação sejam elaborados com estrita observância da norma culta. Não há nada mais desagradável do que ler uma peça mal escrita ou, pior, ininteligível, com erros de concordância, pontuação, acentuação enfim...

A boa redação pressupõe clareza de ideias. E clareza, como todos sabem, é fundamental para que o destinatário da peça possa compreender o que se está a dizer.

E, para que haja clareza, o texto precisa ser coeso (a relação de sentido entre as palavras; articulação entre os componentes de um texto) e coerente (contextualização das ideias).

Quanto aos fatos propriamente ditos, você deverá narrá-los da forma mais detalhada possível, a fim de que não pairem dúvidas acerca do que se comunica. É preciso que se “desenhe” para que a Administração Pública compreenda o que se pretende transmitir. Relate os fatos como se estivesse explicando para uma criança de 10 anos. Vale muito a pena investir um pouco do seu tempo nesse trabalho. Aliás, isso não é uma faculdade atribuída ao particular, ao contrário, trata-se de um dever! Quem deseja ser compreendido deve se comunicar bem!!!

E lembre-se, o diabo mora nos detalhes. Não deixe nenhum detalhe passar despercebido. Aborde todos eles, de forma minuciosa.

Nos processos administrativos e judiciais, cada detalhe conta — um pequeno descuido ou uma omissão em algum ponto específico pode ser decisivo para o resultado do caso.

Em um recurso ou impugnação, a descrição de situações fáticas, detalhes como a escolha das palavras, a precisão dos argumentos, a fundamentação jurídica bem embasada e a correta interpretação das normas aplicáveis são essenciais para uma argumentação sólida. A Administração Pública tende a ser rigorosa na análise dos requisitos formais e substantivos, o que torna o trabalho cuidadoso e meticuloso ainda mais necessário.

 

2.5.1.1 – Roteiro

 

A partir desse ponto, é importante que você faça um ROTEIRO (pode ser feito à mão, como um rascunho), um esqueleto da argumentação, a partir dos fatos que permeiam o caso.

O roteiro deve contemplar a exposição detalhada e objetiva dos fatos, a identificação das irregularidades ou vícios, a fundamentação jurídica e a demonstração do prejuízo para a recorrente e, se for o caso, para a Administração;

Exemplos:

 

1) Suponhamos que você apresentará um recurso contra a desclassificação de sua proposta em razão de uma suposta inexequibilidade do preço ofertado, sem a concessão da oportunidade de você demonstrar a viabilidade dos preços ofertados.

 

Aqui, a título de exemplo, você pode estabelecer o seguinte roteiro (tópicos que você pode abordar no recurso):

a) Apontamento da irregularidade ou vício detectado;

b) Art. 59, § 4º, da Lei nº 14.133/2021;

c) Princípio da eficiência;

d) Dever de a Administração realizar diligências;

e) Presunção relativa da inexequibilidade;

f) Necessidade de a Administração demonstrar o risco à execução do contrato;

g) Necessidade de a Administração conferir ao particular a possibilidade de demonstrar a viabilidade de sua proposta;

h) Demonstração da viabilidade da proposta, pelo licitante, mediante a apresentação de memórias de cálculos, planilhas demonstrativas, notas fiscais, contratos ou circunstâncias (desnecessidade de mobilização, p. ex.) que justifiquem os preços ofertados;

i) Dever de a Administração adotar as cautelas indispensáveis à avaliação precisa das propostas e da documentação de habilitação das licitantes;

j) Demonstração dos prejuízos para a Administração: prejuízos aos cofres públicos, em face da desclassificação de uma proposta vantajosa (princípio da economicidade);

k) Demonstração dos prejuízos para o particular;

l) Crivo (exame ou apreciação) dos órgãos de controle externo;

m) Possibilidade de responsabilização do agente responsável pelo ato.

 


Não significa que cada um desses tópicos constitua um título ou subtítulo. É possível agrupar dois ou mais tópicos dentro de um único título, por exemplo:

 

 

“Dos Prejuízos Resultantes da Desclassificação Indevida

 

i) Dever de a Administração adotar as cautelas indispensáveis à avaliação precisa das propostas e da documentação de habilitação das licitantes;

j) Demonstração dos prejuízos para a Administração: prejuízos aos cofres públicos, em face da desclassificação de uma proposta vantajosa (princípio da economicidade);

k) Demonstração dos prejuízos para o particular;”

 

 

2) Suponhamos, agora, que você apresentará uma impugnação a um edital para a execução de obra com certo nível de  complexidade que foi omisso quanto às exigências de qualificação técnica em nome da empresa, ou seja, um edital que deixou de exigir a comprovação de aptidão mediante a apresentação de atestados (desde que você tenha os atestados, obviamente).

 

O roteiro pode ser assim definido:

 

a) Apontamento da irregularidade ou vício detectado;


b) Art. 67, II, da Lei nº 14.133/2021;


c) Necessidade de a AP dar observância ao princípio do planejamento;


d) Necessidade de observância ao princípio da eficiência;


e) Necessidade de a AP observar o princípio da legalidade, tendo em vista a complexidade do objeto a ser executado e a existência de previsão legal para a exigência de atestados;


f) Necessidade de a AP conferir segurança jurídica à contratação;


g) Necessidade de a AP assegurar a satisfação do interesse público, representada pela execução do objeto com segurança, qualidade e economicidade (risco de a AP contratar uma prestação com qualidade ou preço duvidosos);


h) Prejuízos aos cofres públicos decorrentes da contratação de empresa inapta para a execução do objeto (prejuízos decorrentes da prestação de serviços imprestáveis ou de uma eventual rescisão contratual em face da inexecução do objeto e da necessidade de se contratar o remanescente);


i) Crivo dos órgãos de controle externo;


j) Possibilidade de responsabilização do agente responsável pelo ato (elaboração do edital).

 

A ideia do uso de um roteiro consiste em abordar, no recurso ou na impugnação, cada um dos tópicos nele apontados, observando-se a melhor ordem cronológica possível.

 

Utilizar essa ferramenta para elaborar um recurso ou impugnação a edital traz inúmeros benefícios, principalmente por garantir uma estrutura bem organizada e completa.

 

Seguir um roteiro é uma estratégia de argumentação que ajuda a manter a qualidade técnica e a eficiência na elaboração da peça, além de assegurar que todos os elementos necessários estejam presentes.

 

Aqui estão algumas das principais vantagens:

 

1. Organização lógica dos fatos e coerência;

2. Completa cobertura dos pontos essenciais;

3. Economia de tempo na elaboração da peça e maior eficiência;

4. Redução de erros e inconsistências;

5. Clareza e persuasão;

6. Qualidade e consistência.

 

2.5.1.1.1 – Sugestão de alguns tópicos genéricos para a argumentação

 

·                    Princípio da competitividade;

·                    Princípio da vinculação ao instrumento convocatório;

·                    Princípios da proporcionalidade e razoabilidade;

·                    Princípio da eficiência (dever de eficiência);

·                    Vedação ao enriquecimento ilícito da Administração;

·                    Dever de planejamento;

·                    Dever de observância à lei e aos princípios jurídicos;

·                    O risco de ocasionar prejuízos aos cofres públicos;

·                    O crivo dos órgãos de controle externo;

·                    O risco de responsabilização do agente do público;

·                    Rigorismo formal exacerbado;

·                    Necessidade de se assegurar a satisfação do interesse público;

·                    Dever de motivação dos atos administrativos;

·                    Qualidade da contratação;

·                    Segurança jurídica da contratação.

 

2.5.2 – Elementos de fundamentação

 

Os elementos de fundamentação em uma peça recursal ou em uma impugnação são os componentes que sustentam juridicamente os argumentos apresentados, dando-lhes embasamento técnico e legal. A fundamentação é a base lógica e normativa do recurso e é essencial para convencer a autoridade competente de que o ato questionado deve ser revisto.

 

2.5.2.1 – Menção e transcrição dos dispositivos legais violados/aplicáveis

 

É importante que sejam citados e transcritos os dispositivos legais violados/aplicáveis que guardem conexão com os fatos e o pedido. Dessa forma, você demonstra com clareza o vício constante do ato (decisão, julgamento, edital etc.).

Essa técnica é uma estratégia essencial para fundamentar o pedido e demonstrar de forma objetiva que o ato impugnado está em desacordo com a legislação. Esse processo envolve não apenas citar as normas pertinentes, mas também, em alguns casos, transcrevê-las, para facilitar o entendimento do ponto de vista do recorrente.

Geralmente, as citações são colocadas no texto de forma recuada, em itálico e entre aspas, mencionando a fonte (por exemplo: Lei nº 14.133/2021, Marçal Justen Filho etc.).

Exemplos:

 

“Art. 164. Qualquer pessoa é parte legítima para impugnar edital de licitação por irregularidade na aplicação desta Lei ou para solicitar esclarecimento sobre os seus termos, devendo protocolar o pedido até 3 (três) dias úteis antes da data de abertura do certame.

Parágrafo único. A resposta à impugnação ou ao pedido de esclarecimento será divulgada em sítio eletrônico oficial no prazo de até 3 (três) dias úteis, limitado ao último dia útil anterior à data da abertura do certame.” (Lei nº 14.133/2021)

 

“Art. 165. Dos atos da Administração decorrentes da aplicação desta Lei cabem:

I - recurso, no prazo de 3 (três) dias úteis, contado da data de intimação ou de lavratura da ata, em face de:

(...)

c) ato de habilitação ou inabilitação de licitante;

(...)” (Lei nº 14.133/2021)

 

 

2.5.2.2 – Princípios Jurídicos

 

Os princípios administrativos são diretrizes que orientam a atuação da Administração Pública, buscando garantir que seus atos sejam realizados de forma justa, ética e transparente. Na prática, os princípios administrativos estão previstos tanto na Constituição Federal quanto em legislações específicas, como a Lei nº 14.133/2021, que rege as licitações e contratos. Esses princípios servem de base para a interpretação e aplicação das normas administrativas, funcionando como verdadeiros pilares do direito administrativo.

Podemos citar os seguintes:

 

Ø  Princípio da legalidade;

Ø  Princípio da impessoalidade;

Ø  Princípio da moralidade;

Ø  Princípio da publicidade;

Ø  Princípio da eficiência;

Ø  Princípio do interesse público;

Ø  Princípio da probidade administrativa;

Ø  Princípio da igualdade;

Ø  Princípio do planejamento;

Ø  Princípio da transparência;

Ø  Princípio da eficácia;

Ø  Princípio  da segregação de funções;

Ø  Princípio da motivação;

Ø  Princípio da vinculação ao edital;

Ø  Princípio do julgamento objetivo;

Ø  Princípio da segurança jurídica;

Ø  Princípio da razoabilidade;

Ø  Princípio da competitividade;

Ø  Princípio da proporcionalidade;

Ø  Princípio da celeridade;

Ø  Princípio da economicidade;

Ø  Princípio do desenvolvimento nacional sustentável.

 

2.5.2.3 – Argumentos de autoridade

 

O argumento de autoridade é um recurso de argumentação em que se pretende sustentar determinado posicionamento defendido por meio da citação de uma fonte confiável (doutrina, jurisprudência), agregando-se peso ao discurso, por exemplo, um especialista em direito administrativo, um escritor reconhecido, um filósofo renomado etc.

A ideia central é que, ao trazer um especialista respeitado para sustentar determinada opinião, aumente a credibilidade da argumentação e a persuasão do interlocutor.

Esse tipo de argumento pode ser muito eficaz em contextos onde o interlocutor valoriza a opinião de especialistas, mas deve ser usado com cuidado para evitar a "falácia de apelo à autoridade". Essa falácia ocorre quando se tenta validar uma afirmação apenas pela autoridade acima, sem uma análise crítica ou evidências adicionais, o que pode defender o argumento caso a autoridade não seja relevante ou suficientemente fundamentada no tema abordado.

O argumento de autoridade, quando bem utilizado, é um recurso poderoso de persuasão e pode trazer legitimidade a um discurso. No entanto, ele precisa ser utilizado de maneira criteriosa, garantindo que a autoridade mencionada seja realmente comprometida com o assunto em questão e que existam evidências consistentes que sustentam o ponto de vista defendido, evitando-se a "falácia de apelo à autoridade". Essa falácia ocorre quando se tenta validar uma afirmação apenas pela autoridade do especialista, sem uma análise crítica ou evidências adicionais que poderiam sustentar o argumento caso a autoridade não seja relevante ou caso apresente fundamentação insuficiente.

 

2.5.2.3.1 – Citações doutrinárias

 

As citações doutrinárias (trechos de obras de autores renomados) são referências a teorias, interpretações e análises de autores renomados no campo jurídico. Elas desempenham papel essencial na fundamentação de argumentos em petições, pareceres e sentenças, conferindo maior credibilidade e profundidade à argumentação. Os estudiosos do Direito desenvolvem teorias a partir da análise da legislação, das decisões judiciais e do contexto histórico e social em que as normas estão inseridas, oferecendo interpretações que podem orientar a aplicação da lei.

 

“As regras contidas no § 1º autorizam mera presunção relativa de inexequibilidade. O licitante cuja proposta for inferior ao limite do § 1º dispõe da faculdade de provar à Administração que dispõe de condições materiais para executar sua proposta. Haverá uma inversão do ônus da prova, no sentido de que se presume inexequível a proposta de valor inferior, cabendo ao licitante o encargo de provar o oposto. Se o particular puder comprovar que sua proposta é exequível, não se lhe poderá interditar o exercício do direito de apresenta-la. Inviável proibir o Estado de realizar contratação vantajosa. A  questão é de fato, não de direito. Incumbe o ônus da prova da exequibilidade ao particular. Essa comprovação poderá fazer-se em face da própria Administração, pleiteando-se a realização de diligência para tanto.” (JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos, Dialética, 17ª edição, 2016, p. 1027)

 

A pesquisa de trechos doutrinários pode ser feita via Internet, caso o particular não disponha de uma boa biblioteca sobre o assunto. Utilize, por exemplo, os seguintes critérios de pesquisa: recurso pregão "vinculação ao instrumento convocatório" "Marçal Justen Filho”. Retornarão resultados de recursos (interpostos ou julgados) em relação a pregões contendo trechos de Marçal Justen Filho sobre o princípio da vinculação ao instrumento convocatório.

Dentre os principais doutrinadores, podemos citar os seguintes:

 

´    Marçal Justen Filho;

´    Joel de Menezes Niebuhr;

´    Jorge Ulisses Jacoby Fernandes;

´    Celso Antônio Bandeira de Melo;

´    Diógenes Gasparini;

´    Jessé Torres Pereira Júnior;

´    Carlos Pinto Coelho Mota;

´    Cristiana Fortini;

´    Luiz Alberto Blanchet;

´    Benedito de Tolosa Filho;

´    Madeline Rocha Furtado;

´    José Anacleto Abduch Santos;

´    Sidney Bittencourt;

´    Hely Lopes Merirelles.

 

2.5.2.3.2 – Citações jurisprudenciais (julgados do Poder Judiciário e dos Tribunais de Contas)

 

As citações jurisprudenciais são referências às decisões dos tribunais sobre casos semelhantes aos que estão sendo analisados. Elas são amplamente utilizadas na prática jurídica para dar autoridade e respaldo à argumentação, demonstrando como questões semelhantes foram tratadas anteriormente pelo Poder Judiciário. Na prática jurídica, elas são essenciais para reforçar a argumentação, já que a influência reflete o entendimento de que o Judiciário vem consolidando sobre determinado tema. Em áreas onde a legislação pode ser interpretada de várias formas, as decisões judiciais atuam como um guia, proporcionando previsibilidade e segurança jurídica.

  

“Administrativo - licitação - Vinculação ao instrumento convocatório. A observância do princípio da vinculação ao instrumento convocatório evita a alteração de critérios de julgamento proporcionando aos interessados a certeza do que pretende a Administração.” (TJMG, Apc. 1.0024.02.844438-8/002, Rel. Desembargador Carreira Machado, 4ª Câmara Cível, DJ 11.08.2005) (grifos nossos)

 

 

Exigências para habilitação são inerentes à etapa de planejamento da contratação, razão pela qual irregularidades apuradas nessa fase não devem ser imputadas a pregoeiro ou a membros de comissão de licitação, designados para a fase de condução do certame.” (TCU – Acórdão 3213/2019, Primeira Câmara - Relator: BENJAMIN ZYMLER)

 

Da mesma forma, a pesquisa de jurisprudência pode ser feita via Internet. Para tanto, acesse o site do tribunal, clique na aba ou link “jurisprudência” e realize a sua pesquisa, lembrando que os sites dos tribunais judiciais adotam o domínio .JUS.BR (tjmg.jus.br, tjsp.jus.br, tjrn.jus.br, trf1.jus.br, stj.jus.br etc.)

 

´    Dê preferência para jurisprudências recentes (atualizadas);

 

´    STJ – Responsável pela uniformização da interpretação da legislação federal. Só não está acima do STF, que é o responsável por julgar matérias constitucionais.

 

´    Justiça  Federal:

 

1ª Região (TRF1): Acre, Amapá, Amazonas, Bahia, Distrito Federal, Goiás, Maranhão, Mato Grosso, Minas Gerais, Pará, Piauí, Rondônia, Roraima e Tocantins;

2ª Região (TRF2): Espírito Santo e Rio de Janeiro;

3ª Região (TRF3): Mato Grosso do Sul e São Paulo;

4ª Região (TRF4): Paraná, Rio Grande do Sul e Santa Catarina;

5ª Região (TRF5): Alagoas, Ceará, Paraíba, Pernambuco, Rio Grande do Norte e Sergipe.

 

´    Como os Tribunais de Contas são órgãos do Poder Executivo, o domínio utilizado é o .GOV.BR: tce.mg.gov.br, tce.sp.gov.br, tce.rn.gov.br etc.

 

´    Se a licitação é realizada por um órgão de SP, é recomendável que a pesquisa seja feita no TJSP (tjsp.jus.br, no stj.jus.br e no tce.sp.gov.br), sendo que em qualquer caso uma jurisprudência do STJ é aplicável e super bem vinda, já que é o órgão do Judiciário responsável pela uniformização da interpretação da legislação federal (como é o caso da Lei nº 14.133/2021 e do Decreto nº 10.024/2019).

 


2.5.2.4 – Disposições editalícias

 

A exemplo dos dispositivos legais, é importante que sejam citadas e transcritas as cláusulas editalícias tidas por violadas ou contrárias à legislação, a fim de se demonstrar com clareza o vício identificado no ato.

 

“7 – Documentação referente à regularidade fiscal:

(...)

7.4 – prova de contribuição sindical de que trata o art. 607 da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT.

(...)”

 

2.5.3 – Documentação que possa ser apresentada para reforçar os argumentos apresentados.

 

O particular deve providenciar todo e qualquer documento que possa ser juntado à sua peça recursal ou à peça impugnatória.

Assim, devem ser juntados à peça, conforme o caso: edital atualizado (última versão), anexos, contrato e termos aditivos, se houver, comunicados da Administração (e-mails, ofícios, registros em plataformas públicas, correspondências e todo e qualquer documento que tenha relação com o fato), atas, pareceres, laudos, provas testemunhais (declarações), eventuais comprovantes, registros fotográficos, relatórios, planilhas, orçamentos, notas fiscais, recibos, cronogramas, correspondências trocadas com terceiros (fabricante/fornecedor, p. ex.) etc.

 

2.6 – Requerimento

 

O requerimento é a seção onde o requerente formaliza o pedido para que a autoridade competente reveja a decisão ou ato administrativo impugnado. Esta parte é fundamental para definir o objeto da peça, ou seja, o que se pretende com a revisão, além de orientar o julgamento com base nos pontos levantados.

Deve ser pedida, ainda, a remessa dos autos à autoridade superior em caso de manutenção da decisão recorrida.

 

“VII – DO PEDIDO

 

Ante todo o exposto, com fundamento no art. 165, I, “c”, da Lei nº 14.133, de 1º de abril de 2021, requer-se o provimento do presente recurso, com efeito para que seja anulada a decisão do Pregoeiro do ________________, na parte atacada neste, com vistas a declarar INABILITADA A EMPRESA __________________ LTDA., em razão do descumprimento da regra fixada no item ______ do Edital em epígrafe, com a consequente convocação da ora Recorrente para o envio de sua proposta adequada ao último lance ofertado.

 

Na improvável hipótese de o Ilmo. Pregoeiro negar provimento ao recurso ora apresentado, a despeito dos argumentos aqui expostos, deve o processo, devidamente instruído, ser encaminhado à autoridade superior para decisão, em cumprimento ao disposto no art. 165, § 2º, da Lei nº 14.133/2021.”

 

3 – Estratégias pontuais

 

3.1 – Checklists

 

A utilização de checklist para análise de edital (seja para participar de uma licitação, seja para impugnar um edital) é uma prática altamente recomendada, especialmente para empresas que participam de licitações com frequência. Ela permite uma revisão sistemática e organizada de todos os elementos do edital, facilitando a identificação de cláusulas viciadas,  falhas, omissões ou pontos que possam comprometer a participação da empresa em determinado momento.

Principais benefícios da utilização de chcklists:

1. Eficiência e organização;

2. Redução de erros e omissões;

3. Identificação de ilegalidades, desvantagens ou pontos que merecem atenção;

4. Garantia de conformidade com os requisitos legais.

Há bons modelos de checklist disponíveis na Internet. Deem preferência aos modelos disponibilizados em sites confiáveis, de instituições públicas.

 

3.2 - Antecipe-se aos argumentos ou às objeções da AP

 

Antecipar-se aos argumentos ou objeções significa prever as possíveis dificuldades, objeções ou questionamentos que a Administração Pública pode levantar em relação à proposta, à documentação, aos argumentos ou ao comportamento da empresa durante o processo licitatório ou durante a execução contratual. Em vez de esperar que a Administração apresente essas objeções, o licitante ou seu advogado devem se antecipar, tratando dessas questões com antecedência e trazendo soluções, esclarecimentos ou ações de forma antecipada — seja durante a elaboração da proposta, na fase de análise do edital, ou durante a execução contratual.

Assim, por exemplo, se você está prevendo a possibilidade de a Administração anular a licitação em face do recurso que você está prestes a interpor (seja em razão de um comentário de um servidor, de algo escrito no julgamento ou do comportamento dos servidores), você deve se antecipar, argumentando, no recurso, a impossibilidade de se anular todo o certame em face da irregularidade que você pretende apontar. Dessa forma, você desarma a Administração.

 

3.3 – Utilize os argumentos ou atos da própria AP contra ela.

 

Uma técnica bastante eficiente consiste em utilizar, contra a Administração, algo que ela tenha dito ou escrito anteriormente.

Assim, fique atento ao que a Administração verbalizar ou aos comunicados (e-mails, ofícios, correspondências, registros em plataformas etc.) enviados por ela e, se for possível, utilize tais informações a seu favor.

Mas, isso não é tudo... Você deve pesquisar os precedentes do órgão público para demonstrar incoerências, evitar desclassificações ou inabilitações, ou até mesmo para sustentar uma impugnação ou recurso.

Para tanto, pesquise por julgamentos de recursos, julgamento de impugnações a editais, pareceres ou atos normativos e disposições contratuais já realizados/emitidos/utilizados pelo órgão. Se há algo inadmissível em matéria de direito é a “incoerência” ou a “informação contraditória”. Não se admite, salvo na hipótese de revisão de entendimento (situação rara), que no passado a Administração tenha decidido de um jeito e, no futuro, venha a decidir de forma totalmente oposta.

Portanto, se no passado o órgão decidiu, em sede de recurso, que a inexequibilidade de proposta é relativa, não pode ela, no futuro, declarar desclassificada uma proposta por inexequibilidade sem conferir ao particular a possibilidade de comprovar a exequibilidade de sua oferta.

 

4 – Considerações finais

 

A impugnação e o recurso administrativo não representam apenas direitos das empresas licitantes, mas também ferramentas essenciais para corrigir eventuais falhas e inconformidades nos editais, que possam limitar a competitividade ou desrespeitar a legislação.

Esses instrumentos permitem que os licitantes questionem itens do edital ou do julgamento considerados injustos, desproporcionais ou ilegais, fortalecendo a transparência e a isonomia da atuação administrativa. Além disso, o uso responsável e embasado desses instrumentos contribui para a segurança jurídica e para a proteção dos interesses públicos e privados envolvidos.

É fundamental que as empresas se atentem aos prazos e aos requisitos formais exigidos para cada tipo de manifestação, de modo a não perderem a oportunidade de se posicionar e, eventualmente, corrigir o rumo do processo. Em suma, a impugnação e o recurso não apenas beneficiam os licitantes, mas também promovem um ambiente mais justo e ético na condução dos processos de contratações públicas.

Entretanto, na hipótese de nenhum desses meios surtir o efeito desejado, ainda restará mais uma ação nas vias administrativas, qual seja, a interposição de representação ou denúncia junto ao Tribunal de Contas competente.

E na hipótese de o particular não ter acolhida a sua pretensão no âmbito do Tribunal de Contas, somente lhe restará a alternativa de recorrer a uma medida judicial, mediante denúncia ao Ministério Público ou o ajuizamento de ação própria ou de um mandado de segurança, caso haja prova pré-constituída de direito líquido e certo (provado por documentos).

Em casos de denúncias de fraude, favorecimento ou outras ilegalidades que possam configurar atos de improbidade administrativa, uma denúncia ao Ministério Público (MP) pode ser uma medida eficaz. O MP tem poder de investigar e agir judicialmente para corrigir irregularidades e responsabilizar os envolvidos, podendo inclusive pleitear a suspensão de processos administrativos que estejam maculados.

Portanto, a elaboração de um recurso ou impugnação não é uma tarefa das mais simples, haja vista que exige conhecimento sobre a legislação pertinente, práticas administrativas e interpretação de cláusulas editalícias e contratuais. É necessário promover a análise do edital e da legislação aplicável, identificar possíveis falhas ou inconsistências, e apresentar argumentos que sustentem o pedido, sempre embasados na norma legal, na doutrina e na jurisprudência, com vistas a atingir o objetivo principal do recurso ou da impugnação: persuadir a Administração.