As licitações, para
muitos, são um campo minado, um labirinto burocrático onde a menor falha pode
custar uma ótima oportunidade de negócio. Entretanto, com o conhecimento certo
e uma estratégia sólida, a licitação pode se tornar uma via expressa para o
sucesso da sua empresa. A diferença entre o fracasso e a vitória, muitas vezes,
reside na atenção aos detalhes, na compreensão profunda da lei e na capacidade
de antecipar os perigos.
Então, vamos direto
ao ponto...
1. O Mito
da "Proposta Imbatível": Ignorar a Habilitação Jurídica
Muitos licitantes
se concentram em criar a proposta mais competitiva, o preço mais baixo, a
solução mais inovadora. Eles acreditam que o sucesso reside exclusivamente na fase
de propostas. No entanto, a realidade é muito mais cruel: a melhor proposta
do mundo é inútil se a sua empresa for inabilitada.
A habilitação
jurídica é o primeiro e mais fundamental filtro do processo licitatório. É a
prova de que sua empresa é, de fato, uma entidade legalmente constituída e apta
a contratar com a Administração Pública. O erro fatal aqui é subestimar a
documentação exigida, apresentando certidões vencidas, contratos sociais
desatualizados ou procurações sem poderes suficientes. A inabilitação por falta
de habilitação jurídica é como um nocaute no primeiro round, antes mesmo
de você ter a chance de mostrar o seu valor.
A Lei nº
14.133/2021, em seu art. 66, é clara sobre as exigências de habilitação
jurídica:
“Art. 66. A habilitação jurídica visa a
demonstrar a capacidade de o licitante exercer direitos e assumir obrigações, e
a documentação a ser apresentada por ele limita-se à comprovação de existência
jurídica da pessoa e, quando cabível, de autorização para o exercício da
atividade a ser contratada.”
Exemplo: A empresa
apresenta o contrato social, mas não inclui a última alteração contratual que
define a composição societária atual, o quadro de diretores e o capital social.
Ou, pior, a empresa apresenta um contrato social sem o devido registro na Junta
Comercial, ou o registro não é recente.
Geralmente, os
contratos sociais atualizados são apresentados sob a forma de “contrato social
consolidado” ou “alteração contratual consolidada” - documento que reúne todas
as alterações realizadas no contrato social de uma empresa em um único arquivo,
criando uma versão atualizada e integral.
Sobre o assunto,
vide:
* Documentosde habilitação – Visão geral
* Declaraçãodo licitante na fase de habilitação
2. O Efeito
Dominó da Inadimplência: O Perigo da Habilitação Fiscal, Social e Trabalhista
A saúde financeira
de uma empresa é um indicativo de sua capacidade de cumprir suas obrigações
contratuais. Por isso, a Administração Pública exige uma série de certidões que
comprovam a regularidade fiscal, social e trabalhista do licitante. Não se
trata apenas de pagar impostos, mas de ter uma situação completamente regular.
O erro fatal aqui é
a crença de que "um pequeno débito não fará diferença". A Lei
é inflexível. A ausência de certidões, a existência de débitos em aberto, mesmo
que de pequeno valor, ou a falta de regularidade com o FGTS ou a Justiça do
Trabalho, são motivos suficientes para a inabilitação. É o efeito dominó da
inadimplência: um único débito, esquecido ou subestimado, pode derrubar toda a
sua participação no processo licitatório.
O artigo 68 da Lei nº
14.133/2021 estabelece os requisitos para a regularidade fiscal, social e
trabalhista:
“Art. 68. As habilitações fiscal, social e trabalhista serão aferidas
mediante a verificação dos seguintes requisitos:
I - a inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas
(CPF) ou no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ);
II - a inscrição no cadastro de contribuintes
estadual e/ou municipal, se houver, relativo ao domicílio ou sede do licitante,
pertinente ao seu ramo de atividade e compatível com o objeto contratual;
III - a regularidade perante a Fazenda
federal, estadual e/ou municipal do domicílio ou sede do licitante, ou outra
equivalente, na forma da lei;
IV - a regularidade relativa à Seguridade
Social e ao FGTS, que demonstre cumprimento dos encargos sociais instituídos
por lei;
V - a regularidade perante a Justiça do
Trabalho;
VI - o cumprimento do disposto no inciso
XXXIII do art. 7º da Constituição Federal.
§ 1º Os documentos referidos nos incisos
do caput deste artigo poderão ser substituídos ou supridos, no todo
ou em parte, por outros meios hábeis a comprovar a regularidade do licitante,
inclusive por meio eletrônico.
§ 2º A comprovação de atendimento do disposto
nos incisos III, IV e V do caput deste artigo deverá ser feita na
forma da legislação específica.”
Exemplo: A empresa
apresenta uma certidão "positiva com efeitos de negativa" em que o
débito está parcelado, mas o parcelamento foi cancelado por inadimplência, e o
documento ainda não reflete essa mudança. Embora a certidão "positiva com
efeitos de negativa" seja válida para fins de habilitação, qualquer
indício de irregularidade futura ou de um erro na emissão do documento pode
levar a uma verificação mais aprofundada por parte do órgão licitante. Qualquer
um pode confirmar a autenticidade da certidão no sítio oficial do emitente. A
Lei de Licitações exige a plena regularidade fiscal. Se a certidão não refletir
a realidade atual da empresa, ou se o parcelamento estiver em situação
irregular, a inabilitação é certa.
Sobre o assunto,
vide:
* Documentosde habilitação – Visão geral
3. A Aposta
Arriscada da Qualificação Econômico-Financeira: Desequilíbrio Econômico
A qualificação econômico-financeira é a prova de que sua
empresa tem solidez para cumprir o contrato, ou seja, de que ela não irá
"quebrar" no meio do caminho.
Erro Fatal nº 1: Apresentação de Balanço Patrimonial em Desacordo
com as Normas Legais
Este é, sem dúvida, o erro mais recorrente. Um Balanço Patrimonial
não é apenas uma fotografia da saúde financeira da empresa; ele deve ser
formalmente apresentado conforme a legislação e a contabilidade exige.
·
Causa:
A não apresentação do Livro Diário com os termos de abertura e encerramento
devidamente autenticados na Junta Comercial, ou a apresentação de um Balanço
sem as assinaturas do contador e do administrador.
·
Como evitar:
Certifique-se de que o Balanço
Patrimonial está devidamente registrado na Junta Comercial ou na entidade de
registro competente. Confirme se o contador e o administrador assinaram
todos os documentos.
Erro Fatal nº 2: Não Atendimento aos Índices de Liquidez Exigidos
no Edital
Os índices de Liquidez Geral (LG), Liquidez Corrente (LC) e
Solvência Geral (SG) são exigências comuns nos editais de licitação. O não
atendimento a um ou mais desses índices resultará na inabilitação imediata.
* Causa:
Balanço Patrimonial com índices abaixo do mínimo exigido pelo edital.
* Como evitar:
Antes de participar da licitação, realize um cálculo prévio dos índices com base no Balanço Patrimonial mais
recente da sua empresa. Se os seus índices estiverem abaixo do exigido, você
pode buscar a incorporação de novos
recursos financeiros para fortalecer seu capital de giro e seu
patrimônio líquido.
Lembre-se das Fórmulas:
* Liquidez Geral (LG):
(Ativo Circulante + Realizável a Longo Prazo) / (Passivo Circulante + Passivo
Não Circulante)
* Liquidez Corrente (LC):
Ativo Circulante / Passivo Circulante
* Solvência Geral (SG):
Ativo Total / (Passivo Circulante + Passivo Não Circulante)
Erro Fatal nº 3: Falha na Comprovação de Patrimônio Líquido Mínimo
Muitos editais, especialmente os de alto valor, exigem um
Patrimônio Líquido (PL) mínimo, que serve como uma garantia de que a empresa
tem capacidade financeira para suportar possíveis perdas durante a execução do
contrato.
* Causa:
O PL da empresa é inferior ao percentual mínimo (de até 10%) do valor estimado
da contratação.
* Como evitar:
Se o PL da sua empresa não atingir o valor exigido, uma solução é a integralização de capital social. Isso
pode ser feito através de um aporte financeiro dos sócios ou da conversão de
lucros em capital social.
Erro Fatal nº 4: Deixar de Apresentar Garantia da Proposta
Em contratos de grande vulto, a garantia da proposta é um
requisito comum para assegurar que a empresa não desista da proposta após a sua
apresentação, causando prejuízos à Administração Pública.
* Causa:
Não apresentar a garantia ou apresentá-la de forma inadequada (valor inferior,
por exemplo) ou com falhas formais.
* Como evitar:
Verifique no edital se a garantia da proposta é exigida. Se for, escolha a
modalidade mais conveniente para sua empresa (seguro-garantia, fiança bancária
ou caução em dinheiro) e assegure-se de que a emissão do documento é feita por instituição idônea e o valor é o exigido
no edital.
Erro Fatal nº 5: Erros quanto à certidão negativa de falência
Outro problema comum diz respeito à certidão negativa de falência,
sendo que dentre os erros mais comuns podemos citar: apresentação da certidão
incorreta ou de outra comarca, apresentação da certidão com prazo de validade
expirado, não apresentação da certidão específica para licitação e apresentação
da certidão com pendências ou em desacordo com a realidade da empresa.
Sobre o assunto,
vide:
* Documentosde habilitação – Visão geral
* Exigênciasreferentes ao SPED no âmbito da qualificação econômico-financeira
* Qualificaçãoeconômico-financeira - Balanços intermediários
* Qualificaçãoeconômico-financeira - Exigências não cumulativas
* Equilíbrioeconômico-financeiro - Limite
4. A
Maldição do "Copy and Paste": Erros e Omissões na Proposta e
Inexequibilidade
A elaboração da
proposta é a sua chance de mostrar à Administração Pública que você compreendeu
o objeto do contrato e que está apto a executá-lo. O erro mais comum e, talvez,
o mais vergonhoso, é o "copiar + colar" indiscriminado, a cópia de
documentos de outras licitações, resultando em propostas que não correspondem
ao que está sendo licitado.
Erros de digitação,
omissões de itens exigidos, valores unitários que não correspondem ao total, e
a inclusão de informações irrelevantes ou até mesmo contraditórias são sinais
claros de descuido e falta de profissionalismo. A comissão de licitação não é
obrigada a "adivinhar" o que você quis dizer. A proposta é um
documento formal e deve ser precisa, completa e condizente com o edital.
A Lei nº
14.133/2021, em seu art. 59, I, prevê a desclassificação da proposta que não
atenda às exigências do ato convocatório:
Art. 59. Serão desclassificadas as propostas que:
I - contiverem vícios insanáveis;
II - não obedecerem às especificações técnicas
pormenorizadas no edital;
III - apresentarem preços inexequíveis ou
permanecerem acima do orçamento estimado para a contratação;
IV - não tiverem sua exequibilidade
demonstrada, quando exigido pela Administração;
V - apresentarem desconformidade com quaisquer
outras exigências do edital, desde que insanável.
(...)”
Além disso, na
ânsia de vencer, muitos licitantes cometem um erro crasso: subestimar seus
próprios custos e apresentar uma proposta inexequível.
Propostas
inexequíveis são aquelas que, de forma clara e objetiva, não conseguem cobrir
os custos mínimos para a execução do objeto licitado, comprometendo a qualidade
e a continuidade dos serviços ou o fornecimento de bens. Apresentar uma
proposta com valores irrealmente baixos pode ser interpretado como um risco
para a Administração Pública, que busca a contratação mais vantajosa, mas não a
qualquer preço.
A Lei nº
14.133/2021 traz critérios para a análise da exequibilidade das propostas, como
o artigo 59, que estabelece:
“Art. 59. Serão desclassificadas as propostas que:
[...]
III - apresentarem preços inexequíveis ou permanecerem acima do orçamento
estimado para a contratação;
[...]”
O Tribunal de
Contas da União tem se posicionado de forma a coibir propostas com preços
manifestamente inexequíveis, como se verifica no Acórdão nº 1.455/2018 do
Plenário, de relatoria do Ministro Bruno Dantas, que trata da exigência de
comprovação da viabilidade econômica da proposta, rejeitando a tese de que
apenas a proposta de preço mais baixo seria suficiente. A Corte de Contas,
nesse julgado, reiterou que a análise da exequibilidade deve ser objetiva e
baseada em critérios definidos no edital, resguardando o interesse público na
qualidade e na execução do contrato.
Exemplo 1:
O edital de uma licitação para serviços de consultoria exige que a proposta
técnica contenha a experiência dos profissionais da equipe, com a apresentação
de currículos e atestados de capacitação. A empresa, por desatenção, omite os
currículos e atestados de um dos profissionais-chave da equipe. A omissão de
informações essenciais impede que a Comissão de Licitação avalie a proposta
técnica de forma completa. A falta dos documentos exigidos é uma falha formal
que leva à desclassificação da proposta, pois a empresa não atendeu
integralmente aos requisitos do edital.
Exemplo 2:
A empresa recebe uma notificação para apresentar uma planilha detalhada de
custos, contratos com fornecedores ou outras comprovações de viabilidade, mas
ignora a solicitação ou apresenta documentos incompletos. A omissão ou a
apresentação de documentos insuficientes é motivo de desclassificação. A
inércia da empresa é interpretada como uma incapacidade de comprovar a
exequibilidade da proposta. A Administração Pública não tem o dever de fazer a
verificação por conta própria.
Sobre o assunto,
vide:
* Propostas- Valores alinhados aos preços de mercado
* Pregão
- Proposta inicial - Desnecessidade do detalhamento da composição do preço
* Anecessidade de comprovação da exequibilidade da proposta de licitanteremanescente
* ErrosMateriais e Formais em Licitações
* Vocêsabia que a inexequibilidade em licitações é apenas um indício, não umacerteza?
* Anecessidade de comprovação da exequibilidade da proposta de licitanteremanescente
* Inexequibilidadede preços em licitações
5. A
Armadilha da Inverdade: O Perigo das Declarações Falsas
No mundo das
licitações, a veracidade das informações prestadas é um princípio inegociável.
A Lei exige que o licitante declare, sob as penas da lei, que cumpre todos os
requisitos de habilitação, dentre outras. A apresentação de uma declaração falsa,
mesmo que por desconhecimento, é uma infração gravíssima que pode levar à
inabilitação, à aplicação de sanções administrativas e até mesmo a
consequências criminais.
O art. 155 da Lei
nº 14.133/2021, que trata das sanções administrativas, é incisivo:
“Art. 155. O licitante ou o contratado será responsabilizado
administrativamente pelas seguintes infrações:
VIII - apresentar declaração ou documentação
falsa exigida para o certame ou prestar declaração falsa durante a licitação ou
a execução do contrato;
(...)”
“Art. 156. Serão aplicadas ao responsável pelas infrações administrativas
previstas nesta Lei as seguintes sanções:
IV - declaração de inidoneidade para licitar ou contratar.”
Além disso, a
falsidade ideológica é um crime previsto no art. 299 do Código Penal.
“Art.
299 - Omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia
constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que
devia ser escrita, com o fim de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar
a verdade sobre fato juridicamente relevante:
(...)”
Portanto, a
honestidade não é apenas uma virtude, mas uma obrigação legal.
Exemplo: Uma
empresa que não se enquadra como ME ou EPP, para usufruir dos benefícios,
assina uma declaração falsa de que é microempresa. A legislação tributária
define os critérios para o enquadramento como ME ou EPP. O órgão licitante pode
e irá verificar a situação da empresa junto à Receita Federal e outros órgãos
competentes. A descoberta da falsidade resulta em desclassificação imediata,
além de sanções como a declaração de inidoneidade para participar de
licitações. O licitante responde pelo crime previsto no art. 337-“I” do Código
Penal brasileiro (Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940) acrescido
pelo art. 178 da Lei nº 14.133/21.
Sobre o assunto,
vide:
* Documentosde habilitação – Visão geral
* Declaraçãodo licitante na fase de habilitação
* Fraudeem Licitações – Visão Geral
6. A
Síndrome do "Tanto Faz": Deixar de Atender a Requisitos do Edital
Esse é o erro mais
banal que pode ser cometido.
O edital é a lei da
licitação. É o documento que rege todo o processo e estabelece as regras do
jogo. A síndrome do "tanto faz" é a atitude do licitante que ignora,
por negligência ou por estratégia, os requisitos expressos no edital.
A ausência de
documentos, a falta de comprovação de experiência técnica, o não cumprimento de
prazos ou a ausência de uma declaração específica exigida no edital, mesmo que
pareçam irrelevantes, podem ser suficientes para a inabilitação ou
desclassificação.
A Lei nº
14.133/2021, em seus arts. 18, I e II, e 164, reforça a obrigatoriedade de
seguir o edital:
“Art. 18. A fase preparatória do processo licitatório é caracterizada
pelo planejamento e deve compatibilizar-se com o plano de contratações anual de
que trata o inciso VII do caput do art. 12 desta Lei, sempre que
elaborado, e com as leis orçamentárias, bem como abordar todas as considerações
técnicas, mercadológicas e de gestão que podem interferir na contratação,
compreendidos:
I - a descrição da necessidade da contratação
fundamentada em estudo técnico preliminar que caracterize o interesse público
envolvido;
II - a definição do objeto para o atendimento
da necessidade, por meio de termo de referência, anteprojeto, projeto básico ou
projeto executivo, conforme o caso;
(...)”
“Art. 164. Qualquer pessoa é parte legítima para impugnar edital de
licitação por irregularidade na aplicação desta Lei ou para solicitar
esclarecimento sobre os seus termos, devendo protocolar o pedido até 3 (três)
dias úteis antes da data de abertura do certame.
Parágrafo único. A resposta à impugnação ou ao
pedido de esclarecimento será divulgada em sítio eletrônico oficial no prazo de
até 3 (três) dias úteis, limitado ao último dia útil anterior à data da
abertura do certame.”
Exemplo: O edital
de uma licitação para a construção de um hospital exige que o licitante
comprove a execução de obra de natureza semelhante, com área construída de, no
mínimo, 10.000m². A empresa, por sua vez, apresenta atestados de capacidade
técnica que comprovam a construção de uma escola com 8.000m² e de um centro
comercial com 15.000m². Apesar de ter experiência substancial, a empresa não
atendeu o requisito específico de uma única obra com área igual ou superior a
10.000m². O critério de qualificação técnica é eliminatório. A Administração
Pública não pode, sob a pena de violar o princípio da isonomia e da vinculação
ao instrumento convocatório, somar as áreas de diferentes obras ou aceitar um
atestado que não se encaixe perfeitamente no que foi solicitado. A falha no
atendimento a um critério técnico específico leva à inabilitação imediata.
Jurisprudência: A
jurisprudência do TCU é vasta e uníssona nesse sentido. O Acórdão nº 1.458/2016
do Plenário, de relatoria do Ministro Weder de Oliveira, por exemplo, destaca
que o descumprimento de exigência do edital, mesmo que de natureza formal, pode
justificar a inabilitação. O tribunal entende que o edital deve ser observado
em sua integralidade, de forma a garantir a isonomia entre os licitantes e a
segurança jurídica do certame.
Sobre o assunto,
vide:
* ErrosMateriais e Formais em Licitações
7. A
Desatenção Fatal: Falta de Rigor na Apresentação de
Atestados de Capacidade Técnica
O atestado de
capacidade técnica é o salvo-conduto do licitante, a prova de que ele já
executou com sucesso serviços ou fornecimentos similares ao objeto da
licitação. O erro fatal aqui é a falta de rigor na apresentação desses
documentos, o que pode comprometer sua validade.
Atestados sem o
nome completo do contratante e contratado, sem a descrição detalhada do objeto,
sem o período de execução ou, o que é mais grave, que não sejam compatíveis com
o objeto licitado, não se prestam a nada.
É importante que
após executar um contrato, o licitante solicite ao órgão público a emissão do
atestado de capacidade técnica, fornecendo uma minuta do atestado a ser
elaborado, contendo todas as informações essenciais, como o nome do órgão, o
nome completo da empresa contratada, descrição dos serviços/produtos
executados/fornecidos, prazos de execução/fornecimento, locais de
execução/fornecimento, valores de cada um dos serviços/fornecimentos executados
(convém transpor para o atestado a planilha constante do edital com os preços
praticados), marca e modelo (quando for o caso) e qualquer outra informação
julgada relevante para a comprovação.
A Lei nº
14.133/2021, em seu art. 67, IV, trata da comprovação de capacidade técnica
operacional:
“Art. 67. A documentação relativa à qualificação técnico-profissional e
técnico-operacional será restrita a:
II - certidões ou atestados, regularmente
emitidos pelo conselho profissional competente, quando for o caso, que
demonstrem capacidade operacional na execução de serviços similares de
complexidade tecnológica e operacional equivalente ou superior, bem como
documentos comprobatórios emitidos na forma do § 3º do art. 88 desta Lei;
(...)”
Exemplo: O edital
de uma licitação para serviços de tecnologia exige a comprovação da experiência
na "implantação de sistema de gestão financeira e contábil em ambiente de
nuvem". A empresa apresenta um atestado que apenas declara a
"prestação de serviços de consultoria em TI para a Empresa X". O
atestado apresentado é genérico e não comprova a experiência específica exigida
no edital. A comissão de licitação não tem como saber se a empresa de fato
realizou a implantação de um sistema de gestão financeira em nuvem. A falta de
informações essenciais no atestado invalida a sua comprovação, levando à
inabilitação da empresa. A inabilitação é certa, pois o atestado não é um
documento que a Administração pode aceitar para verificação posterior.
Sobre o assunto,
vide:
* Atestadosde capacidade técnica. Exigências de número mínimo de atestados e quantitativosmínimos
* Atestadosde capacidade técnica - Registro no conselho profissional
* Exigênciade número mínimo de atestados
* Exigênciade número mínimo de atestados técnicos
* Necessidadede se estabelecer critérios objetivos para a avaliação da qualificaçãotécnico-operacional
* VistoriaTécnica - Requisitos
8. A
Tentação da Fraude: A Falsidade e o Conluio
A fraude em
licitação é um crime. A Lei nº 14.133/2021, assim como a antiga Lei nº
8.666/93, é extremamente rigorosa com a conduta dos licitantes, coibindo
práticas como o conluio, o direcionamento e a apresentação de documentos
falsos. O "jeitinho brasileiro" não tem lugar nesse ambiente.
O conluio, por
exemplo, é a combinação entre licitantes para frustrar o caráter competitivo do
certame. A apresentação de documentos falsos, como certidões ou atestados
forjados, além de ser uma infração administrativa, pode levar à prisão e à
declaração de inidoneidade para contratar com a Administração Pública.
A Lei nº
14.133/2021, em seu art. 156, IV, pune com rigor a apresentação de documentos
falsos.
A jurisprudência é
uníssona e severa. O TCU, por exemplo, no Acórdão nº 2.455/2014, de relatoria
do Ministro José Múcio Monteiro, foi categórico ao declarar a inidoneidade de
uma empresa por ter apresentado atestado de capacidade técnica fraudulento,
ressaltando que a fraude em licitação é "um atentado à moralidade
administrativa".
Exemplo: Uma empresa, para cumprir o requisito de qualificação
técnica de um edital, falsifica um atestado de capacidade técnica, alterando os
valores, as datas de execução ou, pior, criando um documento que nunca existiu
e que nunca foi emitido pelo suposto contratante. O órgão licitante tem o poder
e o dever de verificar a autenticidade dos atestados. A verificação pode ser
feita por meio de contato com o cliente que supostamente emitiu o atestado, ou
pela análise do contrato que gerou o atestado e das notas fiscais relativas
àquele contrato. Uma vez comprovada a falsidade, a empresa é inabilitada
e pode ser declarada inidônea para licitar e contratar com a Administração
Pública por um período de tempo determinado (até 6 anos pela Lei 14.133/21).
Além disso, o ato configura crime de falsidade ideológica (Art. 299 do
Código Penal) e crime em licitações (Art. 337-L do Código Penal,
inserido pela Lei 14.133/21), com penas de reclusão e multa.
Sobre o assunto,
vide:
* Fraudeem Licitações – Visão Geral
9. A
Imunidade Diplomática Inexistente: O Erro de Achar que
as Sanções Não te Alcançam
Muitos licitantes,
especialmente os iniciantes, cometem o erro de ignorar as sanções
administrativas. Eles acreditam que a sanção é apenas um "risco de
negócio" ou que a Administração Pública não as aplica com rigor. Ledo
engano. A Lei nº 14.133/2021 é dura e impõe sanções que vão desde a advertência
até a declaração de inidoneidade, que impede o licitante de participar de
licitações com toda a Administração Pública por um tempo determinado ou
indeterminado.
O art. 156 da Lei
nº 14.133/2021 estabelece as sanções aplicáveis:
“Art. 156. Serão aplicadas ao responsável pelas infrações administrativas
previstas nesta Lei as seguintes sanções:
I - advertência;
III - impedimento de licitar e contratar;
IV - declaração de inidoneidade para licitar ou contratar.
(...)”
Jurisprudência: A
jurisprudência do TCU sobre o tema é robusta. O Acórdão nº 1.487/2016, de
relatoria do Ministro André Luis de Carvalho, por exemplo, aplicou a penalidade
de declaração de inidoneidade a uma empresa que não cumpriu o contrato,
demonstrando que a Administração Pública não hesita em aplicar a sanção máxima
quando a situação o exige.
Exemplo: A empresa
A, após vencer uma licitação, percebe que o preço ofertado é inexequível ou que
não terá a capacidade de executar o contrato. Em vez de celebrar o contrato e
arriscar um descumprimento, a empresa simplesmente recusa a assinar o contrato,
assumindo que a Administração apenas convocará o segundo colocado. O edital de
licitação é um instrumento vinculante. A recusa injustificada em assinar o
contrato não é um ato de "desistência", mas sim uma inadimplência
contratual prévia. A Administração Pública tem o poder e o dever de aplicar
sanções. A empresa pode ser multada (geralmente em um percentual sobre o valor
da proposta) e ter seu registro cadastral suspenso. Pela Lei nº 14.133/21, a
recusa em assinar o contrato sem justificativa aceitável pode levar à
declaração de inidoneidade para licitar ou contratar com a Administração, por
até 6 anos.
Sobre o assunto,
vide:
* APena de Multa e o Contrato Administrativo
* Aprevisão contratual como requisito indispensável para a aplicação da pena demulta
* Penalidadesnas licitações públicas: causas e consequências
* Dosimetriada pena - Proporcionalidade
* Anulaçãojudicial de sanção aplicada em sede de licitação
10. A Ignorância da Lei: A Falta de Acompanhamento das
Alterações Legislativas
O Direito
Administrativo, em especial o ramo das licitações, é dinâmico. Novas leis,
decretos, resoluções e orientações jurisprudenciais são publicadas
constantemente. Tudo isso sem falar da vasta legislação que rege os mais
diversos ramos de atividades (engenharia, arquitetura, informática, nutrição,
vigilância sanitária etc, etc, etc.). O erro final, e talvez o mais perigoso, é
a ignorância deliberada ou acidental da lei. Achar que a Lei nº 14.133/2021
é a única referência, por exemplo, é um erro fatal que pode custar um negócio.
O licitante que não
acompanha a evolução da legislação, que não se atualiza
com as decisões dos tribunais de contas, age na escuridão, sem saber que o
caminho à frente está repleto de armadilhas.
Exemplo: Uma
empresa de grande porte forma um consórcio com uma ME para aproveitar os
benefícios fiscais e as vantagens da ME. O edital de licitação proíbe a
participação de ME e EPP em consórcios com empresas de grande porte. A empresa,
por desconhecer a lei e as decisões do TCU, não percebe que o edital é ilegal e
não o impugna. A exigência do edital é contrária à Lei Complementar nº 123/06 e
à jurisprudência pacífica do TCU, que permite a participação de ME/EPP em
consórcios com empresas maiores. A empresa, por não ter o conhecimento
necessário para impugnar a cláusula ilegal, perde a oportunidade de participar
da licitação e de questionar a legalidade do edital.
Recomendo a todos
que não se contentem com a superfície que aprofundem-se no tema, estudem a Lei
nº 14.133/2021, consulte os manuais, a jurisprudência e a doutrina
especializada.
Boa parte das
decisões jurídicas NÃO resultam
propriamente do texto frio da lei, ADVÊM
DA INTERPRETAÇÃO. E para tanto podemos nos socorrer da doutrina
majoritária e da jurisprudência (em especial a do STJ e a do TCU).
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