segunda-feira, 25 de agosto de 2025

10 erros fatais que podem inabilitar ou desclassificar a sua empresa numa licitação



As licitações, para muitos, são um campo minado, um labirinto burocrático onde a menor falha pode custar uma ótima oportunidade de negócio. Entretanto, com o conhecimento certo e uma estratégia sólida, a licitação pode se tornar uma via expressa para o sucesso da sua empresa. A diferença entre o fracasso e a vitória, muitas vezes, reside na atenção aos detalhes, na compreensão profunda da lei e na capacidade de antecipar os perigos.

Então, vamos direto ao ponto...

1. O Mito da "Proposta Imbatível": Ignorar a Habilitação Jurídica

Muitos licitantes se concentram em criar a proposta mais competitiva, o preço mais baixo, a solução mais inovadora. Eles acreditam que o sucesso reside exclusivamente na fase de propostas. No entanto, a realidade é muito mais cruel: a melhor proposta do mundo é inútil se a sua empresa for inabilitada.

A habilitação jurídica é o primeiro e mais fundamental filtro do processo licitatório. É a prova de que sua empresa é, de fato, uma entidade legalmente constituída e apta a contratar com a Administração Pública. O erro fatal aqui é subestimar a documentação exigida, apresentando certidões vencidas, contratos sociais desatualizados ou procurações sem poderes suficientes. A inabilitação por falta de habilitação jurídica é como um nocaute no primeiro round, antes mesmo de você ter a chance de mostrar o seu valor.

A Lei nº 14.133/2021, em seu art. 66, é clara sobre as exigências de habilitação jurídica:

“Art. 66. A habilitação jurídica visa a demonstrar a capacidade de o licitante exercer direitos e assumir obrigações, e a documentação a ser apresentada por ele limita-se à comprovação de existência jurídica da pessoa e, quando cabível, de autorização para o exercício da atividade a ser contratada.”

Exemplo: A empresa apresenta o contrato social, mas não inclui a última alteração contratual que define a composição societária atual, o quadro de diretores e o capital social. Ou, pior, a empresa apresenta um contrato social sem o devido registro na Junta Comercial, ou o registro não é recente.

Geralmente, os contratos sociais atualizados são apresentados sob a forma de “contrato social consolidado” ou “alteração contratual consolidada” - documento que reúne todas as alterações realizadas no contrato social de uma empresa em um único arquivo, criando uma versão atualizada e integral.

Sobre o assunto, vide:

* Documentosde habilitação – Visão geral

* Aprevalência do objeto social sobre o código da CNAE, para efeito decertificação da atividade econômica explorada

* Declaraçãodo licitante na fase de habilitação

2. O Efeito Dominó da Inadimplência: O Perigo da Habilitação Fiscal, Social e Trabalhista

A saúde financeira de uma empresa é um indicativo de sua capacidade de cumprir suas obrigações contratuais. Por isso, a Administração Pública exige uma série de certidões que comprovam a regularidade fiscal, social e trabalhista do licitante. Não se trata apenas de pagar impostos, mas de ter uma situação completamente regular.

O erro fatal aqui é a crença de que "um pequeno débito não fará diferença". A Lei é inflexível. A ausência de certidões, a existência de débitos em aberto, mesmo que de pequeno valor, ou a falta de regularidade com o FGTS ou a Justiça do Trabalho, são motivos suficientes para a inabilitação. É o efeito dominó da inadimplência: um único débito, esquecido ou subestimado, pode derrubar toda a sua participação no processo licitatório.

O artigo 68 da Lei nº 14.133/2021 estabelece os requisitos para a regularidade fiscal, social e trabalhista:

“Art. 68. As habilitações fiscal, social e trabalhista serão aferidas mediante a verificação dos seguintes requisitos:

I - a inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) ou no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ);

II - a inscrição no cadastro de contribuintes estadual e/ou municipal, se houver, relativo ao domicílio ou sede do licitante, pertinente ao seu ramo de atividade e compatível com o objeto contratual;

III - a regularidade perante a Fazenda federal, estadual e/ou municipal do domicílio ou sede do licitante, ou outra equivalente, na forma da lei;

IV - a regularidade relativa à Seguridade Social e ao FGTS, que demonstre cumprimento dos encargos sociais instituídos por lei;

V - a regularidade perante a Justiça do Trabalho;

VI - o cumprimento do disposto no inciso XXXIII do art. 7º da Constituição Federal.

§ 1º Os documentos referidos nos incisos do caput deste artigo poderão ser substituídos ou supridos, no todo ou em parte, por outros meios hábeis a comprovar a regularidade do licitante, inclusive por meio eletrônico.

§ 2º A comprovação de atendimento do disposto nos incisos III, IV e V do caput deste artigo deverá ser feita na forma da legislação específica.”

Exemplo: A empresa apresenta uma certidão "positiva com efeitos de negativa" em que o débito está parcelado, mas o parcelamento foi cancelado por inadimplência, e o documento ainda não reflete essa mudança. Embora a certidão "positiva com efeitos de negativa" seja válida para fins de habilitação, qualquer indício de irregularidade futura ou de um erro na emissão do documento pode levar a uma verificação mais aprofundada por parte do órgão licitante. Qualquer um pode confirmar a autenticidade da certidão no sítio oficial do emitente. A Lei de Licitações exige a plena regularidade fiscal. Se a certidão não refletir a realidade atual da empresa, ou se o parcelamento estiver em situação irregular, a inabilitação é certa.

Sobre o assunto, vide:

* Documentosde habilitação – Visão geral

* Otratamento diferenciado concedido às microempresas e empresas de pequeno portenas licitações e o caráter facultativo da adesão ao Simples Nacional

3. A Aposta Arriscada da Qualificação Econômico-Financeira: Desequilíbrio Econômico

A qualificação econômico-financeira é a prova de que sua empresa tem solidez para cumprir o contrato, ou seja, de que ela não irá "quebrar" no meio do caminho.

Erro Fatal nº 1: Apresentação de Balanço Patrimonial em Desacordo com as Normas Legais

Este é, sem dúvida, o erro mais recorrente. Um Balanço Patrimonial não é apenas uma fotografia da saúde financeira da empresa; ele deve ser formalmente apresentado conforme a legislação e a contabilidade exige.

·         Causa: A não apresentação do Livro Diário com os termos de abertura e encerramento devidamente autenticados na Junta Comercial, ou a apresentação de um Balanço sem as assinaturas do contador e do administrador.

·         Como evitar: Certifique-se de que o Balanço Patrimonial está devidamente registrado na Junta Comercial ou na entidade de registro competente. Confirme se o contador e o administrador assinaram todos os documentos.

Erro Fatal nº 2: Não Atendimento aos Índices de Liquidez Exigidos no Edital

Os índices de Liquidez Geral (LG), Liquidez Corrente (LC) e Solvência Geral (SG) são exigências comuns nos editais de licitação. O não atendimento a um ou mais desses índices resultará na inabilitação imediata.

* Causa: Balanço Patrimonial com índices abaixo do mínimo exigido pelo edital.

* Como evitar: Antes de participar da licitação, realize um cálculo prévio dos índices com base no Balanço Patrimonial mais recente da sua empresa. Se os seus índices estiverem abaixo do exigido, você pode buscar a incorporação de novos recursos financeiros para fortalecer seu capital de giro e seu patrimônio líquido.

Lembre-se das Fórmulas:

* Liquidez Geral (LG): (Ativo Circulante + Realizável a Longo Prazo) / (Passivo Circulante + Passivo Não Circulante)

* Liquidez Corrente (LC): Ativo Circulante / Passivo Circulante

* Solvência Geral (SG): Ativo Total / (Passivo Circulante + Passivo Não Circulante)

Erro Fatal nº 3: Falha na Comprovação de Patrimônio Líquido Mínimo

Muitos editais, especialmente os de alto valor, exigem um Patrimônio Líquido (PL) mínimo, que serve como uma garantia de que a empresa tem capacidade financeira para suportar possíveis perdas durante a execução do contrato.

* Causa: O PL da empresa é inferior ao percentual mínimo (de até 10%) do valor estimado da contratação.

* Como evitar: Se o PL da sua empresa não atingir o valor exigido, uma solução é a integralização de capital social. Isso pode ser feito através de um aporte financeiro dos sócios ou da conversão de lucros em capital social.

Erro Fatal nº 4: Deixar de Apresentar Garantia da Proposta

Em contratos de grande vulto, a garantia da proposta é um requisito comum para assegurar que a empresa não desista da proposta após a sua apresentação, causando prejuízos à Administração Pública.

* Causa: Não apresentar a garantia ou apresentá-la de forma inadequada (valor inferior, por exemplo) ou com falhas formais.

* Como evitar: Verifique no edital se a garantia da proposta é exigida. Se for, escolha a modalidade mais conveniente para sua empresa (seguro-garantia, fiança bancária ou caução em dinheiro) e assegure-se de que a emissão do documento é feita por instituição idônea e o valor é o exigido no edital.

Erro Fatal nº 5: Erros quanto à certidão negativa de falência

Outro problema comum diz respeito à certidão negativa de falência, sendo que dentre os erros mais comuns podemos citar: apresentação da certidão incorreta ou de outra comarca, apresentação da certidão com prazo de validade expirado, não apresentação da certidão específica para licitação e apresentação da certidão com pendências ou em desacordo com a realidade da empresa.

Sobre o assunto, vide:

* Documentosde habilitação – Visão geral

* Qualificação econômico-financeira em licitação de serviços continuados - Capital Circulante Líquido ou Capital de Giro

* Exigênciasreferentes ao SPED no âmbito da qualificação econômico-financeira

* Qualificaçãoeconômico-financeira - Balanços intermediários

* Qualificaçãoeconômico-financeira - Exigências não cumulativas

* Equilíbrioeconômico-financeiro - Limite

4. A Maldição do "Copy and Paste": Erros e Omissões na Proposta e Inexequibilidade

A elaboração da proposta é a sua chance de mostrar à Administração Pública que você compreendeu o objeto do contrato e que está apto a executá-lo. O erro mais comum e, talvez, o mais vergonhoso, é o "copiar + colar" indiscriminado, a cópia de documentos de outras licitações, resultando em propostas que não correspondem ao que está sendo licitado.

Erros de digitação, omissões de itens exigidos, valores unitários que não correspondem ao total, e a inclusão de informações irrelevantes ou até mesmo contraditórias são sinais claros de descuido e falta de profissionalismo. A comissão de licitação não é obrigada a "adivinhar" o que você quis dizer. A proposta é um documento formal e deve ser precisa, completa e condizente com o edital.

A Lei nº 14.133/2021, em seu art. 59, I, prevê a desclassificação da proposta que não atenda às exigências do ato convocatório:

Art. 59. Serão desclassificadas as propostas que:

I - contiverem vícios insanáveis;

II - não obedecerem às especificações técnicas pormenorizadas no edital;

III - apresentarem preços inexequíveis ou permanecerem acima do orçamento estimado para a contratação;

IV - não tiverem sua exequibilidade demonstrada, quando exigido pela Administração;

V - apresentarem desconformidade com quaisquer outras exigências do edital, desde que insanável.

(...)”

Além disso, na ânsia de vencer, muitos licitantes cometem um erro crasso: subestimar seus próprios custos e apresentar uma proposta inexequível.

Propostas inexequíveis são aquelas que, de forma clara e objetiva, não conseguem cobrir os custos mínimos para a execução do objeto licitado, comprometendo a qualidade e a continuidade dos serviços ou o fornecimento de bens. Apresentar uma proposta com valores irrealmente baixos pode ser interpretado como um risco para a Administração Pública, que busca a contratação mais vantajosa, mas não a qualquer preço.

A Lei nº 14.133/2021 traz critérios para a análise da exequibilidade das propostas, como o artigo 59, que estabelece:

“Art. 59. Serão desclassificadas as propostas que:

[...]

III - apresentarem preços inexequíveis ou permanecerem acima do orçamento estimado para a contratação;

[...]”

O Tribunal de Contas da União tem se posicionado de forma a coibir propostas com preços manifestamente inexequíveis, como se verifica no Acórdão nº 1.455/2018 do Plenário, de relatoria do Ministro Bruno Dantas, que trata da exigência de comprovação da viabilidade econômica da proposta, rejeitando a tese de que apenas a proposta de preço mais baixo seria suficiente. A Corte de Contas, nesse julgado, reiterou que a análise da exequibilidade deve ser objetiva e baseada em critérios definidos no edital, resguardando o interesse público na qualidade e na execução do contrato.

Exemplo 1: O edital de uma licitação para serviços de consultoria exige que a proposta técnica contenha a experiência dos profissionais da equipe, com a apresentação de currículos e atestados de capacitação. A empresa, por desatenção, omite os currículos e atestados de um dos profissionais-chave da equipe. A omissão de informações essenciais impede que a Comissão de Licitação avalie a proposta técnica de forma completa. A falta dos documentos exigidos é uma falha formal que leva à desclassificação da proposta, pois a empresa não atendeu integralmente aos requisitos do edital.

Exemplo 2: A empresa recebe uma notificação para apresentar uma planilha detalhada de custos, contratos com fornecedores ou outras comprovações de viabilidade, mas ignora a solicitação ou apresenta documentos incompletos. A omissão ou a apresentação de documentos insuficientes é motivo de desclassificação. A inércia da empresa é interpretada como uma incapacidade de comprovar a exequibilidade da proposta. A Administração Pública não tem o dever de fazer a verificação por conta própria.

Sobre o assunto, vide:

* Propostas- Valores alinhados aos preços de mercado

* Pregão - Proposta inicial - Desnecessidade do detalhamento da composição do preço

* Proposta:Requisitos

* Ainclusão, na composição do BDI constante das propostas das licitantes, doImposto de Renda Pessoa Jurídica (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o LucroLíquido (CSLL)

* Anecessidade de comprovação da exequibilidade da proposta de licitanteremanescente

* ErrosMateriais e Formais em Licitações

* Vocêsabia que a inexequibilidade em licitações é apenas um indício, não umacerteza?

* Anecessidade de comprovação da exequibilidade da proposta de licitanteremanescente

* Inexequibilidadede preços em licitações

5. A Armadilha da Inverdade: O Perigo das Declarações Falsas

No mundo das licitações, a veracidade das informações prestadas é um princípio inegociável. A Lei exige que o licitante declare, sob as penas da lei, que cumpre todos os requisitos de habilitação, dentre outras. A apresentação de uma declaração falsa, mesmo que por desconhecimento, é uma infração gravíssima que pode levar à inabilitação, à aplicação de sanções administrativas e até mesmo a consequências criminais.

O art. 155 da Lei nº 14.133/2021, que trata das sanções administrativas, é incisivo:

“Art. 155. O licitante ou o contratado será responsabilizado administrativamente pelas seguintes infrações:

(...)

VIII - apresentar declaração ou documentação falsa exigida para o certame ou prestar declaração falsa durante a licitação ou a execução do contrato;

(...)”

 

 

“Art. 156. Serão aplicadas ao responsável pelas infrações administrativas previstas nesta Lei as seguintes sanções:

(...)

IV - declaração de inidoneidade para licitar ou contratar.”

Além disso, a falsidade ideológica é um crime previsto no art. 299 do Código Penal.

“Art. 299 - Omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, com o fim de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante:

(...)”

Portanto, a honestidade não é apenas uma virtude, mas uma obrigação legal.

Exemplo: Uma empresa que não se enquadra como ME ou EPP, para usufruir dos benefícios, assina uma declaração falsa de que é microempresa. A legislação tributária define os critérios para o enquadramento como ME ou EPP. O órgão licitante pode e irá verificar a situação da empresa junto à Receita Federal e outros órgãos competentes. A descoberta da falsidade resulta em desclassificação imediata, além de sanções como a declaração de inidoneidade para participar de licitações. O licitante responde pelo crime previsto no art. 337-“I” do Código Penal brasileiro (Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940) acrescido pelo art. 178 da Lei nº 14.133/21.

Sobre o assunto, vide:

* Documentosde habilitação – Visão geral

* Declaraçãodo licitante na fase de habilitação

* Fraudeem Licitações – Visão Geral

6. A Síndrome do "Tanto Faz": Deixar de Atender a Requisitos do Edital

Esse é o erro mais banal que pode ser cometido.

O edital é a lei da licitação. É o documento que rege todo o processo e estabelece as regras do jogo. A síndrome do "tanto faz" é a atitude do licitante que ignora, por negligência ou por estratégia, os requisitos expressos no edital.

A ausência de documentos, a falta de comprovação de experiência técnica, o não cumprimento de prazos ou a ausência de uma declaração específica exigida no edital, mesmo que pareçam irrelevantes, podem ser suficientes para a inabilitação ou desclassificação.

A Lei nº 14.133/2021, em seus arts. 18, I e II, e 164, reforça a obrigatoriedade de seguir o edital:

“Art. 18. A fase preparatória do processo licitatório é caracterizada pelo planejamento e deve compatibilizar-se com o plano de contratações anual de que trata o inciso VII do caput do art. 12 desta Lei, sempre que elaborado, e com as leis orçamentárias, bem como abordar todas as considerações técnicas, mercadológicas e de gestão que podem interferir na contratação, compreendidos:

I - a descrição da necessidade da contratação fundamentada em estudo técnico preliminar que caracterize o interesse público envolvido;

II - a definição do objeto para o atendimento da necessidade, por meio de termo de referência, anteprojeto, projeto básico ou projeto executivo, conforme o caso;

(...)”

 

 

“Art. 164. Qualquer pessoa é parte legítima para impugnar edital de licitação por irregularidade na aplicação desta Lei ou para solicitar esclarecimento sobre os seus termos, devendo protocolar o pedido até 3 (três) dias úteis antes da data de abertura do certame.

Parágrafo único. A resposta à impugnação ou ao pedido de esclarecimento será divulgada em sítio eletrônico oficial no prazo de até 3 (três) dias úteis, limitado ao último dia útil anterior à data da abertura do certame.”

Exemplo: O edital de uma licitação para a construção de um hospital exige que o licitante comprove a execução de obra de natureza semelhante, com área construída de, no mínimo, 10.000m². A empresa, por sua vez, apresenta atestados de capacidade técnica que comprovam a construção de uma escola com 8.000m² e de um centro comercial com 15.000m². Apesar de ter experiência substancial, a empresa não atendeu o requisito específico de uma única obra com área igual ou superior a 10.000m². O critério de qualificação técnica é eliminatório. A Administração Pública não pode, sob a pena de violar o princípio da isonomia e da vinculação ao instrumento convocatório, somar as áreas de diferentes obras ou aceitar um atestado que não se encaixe perfeitamente no que foi solicitado. A falha no atendimento a um critério técnico específico leva à inabilitação imediata.

Jurisprudência: A jurisprudência do TCU é vasta e uníssona nesse sentido. O Acórdão nº 1.458/2016 do Plenário, de relatoria do Ministro Weder de Oliveira, por exemplo, destaca que o descumprimento de exigência do edital, mesmo que de natureza formal, pode justificar a inabilitação. O tribunal entende que o edital deve ser observado em sua integralidade, de forma a garantir a isonomia entre os licitantes e a segurança jurídica do certame.

Sobre o assunto, vide:

* ErrosMateriais e Formais em Licitações

7. A Desatenção Fatal: Falta de Rigor na Apresentação de Atestados de Capacidade Técnica

O atestado de capacidade técnica é o salvo-conduto do licitante, a prova de que ele já executou com sucesso serviços ou fornecimentos similares ao objeto da licitação. O erro fatal aqui é a falta de rigor na apresentação desses documentos, o que pode comprometer sua validade.

Atestados sem o nome completo do contratante e contratado, sem a descrição detalhada do objeto, sem o período de execução ou, o que é mais grave, que não sejam compatíveis com o objeto licitado, não se prestam a nada.

É importante que após executar um contrato, o licitante solicite ao órgão público a emissão do atestado de capacidade técnica, fornecendo uma minuta do atestado a ser elaborado, contendo todas as informações essenciais, como o nome do órgão, o nome completo da empresa contratada, descrição dos serviços/produtos executados/fornecidos, prazos de execução/fornecimento, locais de execução/fornecimento, valores de cada um dos serviços/fornecimentos executados (convém transpor para o atestado a planilha constante do edital com os preços praticados), marca e modelo (quando for o caso) e qualquer outra informação julgada relevante para a comprovação.

A Lei nº 14.133/2021, em seu art. 67, IV, trata da comprovação de capacidade técnica operacional:

“Art. 67. A documentação relativa à qualificação técnico-profissional e técnico-operacional será restrita a:

(...)

II - certidões ou atestados, regularmente emitidos pelo conselho profissional competente, quando for o caso, que demonstrem capacidade operacional na execução de serviços similares de complexidade tecnológica e operacional equivalente ou superior, bem como documentos comprobatórios emitidos na forma do § 3º do art. 88 desta Lei;

(...)”

Exemplo: O edital de uma licitação para serviços de tecnologia exige a comprovação da experiência na "implantação de sistema de gestão financeira e contábil em ambiente de nuvem". A empresa apresenta um atestado que apenas declara a "prestação de serviços de consultoria em TI para a Empresa X". O atestado apresentado é genérico e não comprova a experiência específica exigida no edital. A comissão de licitação não tem como saber se a empresa de fato realizou a implantação de um sistema de gestão financeira em nuvem. A falta de informações essenciais no atestado invalida a sua comprovação, levando à inabilitação da empresa. A inabilitação é certa, pois o atestado não é um documento que a Administração pode aceitar para verificação posterior.

Sobre o assunto, vide:

* Atestadode Capacidade Técnica Operacional x Atestado de CapacidadeTécnico-Profissional: Diferenças e Características

* Atestadosde capacidade técnica. Exigências de número mínimo de atestados e quantitativosmínimos

* Atestadosx Contrato Social

* Atestadosde capacidade técnica - Registro no conselho profissional

* Exigênciade número mínimo de atestados

* Exigênciade número mínimo de atestados técnicos

* Necessidadede se estabelecer critérios objetivos para a avaliação da qualificaçãotécnico-operacional

* VistoriaTécnica - Requisitos

8. A Tentação da Fraude: A Falsidade e o Conluio

A fraude em licitação é um crime. A Lei nº 14.133/2021, assim como a antiga Lei nº 8.666/93, é extremamente rigorosa com a conduta dos licitantes, coibindo práticas como o conluio, o direcionamento e a apresentação de documentos falsos. O "jeitinho brasileiro" não tem lugar nesse ambiente.

O conluio, por exemplo, é a combinação entre licitantes para frustrar o caráter competitivo do certame. A apresentação de documentos falsos, como certidões ou atestados forjados, além de ser uma infração administrativa, pode levar à prisão e à declaração de inidoneidade para contratar com a Administração Pública.

A Lei nº 14.133/2021, em seu art. 156, IV, pune com rigor a apresentação de documentos falsos.

A jurisprudência é uníssona e severa. O TCU, por exemplo, no Acórdão nº 2.455/2014, de relatoria do Ministro José Múcio Monteiro, foi categórico ao declarar a inidoneidade de uma empresa por ter apresentado atestado de capacidade técnica fraudulento, ressaltando que a fraude em licitação é "um atentado à moralidade administrativa".

Exemplo: Uma empresa, para cumprir o requisito de qualificação técnica de um edital, falsifica um atestado de capacidade técnica, alterando os valores, as datas de execução ou, pior, criando um documento que nunca existiu e que nunca foi emitido pelo suposto contratante. O órgão licitante tem o poder e o dever de verificar a autenticidade dos atestados. A verificação pode ser feita por meio de contato com o cliente que supostamente emitiu o atestado, ou pela análise do contrato que gerou o atestado e das notas fiscais relativas àquele contrato. Uma vez comprovada a falsidade, a empresa é inabilitada e pode ser declarada inidônea para licitar e contratar com a Administração Pública por um período de tempo determinado (até 6 anos pela Lei 14.133/21). Além disso, o ato configura crime de falsidade ideológica (Art. 299 do Código Penal) e crime em licitações (Art. 337-L do Código Penal, inserido pela Lei 14.133/21), com penas de reclusão e multa.

Sobre o assunto, vide:

* Fraudeem Licitações – Visão Geral

9. A Imunidade Diplomática Inexistente: O Erro de Achar que as Sanções Não te Alcançam

Muitos licitantes, especialmente os iniciantes, cometem o erro de ignorar as sanções administrativas. Eles acreditam que a sanção é apenas um "risco de negócio" ou que a Administração Pública não as aplica com rigor. Ledo engano. A Lei nº 14.133/2021 é dura e impõe sanções que vão desde a advertência até a declaração de inidoneidade, que impede o licitante de participar de licitações com toda a Administração Pública por um tempo determinado ou indeterminado.

O art. 156 da Lei nº 14.133/2021 estabelece as sanções aplicáveis:

“Art. 156. Serão aplicadas ao responsável pelas infrações administrativas previstas nesta Lei as seguintes sanções:

I - advertência;

II - multa;

III - impedimento de licitar e contratar;

IV - declaração de inidoneidade para licitar ou contratar.

(...)”

Jurisprudência: A jurisprudência do TCU sobre o tema é robusta. O Acórdão nº 1.487/2016, de relatoria do Ministro André Luis de Carvalho, por exemplo, aplicou a penalidade de declaração de inidoneidade a uma empresa que não cumpriu o contrato, demonstrando que a Administração Pública não hesita em aplicar a sanção máxima quando a situação o exige.

Exemplo: A empresa A, após vencer uma licitação, percebe que o preço ofertado é inexequível ou que não terá a capacidade de executar o contrato. Em vez de celebrar o contrato e arriscar um descumprimento, a empresa simplesmente recusa a assinar o contrato, assumindo que a Administração apenas convocará o segundo colocado. O edital de licitação é um instrumento vinculante. A recusa injustificada em assinar o contrato não é um ato de "desistência", mas sim uma inadimplência contratual prévia. A Administração Pública tem o poder e o dever de aplicar sanções. A empresa pode ser multada (geralmente em um percentual sobre o valor da proposta) e ter seu registro cadastral suspenso. Pela Lei nº 14.133/21, a recusa em assinar o contrato sem justificativa aceitável pode levar à declaração de inidoneidade para licitar ou contratar com a Administração, por até 6 anos.

Sobre o assunto, vide:

* APena de Multa e o Contrato Administrativo

* Aprevisão contratual como requisito indispensável para a aplicação da pena demulta

* Penalidadesnas licitações públicas: causas e consequências

* Dosimetriada pena - Proporcionalidade

* Anulaçãojudicial de sanção aplicada em sede de licitação

10. A Ignorância da Lei: A Falta de Acompanhamento das Alterações Legislativas

O Direito Administrativo, em especial o ramo das licitações, é dinâmico. Novas leis, decretos, resoluções e orientações jurisprudenciais são publicadas constantemente. Tudo isso sem falar da vasta legislação que rege os mais diversos ramos de atividades (engenharia, arquitetura, informática, nutrição, vigilância sanitária etc, etc, etc.). O erro final, e talvez o mais perigoso, é a ignorância deliberada ou acidental da lei. Achar que a Lei nº 14.133/2021 é a única referência, por exemplo, é um erro fatal que pode custar um negócio.

O licitante que não acompanha a evolução da legislação, que não se atualiza com as decisões dos tribunais de contas, age na escuridão, sem saber que o caminho à frente está repleto de armadilhas.

Exemplo: Uma empresa de grande porte forma um consórcio com uma ME para aproveitar os benefícios fiscais e as vantagens da ME. O edital de licitação proíbe a participação de ME e EPP em consórcios com empresas de grande porte. A empresa, por desconhecer a lei e as decisões do TCU, não percebe que o edital é ilegal e não o impugna. A exigência do edital é contrária à Lei Complementar nº 123/06 e à jurisprudência pacífica do TCU, que permite a participação de ME/EPP em consórcios com empresas maiores. A empresa, por não ter o conhecimento necessário para impugnar a cláusula ilegal, perde a oportunidade de participar da licitação e de questionar a legalidade do edital.

Recomendo a todos que não se contentem com a superfície que aprofundem-se no tema, estudem a Lei nº 14.133/2021, consulte os manuais, a jurisprudência e a doutrina especializada.

Boa parte das decisões jurídicas NÃO resultam propriamente do texto frio da lei, ADVÊM DA INTERPRETAÇÃO. E para tanto podemos nos socorrer da doutrina majoritária e da jurisprudência (em especial a do STJ e a do TCU).

As licitações não são um jogo de sorte, mas um jogo de estratégia, onde cada movimento deve ser calculado com precisão. A vitória é para aqueles que se preparam, para aqueles que dominam as regras e, acima de tudo, para aqueles que utilizam a lei a seu favor.

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